O perrengue, o emperrado e outras cachorradas
Não são poucas as palavras do português que descendem do espanhol perro, “cachorro”, embora a gente não costume se dar conta dessa filiação nem dos laços de família entre elas. De todas, a mais curiosa é “perrengue”. Popular no Brasil – e só no Brasil – desde a primeira metade do século XIX, é um […]

Não são poucas as palavras do português que descendem do espanhol perro, “cachorro”, embora a gente não costume se dar conta dessa filiação nem dos laços de família entre elas.
De todas, a mais curiosa é “perrengue”. Popular no Brasil – e só no Brasil – desde a primeira metade do século XIX, é um termo informal, próximo da gíria, que mostra notável resistência à passagem do tempo.
Em seu idioma de origem, após um pico de popularidade no século XVII, perrengue acabou por cair em desuso, segundo a Real Academia Española.
Tratava-se de um adjetivo cujo sentido era apenas o de “pessoa que se irrita com facilidade; teimoso, birrento”. O Houaiss também registra essa acepção adjetiva entre nós, ao lado de “desanimado” e “covarde”.
No entanto, é como substantivo, com o sentido de “situação complicada, difícil de ser resolvida”, que perrengue conserva maior atualidade no português brasileiro: “Desculpe o atraso, você não imagina o perrengue que passei para chegar aqui”.
Nesta acepção, é clara a influência de um verbo aparentado, “aperrear”, que nasceu em espanhol com o sentido cruel de “supliciar com cães” e que acabou ganhando, por expansão figurada, acepções como “oprimir” e “aborrecer”.
Já os sentidos de “emperrar” – “tornar difícil de movimentar, travar, obstruir, embotar, avariar” – brotam, também figuradamente, da acepção espanhola original de “ficar teimoso, birrento”, por meio da ideia de que um mecanismo emperrado teima em não obedecer ao comando.