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Sobre Palavras

Por Sérgio Rodrigues Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.

O Deus de Alberto Caeiro e sua maiúscula misteriosa

“Sérgio, por que, no belo poema ‘Há metafísica bastante em não pensar em nada’, de Alberto Caeiro (trecho reproduzido abaixo), é a palavra ‘Aqui’ que leva a inicial maiúscula e não ‘estou’, já que é uma fala de Deus? Ao menos está assim em todos os sites que visitei. ‘O único sentido íntimo das cousas […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 01h16 - Publicado em 28 Maio 2015, 17h00

“Sérgio, por que, no belo poema ‘Há metafísica bastante em não pensar em nada’, de Alberto Caeiro (trecho reproduzido abaixo), é a palavra ‘Aqui’ que leva a inicial maiúscula e não ‘estou’, já que é uma fala de Deus? Ao menos está assim em todos os sites que visitei.

‘O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!’

Abraço.” (Aloísio Celeri)

Caro Aloísio, a inicial maiúscula neste caso não tem nada a ver com a convenção religiosa que a recomenda para palavras ligadas a Deus – de todo modo, pronomes pessoais e não verbos, como esse “estou”.

“Aqui” tem inicial maiúscula simplesmente por ser o início da fala do Deus hipotético que Caeiro, mestre do paganismo, invoca para negar. Em minha edição, a “Obra poética” da Nova Aguilar, o quinto poema de “O guardador de rebanhos” – que é o que você cita, mas que não tem nome, sendo “Há metafísica bastante…” seu primeiro verso – traz as palavras “Aqui estou!” em itálico, o que deixa mais clara essa ideia.

Adaptado à notação que hoje é mais usual, o verso ficaria assim:

Dizendo-me: “Aqui estou!”

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Como curiosidade, note-se que o famoso heterônimo de Fernando Pessoa não está sozinho em tal modo de escrever – e que o itálico nem seria necessário. Outro autor português, José Saramago, transformou em marca registrada a radicalização da tendência de indicar só com vírgulas e maiúsculas a alternância de vozes num diálogo, como se vê neste trecho escolhido ao acaso do romance “História do cerco de Lisboa”:

Raimundo Silva passou a mão pela testa, hesitou um segundo, depois disse, Pintava o cabelo, as raízes brancas não são um espectáculo agradável, desculpe, daqui por um tempo estarei no meu natural, Pois eu deixei de o estar, por sua causa fui hoje ao cabeleireiro tingir as veneráveis cãs, Eram tão poucas que não me parece que valesse a pena, Então tinha reparado (…).

*

Envie sua dúvida sobre palavra, expressão, dito popular, gramática etc. Às segundas, quartas e quintas-feiras o colunista responde ao leitor na seção Consultório. E-mail: sobrepalavras@todoprosa.com.br

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