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Sobre Palavras

Por Sérgio Rodrigues Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.

Os nostálgicos

Eram dois velhos amigos, um de cinquenta e poucos anos, o outro de quarenta e muitos. Entre as experiências que compartilhavam, a mais antiga sempre dava um jeito de aparecer na conversa em todo encontro. Pertenciam a uma das primeiras gerações brasileiras expostas desde o berço à televisão, o primeiro copo de Nescau coincidindo com […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 06h56 - Publicado em 3 fev 2013, 13h00

elizabeth-montgomeryEram dois velhos amigos, um de cinquenta e poucos anos, o outro de quarenta e muitos. Entre as experiências que compartilhavam, a mais antiga sempre dava um jeito de aparecer na conversa em todo encontro. Pertenciam a uma das primeiras gerações brasileiras expostas desde o berço à televisão, o primeiro copo de Nescau coincidindo com o primeiro episódio de National Kid. Ou coisa parecida.

As mulheres já conheciam o roteiro e saíam de perto sempre que a conversa, embalada pelas cervejas do almoço de domingo, entrava naquele terreno com chiado e fantasma, em preto e branco.

– Vamos dar uma volta?

– Não me diga que estão falando do Vigilante Rodoviário de novo.

– E seu cachorro Lobo. Cantando musiquinha e tudo.

Ao se verem sozinhos, os amigos se permitiam navegar pelas bandas mais escaldantes da nostalgia.

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– Rapaz, eu queria muito pegar a Jeannie. Você também?

– Ô. E como.

– Come nada, mesmo porque a Barbara Eden hoje é uma perua pelancuda.

– Mais respeito com as deusas.

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– Mas queria. Já a Samantha era diferente, não era? Com ela você tinha planos de casamento.

– Tinha. Mulher era aquilo, aquilo era mulher! Ah, meu amigo. Eu teria poupado a Elizabeth Montgomery de todos aqueles maridos e da vida infeliz que ela levou.

Naquele dia as mulheres tinham se atrasado para sair e acabaram ouvindo tudo.

– Quem é essa tal de Elizabeth?

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O mal-entendido se desfez, mas, coincidência ou não, o casamento de vinte anos do fã da Feiticeira terminou pouco tempo depois. A iniciativa foi da mulher:

– Acabou a magia – ela explicou.

Foram inúteis suas tentativas de resistir.

– Mas, querida…

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– Não dá mais. Acabou a magia.

O outro amigo, depois de renunciar solenemente à Jeannie, tinha conseguido salvar seu casamento. A amizade deles esfriou depois disso. Logo não passava de mais um item nostálgico numa memória com fantasma e chiado, em preto e branco.

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