Cobaia, mas pode chamar de porquinho-da-índia
A palavra “cobaia” é uma daquelas em que o sentido figurado se impôs de tal forma ao literal que grande parte dos falantes, talvez a maioria, nem sequer sabe que este existe. Substantivo feminino registrado em dicionários de português desde o início do século XIX, “cobaia” tinha – e tem – como primeira acepção a […]

A palavra “cobaia” é uma daquelas em que o sentido figurado se impôs de tal forma ao literal que grande parte dos falantes, talvez a maioria, nem sequer sabe que este existe.
Substantivo feminino registrado em dicionários de português desde o início do século XIX, “cobaia” tinha – e tem – como primeira acepção a de “porquinho-da-índia” (Cavia porcellus), pequeno roedor nativo da América do Sul que acabaria ganhando o mundo como animal doméstico.
A origem provável da palavra é o termo indígena çabujê, “rato que se come” (o porquinho-da-índia era uma iguaria muito apreciada pelos índios brasileiros). Os portugueses o transcreveram como çabuja, que no latim científico acabou virando cobaya.
A palavra latina passou também ao francês cobaye, nome menos usado do bichinho popularmente conhecido como cochon d’Inde. O espanhol registra conejillo de Indias (“coelhinho das Índias”) e o inglês, guinea pig (“porco da Guiné”).
É impossível compreender toda essa variedade sem os mal-entendidos geográficos que são comuns na história das palavras. A Guiné pode ter entrado na dança por um erro na interpretação da palavra “Guiana” ou devido às rotas triangulares (América do Sul-África-Europa) dos navios comerciais que introduziram a cobaia na Inglaterra – os estudiosos se dividem sobre isso.
Quanto à Índia, basta lembrar que o Novo Mundo teve durante muito tempo na Europa o nome de Índias Ocidentais, em que o adjetivo “ocidentais” corrigia – sem apagá-lo por completo – o equívoco geográfico original cometido por Cristóvão Colombo ao chegar por aqui. A palavra “índio” para designar o americano nativo tem a mesma explicação.
Muito usado em experimentos científicos, sobretudo na pesquisa de vacinas, o simpático animalzinho passou nas primeiras décadas do século XX, em todas as línguas mencionadas acima, a emprestar seu nome a “qualquer animal ou pessoa que seja objeto de experiências”. A data para o surgimento dessa acepção figurada em português é obscura. Em inglês, segundo o dicionário de Douglas Harper, seu primeiro registro é de 1920.