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Sobre Palavras

Por Sérgio Rodrigues Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.

Escopo com o sentido de ‘abrangência’ é tradução burra?

“Trabalho há muito tempo nas áreas de gestão da qualidade e gerenciamento de projetos. As normas e manuais estrangeiros falam em ‘project scope’ e os nossos apedeutas insistem em verter a expressão para ‘escopo do projeto’. Esse equívoco está presente até nas normas da ABNT. Eu uso o termo ‘abrangência’ e quando falo que escopo […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 08h50 - Publicado em 17 Maio 2012, 17h10

“Trabalho há muito tempo nas áreas de gestão da qualidade e gerenciamento de projetos. As normas e manuais estrangeiros falam em ‘project scope’ e os nossos apedeutas insistem em verter a expressão para ‘escopo do projeto’. Esse equívoco está presente até nas normas da ABNT. Eu uso o termo ‘abrangência’ e quando falo que escopo significa finalidade, muita gente boa pula da cadeira. Como resolver isso?” Paulo Roberto Granja

Para começar pela pergunta final de Granja: acredito que o único modo de “resolver isso” seja relaxar e reconhecer que o substantivo escopo ganhou uma nova acepção em português, um sentido emergente adquirido de forma um tanto constrangedora, a partir de uma tradução equivocada e preguiçosa do inglês, mas que hoje já circula com força suficiente para se impor.

Está certo o histórico da questão traçado pelo leitor. O substantivo masculino escopo, registrado em português desde 1677, tinha a princípio apenas dois sentidos: o literal de “meta, alvo, mira” e o figurado de “intuito, objetivo, desígnio”. Vindo do grego skopós por meio do latim scopus, estava ligado à ideia de ponto de vista, observação, mirada. Etimologicamente, o escopo é parente do telescópio, do microscópio e de outros vocábulos com a mesma terminação.

Ocorre que o inglês, que já no início do século 16 foi buscar a palavra scope no italiano scopo (mais uma vez, “meta”), conferiu-lhe de saída um sentido diferente: o de alcance, extensão, abrangência. Não fica muito claro como isso ocorreu – provavelmente deu-se outra interpretação à ideia de visão, com a troca do foco fechado num objetivo pela amplitude de todo o campo visual. O fato é que, em inglês, scope nunca significou objetivo. Apesar da origem comum, formava com nosso escopo uma armadilha para tradutores, um daqueles casos de “parece, mas não é”.

Armadilhas desse tipo, no entanto, são curiosas: quando multidões de tradutores caem na arapuca, ela deixa de ser considerada assim. Se tudo indica que a acepção de “gama ou limite de operações” é de fato um estrangeirismo semântico, produto de uma tradução servil, o fato de o Houaiss registrá-la – embora não o Aurélio, que costuma ser mais lento nesses casos – é um reconhecimento à amplitude de seu uso. Línguas mudam o tempo todo, e o erro também é um de seus motores.

Casos semelhantes de anglicismo semântico – hoje em estágios variados de aceitação, mas todos provavelmente destinados a um futuro pacífico – são o do verbo realizar com o sentido de “compreender, dar-se conta de” (to realize) e o do substantivo feminino planta na acepção de “instalação industrial” (plant). Não, eu também não gosto dessas palavras. Consolo-me com o fato de que não sou – ninguém é – obrigado a empregá-las em suas acepções anglófilas. Mas é como diz a velha tirada sobre as bruxas: que elas existem, existem.

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