A pátria e a ‘mátria’
A palavra pátria, do latim patria, “terra natal”, sofreu tantos abusos ao longo da história que perdeu parte de sua força. O que não é necessariamente ruim. As comemorações relativamente sóbrias do último 7 de setembro – em gritante contraste com o grandiloquência dos mesmos festejos no período de ditadura militar inaugurado em 1964 – […]
A palavra pátria, do latim patria, “terra natal”, sofreu tantos abusos ao longo da história que perdeu parte de sua força. O que não é necessariamente ruim. As comemorações relativamente sóbrias do último 7 de setembro – em gritante contraste com o grandiloquência dos mesmos festejos no período de ditadura militar inaugurado em 1964 – são mais condizentes com o clima democrático.
Na linguagem de hoje, parece ser pelo menos tão comum encontrar a palavra patriota, “aquele que ama a pátria”, quanto a pejorativa patriotada, “demonstração exagerada ou exibicionista de patriotismo”, e o vocábulo pátria talvez seja até mais empregado em expressões jocosas como “pátria de chuteiras” e “salvador da pátria” do que a sério. Isso me parece saudável. Amar o país em que se nasceu é ótimo e, de modo geral, fácil, natural. Instrumentalizar esse sentimento como forma de opressão, não.
A etimologia de pátria nos leva, no fim das contas, à palavra pater, “pai”, a mesma que está por trás de padre, paternalismo, patriarca, patriarcalismo, patrício e compatriota. Outro benefício do período de baixa cultural que o termo pátria atravessa é a pouca disposição da turma politicamente correta para “denunciar” o sexismo nele embutido, o que nos poupa o constrangimento de ouvir proposto sem ironia aquilo que Caetano Veloso criou com espírito lúdico na canção “Língua”: a palavra mátria.