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Sobre Palavras

Por Sérgio Rodrigues Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.

Viva a ‘Charlie Hebdo’: caricatura, charge, cartum

O atentado covarde que dizimou hoje de manhã a equipe da revista satírica francesa “Charlie Hebdo” é, como disse meu vizinho Caio Blinder, “um ataque terrorista contra a liberdade de expressão, contra a sátira, contra a França, contra a civilização”. Poderíamos acrescentar: contra a charge, a caricatura e o cartum, três velhas armas do jornalismo […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 02h23 - Publicado em 7 jan 2015, 13h08

capas-charlie-hebdoO atentado covarde que dizimou hoje de manhã a equipe da revista satírica francesa “Charlie Hebdo” é, como disse meu vizinho Caio Blinder, “um ataque terrorista contra a liberdade de expressão, contra a sátira, contra a França, contra a civilização”. Poderíamos acrescentar: contra a charge, a caricatura e o cartum, três velhas armas do jornalismo crítico em que tais valores intangíveis ganham corpo – embora só a primeira palavra, “charge”, tenha origem francesa.

Em 2011, respondendo ao leitor Marcos Ataíde, examinei aqui na coluna a origem de cada um desses termos, que, embora sejam tratados como sinônimos no dicionário, guardam diferenças importantes entre si – diferenças que esbocei em linhas gerais, sem entrar em minúcias técnicas. Republico agora aquele post como homenagem aos cartunistas Wolinski, Charb, Cabu e Tignous e aos outros mortos no atentado de hoje, na esperança de que cada vez mais caricaturas, charges e cartuns nos levem a rir de personagens poderosos, grotescos, inflados, seja na política, na economia, nas artes ou nas religiões, em especial aqueles que se julgam inatacáveis. Sem nenhuma exceção.

*

“Prezado Sérgio, sua resposta vai decidir uma aposta que eu e uns amigos fizemos: charge e caricatura são sinônimos, querem dizer a mesma coisa? Ou será que não? Aproveite para falar um pouco também de cartum, que às vezes vejo usado como sinônimo de charge e caricatura, mas esse eu desconfio que é diferente. Abraços.” (Marcos Ataíde)

Não é tão fácil decidir a aposta que Ataíde fez com seus amigos. As pessoas costumam ter da sinonímia uma ideia caricatural, ao mesmo tempo sumária e exagerada, como se o fato de duas palavras serem sinônimas significasse obrigatoriamente que são idênticas, como gêmeos univitelinos.

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Não é assim que funciona. É comum que as palavras tenham mais de um sentido, chamados acepções – frequentemente, o número destas na língua real se multiplica em sutilezas e supera o que os dicionários julgam valer a pena registrar. Basta terem uma única acepção em comum para que duas palavras sejam consideradas sinônimas. Isso não quer dizer que sua carga semântica seja idêntica.

Charge e caricatura – e até mesmo cartum – são termos sinônimos, sim. Assim aparecem nos dicionários. Todos se referem a desenhos jornalísticos de caráter crítico e humorístico, geralmente satirizando personagens, fatos e situações da atualidade. Mas também há diferenças – sutis, mas importantes – entre essas palavras.

Em primeiro lugar, vamos examinar suas origens. O francês charge, de onde importamos a palavra sem alteração de grafia, significa carga. Trata-se no caso de um sinônimo de crítica violenta, num uso figurado do sentido militar de carga como ataque, que está presente numa expressão como “carga de cavalaria”.

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O vocábulo italiano caricatura (na origem, ato ou efeito de carregar) parte exatamente do mesmo ponto e chega a resultado muito parecido. Parece claro que um surgiu como tradução do outro, mas tudo indica que caricatura veio primeiro: em italiano, data de fins do século XVI essa acepção da palavra, segundo o Houaiss. A charge francesa nasceu cerca de cem anos depois.

Cartum é termo mais recente, importado nos anos 1960 do inglês cartoon – este vindo do italiano cartone, “cartão”, o suporte onde se desenhavam os tais rabiscos.

Sinonímia à parte, vamos às diferenças. A caricatura tem uma acepção estrita de desenho (especialmente de pessoas) em que se exageram traços com objetivo crítico e cômico. Nesse sentido é estática, não precisa contextualizar nada ou contar história alguma. Basta brincar com as características físicas do personagem.

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A charge, também vista de forma estrita, quase sempre inclui o recurso à caricatura, mas isso não é obrigatório. O que a caracteriza é contar e expor criticamente – em geral num único quadro – uma historinha, uma situação. Tem contexto, costuma vir com um esboço de cenário e, com frequência, recorre a balões ou legendas.

Já a palavra cartum, quando não é empregada como sinônimo das outras duas, pode querer dizer o mesmo que história em quadrinhos – em especial HQ daquele subgênero tradicional na imprensa, também chamado tirinha, que conta uma história em poucos quadros, geralmente três.

E quanto àquela aposta: que tal declarar empate?

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Envie sua dúvida sobre palavra, expressão, dito popular, gramática etc. Às segundas, quartas e quintas-feiras o colunista responde ao leitor na seção Consultório. E-mail: sobrepalavras@todoprosa.com.br

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