Pátria em chuteiras? De chuteiras? NRA?
Oi, Sérgio, tudo bem? Durante a Copa, ouvi e li muitas vezes a famosa frase de Nelson Rodrigues que relaciona pátria e chuteiras. A expressão usada pelo cronista, eu sei, é ‘pátria em chuteiras’. Mas li e vi muitas vezes ‘pátria de chuteiras’. Por uma questão de precisão, claro que é errado atribuir esta última […]

Oi, Sérgio, tudo bem? Durante a Copa, ouvi e li muitas vezes a famosa frase de Nelson Rodrigues que relaciona pátria e chuteiras. A expressão usada pelo cronista, eu sei, é ‘pátria em chuteiras’. Mas li e vi muitas vezes ‘pátria de chuteiras’. Por uma questão de precisão, claro que é errado atribuir esta última expressão a Nelson Rodrigues. Mas, como construção, ‘de chuteiras’ está errado? Abraços. (Eduardo Santos)
Eduardo está certo ao dizer que a expressão criada por Nelson Rodrigues (foto), o maior nome da história da crônica esportiva brasileira, é “pátria em chuteiras”. Isso não quer dizer que haja um problema gramatical com “pátria de chuteiras”. Na verdade, esta última versão, mesmo sendo ligeiramente infiel à fórmula rodriguiana, é a que mais combina com a língua que os brasileiros de fato falam.
A crônica A pátria em chuteiras, que dá título a uma das coletâneas de crônicas esportivas de Nelson organizadas por Ruy Castro para a Companhia das Letras, foi publicada no jornal “O Globo” no dia 2 de junho de 1976 e dizia, já em seu parágrafo de abertura, o seguinte:
Pergunto: – para nós, o que é o escrete? Digamos: – é a pátria em calções e chuteiras, a dar rútilas botinadas, em todas as direções. O escrete representa os nossos defeitos e as nossas virtudes.
Deve-se reconhecer que a construção “em calções e chuteiras” combina com o estilo do autor, equilibrado entre o jocosamente erudito e o elegantemente popular. Na verdade, está em perfeita harmonia com a comicidade de “rútilas botinadas”. Mas o fato é que, se o cronista tivesse escrito “de calções e chuteiras”, ninguém estranharia. Afinal, dizemos que alguém está “de tênis”, “de chinelo”, “de sunga”, “de vestido de alcinha” etc.
Se bem que, depois daquele placar de 7 a 1, nunca houve tanta gente disposta a, diante do dilema “de chuteiras” ou “em chuteiras”, responder: “Nem uma coisa nem outra!”.
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