‘Tenho descendência portuguesa’, isso está certo?
“Prezado Sérgio, está correto dizer que ‘tenho descendência portuguesa’ (por exemplo), ao se referir aos antepassados? O correto não seria ‘tenho ascendência portuguesa’? Por outro lado os meus antepassados são portugueses e me têm como seu descendente; e como a descendência pertence a eles, ela é portuguesa também (mesmo eu não sendo português).” Fernando Abreu […]
“Prezado Sérgio, está correto dizer que ‘tenho descendência portuguesa’ (por exemplo), ao se referir aos antepassados? O correto não seria ‘tenho ascendência portuguesa’? Por outro lado os meus antepassados são portugueses e me têm como seu descendente; e como a descendência pertence a eles, ela é portuguesa também (mesmo eu não sendo português).” Fernando Abreu Gontijo
A dúvida trazida por Gontijo acende o holofote sobre um erro tão difundido entre falantes de variados graus de instrução que, não fosse o fato de atentar violentamente contra a lógica, talvez pudéssemos supor que acabaria um dia consagrado e perdoado pelo uso.
Isso nunca vai ocorrer porque, quando uma pessoa afirma que tem descendência portuguesa (ou alemã, ou italiana etc.), o significado incontornável das palavras comunica ao ouvinte que ela gerou uma bela prole lusitana (ou alemã, ou italiana etc.), e não que seus antepassados tinham tal nacionalidade.
Gontijo está certo, portanto, ao imaginar que o correto é dizer “tenho ascendência portuguesa”. Ascendência, linha traçada pelas gerações que vêm antes de um indivíduo, é um antônimo de descendência, linha traçada pelas gerações que vêm depois dele. Para quem julgar a frase meio pedante – o que de fato é, em grande parte dos contextos – existem opções mais simples como “sou descendente de portugueses” ou “meus antepassados eram portugueses”.
E por falar em construções alternativas, tudo indica que o erro teve origem numa delas, “sou de descendência portuguesa”, que, pode-se argumentar, respeita a lógica, embora não seja das mais elegantes. A dúvida final de Gontijo, como se vê, não faz sentido. Se seus antepassados eram portugueses, isso o inclui em sua linha de descendência (“sou de, pertenço a”), mas não o autoriza a declarar posse sobre ela (“tenho”). Sua própria descendência será formada por seus filhos, netos, bisnetos etc. – e só será portuguesa se, fazendo a rota de Cabral ao contrário, ele se mudar para lá.