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Por Veja correspondentes
Política, negócios, urbanismo e outros temas e personagens gaúchos. Por Paula Sperb, de Porto Alegre
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PMDB precisa de juízo e capacidade de se refazer, afirma Sartori

Para governador do RS, eleição de 2018 pode ser uma aventura; no estado, ele aposta na retomada da economia e acordo com União para superar crise financeira

Por Paula Sperb
29 ago 2017, 16h24

Para o governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori (PMDB), a eleição de 2018 pode ser uma “superaventura”. O gaúcho de 69 anos, nascido em Farroupilha e ex-prefeito de Caxias do Sul, cidades vizinhas na serra gaúcha, se diz preocupado com o futuro do país e espera que o “PMDB tome juízo”. Apesar de não ter apoiado a chapa de Michel Temer (PMDB) com Dilma Rousseff (PT) na eleição de 2014 – ele ficou ao lado de Aécio Neves (PSDB) –, diz que o presidente pode contar com ele e chegou a aconselhá-lo para que não se “preocupasse com a popularidade”. Para ele, a reforma política que está sendo ensaiada é insuficiente, “bem menor do que se esperava”, para promover mudanças na representatividade política junto à população.

No plano regional, correligionários defendem o seu nome como candidato à reeleição. Embora ainda não assuma a candidatura, Sartori defende a continuidade do projeto de governo que vem enfrentando uma grave crise financeira, com déficit estimado em 8 bilhões até 2018. Além de esbarrar na “tradição gaúcha” de não reeleger seus governadores, ele encara também o desgaste de vinte meses de salários parcelados dos servidores do Executivo. Cauteloso, não prevê quando o pagamento integral será retomado, mas diz contar que o programa de recuperação fiscal do estado junto à União, que está sendo negociado, possa dar um fôlego às contas públicas do Rio Grande do Sul. Sartori também está otimista com a concessão das rodovias estaduais à iniciativa privada, que deve ser lançada no ano que vem.

Em 2014, quando o senhor era candidato, imaginava que a situação do estado era tão grave quanto a que encontrou?
Sabíamos muitas coisas. Minha esposa Maria Helena [atual secretária de Desenvolvimento Social e ex-deputada estadual, de 2011 a 2015] tinha sido presidente da Comissão de Finanças e Planejamento [da Assembleia Legislativa], e o Giovani Feltes [atual secretário da Fazenda, eleito deputado federal em 2014] conduzia uma boa parte da discussão sobre as finanças públicas estaduais, especialmente, sobre a questão da dívida dos estados. O conhecimento era esse.

Acontece que sobreveio uma outra realidade. O maior fato foi a queda da economia. A retração econômica tirou qualquer possibilidade de enfrentamento financeiro, especialmente dos estados que tivessem muitos problemas, como o Rio Grande do Sul. Em 47 anos, o Rio Grande do Sul teve apenas sete anos de receita superior à despesa.

Além disso, você é obrigado a escolher prioridades. Nossa primeira atitude foi, ao conhecer tudo, no começo do governo, corrigir todas as questões. Evitamos muito falar sobre o passado, mas procuramos percorrer o Rio Grande do Sul com transparência e com verdade. Atitude, transparência e verdade. Pronto. Esse foi o caminho.

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Qual foi a maior dificuldade encontrada?
Algumas mudanças afetam toda sociedade, mas, notadamente, o mais difícil é o mundo corporativo. Foi o que mais se manifestou contrariamente a qualquer mudança. Poderia elencar aqui a criação de uma lei de previdência complementar, que está completando um ano de atividade efetiva e que muita gente achou difícil. Além disso, não posso deixar que o governante que vier depois de mim tenha contas a pagar ou reajustes no serviço público. Quando tiver equilíbrio financeiro, do que sobrar de recursos, 25% será para a máquina administrativa e 75% para investimentos, que é o que prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual, a primeira do país.

Também cortamos entre 30% e 35% de cargos em comissão, passagem, diárias, horas-extras… Horas-extras só para quem trabalha! Em alguns casos, as horas-extras já eram um aumento salarial. Em suma, houve o contingenciamento de todo o orçamento. E fizemos uma LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias] realista. Para este ano já foi aprovada uma LDO na mesma linha, e o orçamento que vamos encaminhar para a Assembleia até o dia 15 de setembro é bem realista.

Já existe um déficit previsto para a LDO?
Tivemos uma percepção no início de 2015 de que o nosso déficit seria em torno de 25,5 bilhões de reais até o final de 2018. Hoje, estamos mudando. Poderia chegar a 8,8 bilhões de reais, o que seria uma correção importante. Tudo depende da retomada da economia. Se retomar, poderemos ter um déficit menor. Isso sem falar no regime de recuperação fiscal. Se nós aderirmos e conquistarmos os 36 meses [sem pagar dívida da União, no valor total de 55,7 bilhões de reais], então será outra coisa.

Não há um risco de aumentar o endividamento ao aderir ao pacote de recuperação fiscal federal?
Ao contrário, vai diminuir o endividamento. Se deixarmos assim, a dívida vai crescer em 2020, teremos um acréscimo de 1 bilhão de reais. Mesmo tendo renegociado o débito e mudado a taxa de juros, teremos um acréscimo de 10 bilhões de reais na dívida se não aderirmos ao pacote.

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Sartori ao lado de Maria Helena, sua mulher, em festa que comemorou sua vitória na eleição ao governo gaúcho (Luiz Chaves/Palácio Piratini/Divulgação)

Que nota o senhor dá para o seu governo?
Olha, fui professor durante seguramente uns 20 anos. A pior coisa era dar nota. Depois me desloquei para o [cursinho] pré-vestibular, onde não precisava dar nota. Foi o melhor momento! [Risos] Não sou eu que vou me dar nota. A sociedade sabe. A única coisa que posso dizer é que, pelo fato de termos começado em 2015 a mostrar à sociedade a realidade financeira do estado, hoje captamos uma consciência dessa realidade. Então, é preciso insistir nela, ter coragem, ter atitude. Fiz mais de 50 viagens a Brasília atrás dos interesses do Rio Grande do Sul. Procurei fazê-lo discretamente, com calma, tranquilidade. Mas às vezes nos socorremos de instrumentos judiciais para preservar nossos interesses [o Supremo Tribunal Federal acatou pedido do estado para que as prestações da dívida com a União não sejam cobradas, que as contas não sejam bloqueadas e que o Rio Grande do Sul não seja inscrito nos cadastros de inadimplentes].

Um assunto que sempre divide opiniões no Rio Grande do Sul é a privatização do Banrisul. Ele está a salvo de ser privatizado?
Não há nenhuma possibilidade. Até penso que alguns setores da sociedade que dizem que vão privatizar o Banrisul estariam interessados nisso. É um patrimônio, nunca aventamos essa possibilidade. Mesmo que algumas autoridades nacionais, do Tesouro, tenham levantado essa possibilidade [como contrapartida à adesão ao programa de recuperação fiscal da União]. Da parte do governo estadual, nunca teve isso. Acho até um desrespeito que alguns tentem insinuar. Esse é um caminho traçado.

A Assembleia poderia ter votado a extinção do plebiscito para privatizar a CEEE, a CRM, a Sulgás [o plebiscito é obrigatório por lei, mas o governo Sartori tentou extinguir a obrigatoriedade sem sucesso]. Desejou que não e houve empecilho para a votação. Amanhã ou depois, quem não participou desse processo poderá ficar constrangido porque poderia ter feito, participado, ajudado na mudança, na transformação estrutural e não o fez. Não estou condenando ninguém, porque o princípio democrático é esse. Hoje, as dificuldades institucionais estão aí, a crise financeira nacional está aí.

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O senhor é candidato à reeleição?
Estou pensando no papel que tenho no estado. Hoje, eu diria que me preocupa muito o futuro do país. Porque a eleição do ano que vem pode oferecer muita aventura. Uma superaventura. Quanto ao local, sou defensor do projeto de transformação e mudança que nós começamos a operar. O que importa é o projeto, não a pessoa. O pessoal mais bem posicionado no país sempre teve presente isso e depois perdeu ao longo da história. Acabou voltando-se para si mesmo, como o poder público se voltou para si mesmo ao longo da história e hoje precisa se abrir, olhar para fora, criar um futuro diferente.

A modernização do estado hoje não pode ser considerada uma coisa ruim. Me lembro quando fui prefeito a primeira vez em Caxias do Sul, em 1992. O centro do meu diálogo com a sociedade e a discussão com os outros partidos era um governo de parcerias. Pá! Nunca fui tão criticado na minha vida como fui naquela oportunidade. Foi a primeira vez que fui exposto a uma situação assim. Estou convencido de que ninguém é contra parceria. Se o cara é de direita, não pode ter uma opinião progressista? E se o cara for de esquerda ou chamado progressista, não pode ter uma atitude moderna, atual e possível? O poder público, seja municipal, estadual ou federal, sem a sociedade, não consegue remover os obstáculos.

O senhor falou que se preocupa com os possíveis aventureiros na eleição do ano que vem. O que seria uma boa solução para o Brasil, em termos eleitorais?
Tem que parar um pouco, todo mundo pensar um pouco, estimular a sociedade a olhar com outro rigor. Não apenas o rigor da diminuição de todo mundo. Temos que olhar no sentido de somar para o país. Temos que trabalhar juntos para construir e saber que aquele que for governante escolhido pela população amanhã precisará da nossa ajuda e colaboração.

Em 2014, Sartori apoiou o candidato Aécio Neves (PSDB) e não a chapa de Dilma Rouseff (PT) e Michel Temer (PMDB) (Luiz Chaves/Palácio Piratini/Divulgação)

E qual a sua avaliação sobre Temer?
Eu não apoiei o Temer, né? [Sartori apoiou Aécio Neves (PSDB) à Presidência]. E, por não ter apoiado, me sinto tranquilo para colaborar com as mudanças e transformações que precisam ser operadas no Brasil. Da minha parte, ele pode contar comigo. Ele também entendeu na hora em que eu tinha outra opinião, outra posição. Eu já disse para ele: “Nunca se preocupe com a popularidade. Tome as atitudes que tem que tomar”.

A necessidade obriga a tomar atitudes que não são populares a curto prazo, mas amanhã ou depois vão ser. Por exemplo, a previdência complementar completou um ano. Mas para fazer o equilíbrio financeiro, nós vamos levar 25, 30 anos. Ficou um pouco mais facilitado porque antes era só o Executivo, mas agora já aderiu a Assembleia Legislativa, o Ministério Público, o Tribunal de Contas do Estado e a Defensoria Pública. Há possibilidades para que se construa a inserção dos municípios do RS [na previdência estadual]. Daí a sustentabilidade é melhor, muito maior, e os recursos como um todo podem ser contabilizados para diminuir o tempo da recuperação da previdência. Por isso, estamos encaminhando para a Assembleia uma mudança na estrutura do IPE [Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul], que vem sendo feita inclusive pelos governos anteriores. Desde 2004, ela vem passando por mudanças. Mas, agora, resolvemos separar definitivamente, com administração própria da previdência e administração própria da saúde para melhorar as condições e oferecer um melhor serviço para todos os servidores que precisam dessa área.

Sobre o parcelamento dos salários dos servidores. Há alguma previsão para regularizar o pagamento em 2018?
Depende muito. Já tivemos em torno de 20 parcelamentos [meses com salários parcelados]. Na verdade, acreditávamos muito que pudesse haver uma recuperação da economia. Sorte que o Rio Grande do Sul é benfazejo no agronegócio e teve uma produção extraordinária. Além disso, foi o único setor industrial que não foi penalizado. Ali permitiu o avanço. Tanto é verdade que o Rio Grande do Sul, em termos de produção de máquinas e implementos agrícolas, passa de 60% da produção nacional. Os outros setores – metalurgia, siderurgia, plástico -, por força das circunstâncias, foram penalizados.

Se tiver o regime de recuperação fiscal, poderá haver, sim, condições de melhorar. As circunstâncias indicam a continuidade desse processo. Até porque o pagamento para a União representa um quinto da folha de pagamento do Executivo. Porque podem pensar: “fez a recuperação fiscal, vai resolver todos problemas”. Não resolve. É apenas um quinto disso. Também temos que contar que a folha de pagamento tem 56% de inativos. Poderemos chegar ao final deste ano a 60%. Vai decrescer posteriormente, pelas medidas que estamos mudando. Isso tudo leva tempo. Para destruir, é mais rápido do que construir.

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Para o ano que vem, há medidas importantes que o senhor irá anunciar? Estariam aí as concessões rodoviárias?
Sim. As concessões rodoviárias foram aprovadas pela Assembleia. Procuramos o setor de planejamento do governo federal e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Com eles, conseguimos compor com o plano que o governo lançou em 2015, ainda com a presidente Dilma. Fomos discutir para que houvesse uma conexão e uma adaptação. Nosso interesse maior, nas concessões federais, é que se fizesse a partir de Santa Catarina para o Rio Grande do Sul. E nós criaríamos dois três ou quatro fluxos em direção ao Porto de Rio Grande. Contratamos uma consultoria, que é a KPMG, procuramos São Paulo, que tem a maior experiência de concessão de rodovias. Temos um pré-acordo de auxílio nessa área com o governador Geraldo Alckmin (PSDB), sob o ponto de vista técnico. O que nós queremos aqui? Que as concessões, elas podem demorar, mas saiam com todo cuidado possível, que seja feita dentro da normalidade, dentro da transparência, da honestidade – tem que usar esse termo mesmo. Se não, um processo dessa natureza nasce já com suspeita, não vale a pena começar.

O senador José Serra (PSDB) apoia Sartori em ato da eleição de 2014 (Luiz Chaves/Palácio Piratini/Divulgação)

Para o ano que vem?
Teremos novidade no ano que vem. Não tão avançado como a gente gostaria, mas é o começo de uma caminhada. Eu penso, não é porque estudei filosofia, que quem quer mudar tudo não muda nada. Vamos ter paciência, construir o processo com a agilidade que puder, mas com a garantia de que não haja dúvida do processo da concessão rodoviária. Temos um avanço grande nas rodovias, que são estratégicas para o Rio Grande do Sul. Já temos pronta a parte do Porto de Pelotas, que já transporta toras. É uma parceria público-privada com a Celulose Riograndense, que já retira vários caminhões da rodovia por dia. A mesma coisa no terminal do Porto de Santa Clara, o segundo maior de transporte por contêineres. Isso tudo está dando certo.

O PMDB gaúcho tem uma tradição muito forte, desde a redemocratização do país. Mas o momento não está tão tranquilo, com escândalos de corrupção envolvendo ministros [do partido, como Eliseu Padilha], respingando no alto escalão. O senhor acha que o PMDB gaúcho mudou?
Em primeiro lugar, não faria a pergunta dessa maneira. Todos os partidos têm esse problema. A vida partidária brasileira é que é complicada. Temos em torno de quase 40 partidos políticos oficiais no Brasil e outros tantos na lista esperando para se tornarem oficiais. Não acredito que tenhamos tanta ideologia para tanto partido político. Esse é um mal do processo que está aí, que deverá ser reconstruído. O PMDB estará fazendo convenções municipais no Rio Grande do Sul, espero que seja um espaço de renovação, de programação partidária forte. Temos uma queda muito forte e violenta da representatividade política dos partidos na relação com a sociedade.

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Todos nós precisamos construir uma vida partidária diferente. Ainda não vai acontecer tão cedo porque a reforma político-partidária e do sistema eleitoral vem bem menor do que se esperava. Portanto, não vai fortalecer a vida partidária. Vai viver de ocasiões de momentos, até chegar o dia que será feita uma reforma político-eleitoral muito mais avançada. Isso seria tratar do essencial. O essencial ainda não vai ser tratado, mas respeito a caminhada que outros pensam em fazer. Vejo que o PMDB teve um papel muito grande na história do país, que, junto com a sociedade brasileira e as forças democráticas, ajudou a construir a democracia. Quem sabe está na hora de pensar todo mundo, se agregar para construir uma outra realidade político-partidária. E o PMDB que tome juízo para enfrentar os dias que vêm pela frente, com coragem e determinação e com capacidade de se refazer.

 

Sartori participa de evento do PMDB durante campanha eleitoral de 2014 (Luiz Chaves/Palácio Piratini/Divulgação)
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