Ainda o particípio: existe a palavra ‘abrido’?
“Semana passada surgiu uma dúvida em sala de aula sobre o particípio do verbo ‘abrir’. Pesquisando em alguns sites referentes à língua portuguesa, vi que alguns desses sites utilizam a conjugação ‘abrido’, porém outros dizem que essa forma já foi correta e que não deve mais ser utilizada na formalidade. Afinal, é ‘aberto’ ou ‘abrido’?” […]
“Semana passada surgiu uma dúvida em sala de aula sobre o particípio do verbo ‘abrir’. Pesquisando em alguns sites referentes à língua portuguesa, vi que alguns desses sites utilizam a conjugação ‘abrido’, porém outros dizem que essa forma já foi correta e que não deve mais ser utilizada na formalidade. Afinal, é ‘aberto’ ou ‘abrido’?” (Helia Freitas)
É “aberto”, Helia. Não conheço estudioso que defenda o uso de abrido. A polêmica em torno dessa palavra se dá entre os que sustentam ser o particípio regular do verbo “abrir” uma forma antiga, caída em desuso, e os que alegam que abrido nunca existiu!
De uma forma ou de outra, fuja dele.
A tese de que abrido nunca existiu no português culto parece consistente. Minha gramática normativa preferida, a de Evanildo Bechara, não menciona o assunto, mas a “Nova gramática do português contemporâneo”, de Celso Cunha e Lindley Cintra, sim.
A dupla de autores é veemente ao listar o verbo “abrir” no grupo dos que têm “apenas particípio irregular, não tendo conhecido jamais a forma regular em -ido”. Nesta categoria estão os verbos dizer (cujo particípio é “dito” e não dizido), fazer (“feito” e não fazido) e escrever (“escrito” e não escrevido), entre outros. O mesmo vale para os verbos derivados destes, como desdizer, refazer, sobrescrever etc.
A defesa de “aberto” como único particípio histórico do verbo “abrir” inclui até a localização da fonte do possível mal-entendido: o adjetivo desabrido, “rude, violento”, existe acima de qualquer dúvida. No entanto, afirmam os autores, “não é particípio regular de ‘desabrir’, mas forma reduzida de desaborido, ‘sem sabor’, provavelmente de origem espanhola”.
Será? A etimologia de “desabrido” é um vespeiro dos mais controversos, mas não há dúvida de que Cunha e Cintra, gramáticos de respeito, fulminam com brio o esquisito abrido.
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