A diplomacia e a arte dos diplomas
Decepcionante, inconclusiva, esvaziada, a semana de negociações na Rio+20 pode ter sido tudo isso, mas, qualquer que seja o balanço de perdas, ganhos e impasses, o fato é que ele acaba por ser lançado na conta da diplomacia. Ninguém trabalhou mais do que ela esta semana. A semelhança entre as palavras diplomacia e diploma não […]
Decepcionante, inconclusiva, esvaziada, a semana de negociações na Rio+20 pode ter sido tudo isso, mas, qualquer que seja o balanço de perdas, ganhos e impasses, o fato é que ele acaba por ser lançado na conta da diplomacia. Ninguém trabalhou mais do que ela esta semana.
A semelhança entre as palavras diplomacia e diploma não é fortuita, embora os sentidos modernos pareçam distantes. Tudo começou na língua de Charles de Gaulle, o general e presidente francês que, como tantos outros militares, encarava os diplomatas com suspeita e cunhou sobre eles uma frase famosa: “Os diplomatas são úteis apenas com tempo bom. Assim que começa a chover, eles se afogam em todas as gotas”.
O português foi buscar o substantivo diplomacia já em meados do século 19 – ou seja, anteontem – no francês diplomatie. Este termo derivava do substantivo e adjetivo diplomatique, registrado pela primeira vez em 1708, segundo o Trésor de la Langue Française, com sentido bem distinto: “ciência que tem por objeto os diplomas, cartas e outros documentos oficiais, sua autenticidade, sua integridade, sua idade e suas variações ao longo do tempo”.
Só num segundo momento a palavra passou a ser empregada em francês para nomear a atividade de embaixadores, cônsules e outros funcionários do Estado dedicados às relações internacionais. Note-se que, curiosamente, diplomatie foi formado regressivamente a partir de diplomatique, e não o contrário.
Como explicar uma expansão semântica como essa? É provável que dois fatores simultâneos tenham contribuído para ela. Muito antes da acepção escolar hoje dominante, o principal sentido de diplôme – desde o latim diploma – era o de patente, título ou privilégio concedido a um cidadão pelo Estado, o que incluía, de modo bem específico, a “autorização de viajar à custa do Estado” (Saraiva). Se o direito de negociar em nome dele com representantes de outros Estados soa como uma extensão natural, também parece decisivo o entendimento de diploma, nesse caso, como nome genérico das próprias “cartas e outros documentos oficiais” que regem as relações internacionais.