O que a pacificação tem a ver com o pagamento
O verbo latino pacare, no qual o português foi buscar ainda no século XIII seu “pagar”, tinha no idioma clássico de Cícero um sentido diferente: “pacificar”. Tratava-se de uma das muitas palavras ligadas ao substantivo pax, “paz, tranquilidade, concórdia”, um dos frutos da raiz indo-europeia pac ou pag, que carregava a ideia de “união”. Outros […]
O verbo latino pacare, no qual o português foi buscar ainda no século XIII seu “pagar”, tinha no idioma clássico de Cícero um sentido diferente: “pacificar”. Tratava-se de uma das muitas palavras ligadas ao substantivo pax, “paz, tranquilidade, concórdia”, um dos frutos da raiz indo-europeia pac ou pag, que carregava a ideia de “união”.
Outros vocábulos dessa família vieram dar em termos que também não costumamos associar à palavra paz, embora seus sentidos não estejam distantes, como pacato (de pacatus, “pacificado, sossegado”) e pacto (“acordo, tratado de paz”).
Além de “pacificar, apaziguar”, aquele pacare clássico também era empregado às vezes na acepção de “libertar” e até de “subjugar, vencer”, que afinal eram formas de promover a paz especialmente caras ao Império Romano. Mas ainda não havia no verbo nem sombra de conotação financeira ou comercial.
Foi só no latim vulgar, séculos mais tarde, que pacare ganhou a expansão semântica (“satisfazer, pacificar com dinheiro”) que acabaria por informar os sentidos modernos da palavra em nossa língua – e também o de suas primas em francês (payer), italiano (pagare), inglês (pay) etc.
O parentesco da pacificação com o pagamento é sem dúvida curioso, mas, uma vez que se pare para pensar nele, faz um profundo sentido. Credores e devedores jamais viverão em paz.