Augusto Heleno revelou mais ao calar do que ao falar
O general não teve a única participação melancólica da sessão. Houve mais duas.
O cidadão Augusto Heleno Ribeiro Pereira, profissão militar, fez o possível para não comparecer à CPI. Uma vez lá, respondeu a certas perguntas e, para não produzir prova contra si mesmo, calou sobre outras. Nos dois casos, revelou muito mais pelo que não disse do que pelo disse.
Disse que os acampamentos golpistas, de onde partiram hordas de vândalos, eram ordeiros e pacíficos. Que o GSI que montou, então sob o comando do general Gonçalves Dias, não errou nem se omitiu no 8 de Janeiro. Que Mauro Cid não participava das reuniões de Bolsonaro com os chefes militares. Que a delação de Cid é pura fantasia. Que acreditou quando Bolsonaro disse que ia jogar “dentro das quatro linhas da Constituição”.
Ao negar o óbvio ululante, Heleno revelou para alguns que é mais ingênuo do que a velhinha de Taubaté. Para os outros, que têm menos boa vontade, demonstrou o que todo mundo sabe: o mito de que militares não mentem é só um mito.
Loquaz no negacionismo, Heleno calou quando lhe perguntaram se estava presente na reunião em que Bolsonaro encomendou um crime ao pseudo-hacker Delgatti. E quando perguntaram se estava na reunião em que Bolsonaro conclamou os chefes das Forças Armadas ao golpe. E quando lhe perguntaram se o que aconteceu no dia 8 foi golpe, se foi terrorismo. E sobre o que acha do golpe de 1964 e da ditadura. E sobre se sabia das atividades do coronel Brilhante Ustra como torturador. E sobre se acredita que os militares deveriam intervir na democracia brasileira.
Heleno achou que, se respondesse a qualquer das perguntas acima, estaria criando prova contra si mesmo. Muito revelador.
Em poucos momentos, Heleno deixou escapar o que de fato pensa — ou quem de fato é. Quando lhe perguntaram se se considerava o “Poder Moderador”, respondeu que sim (para em seguida voltar atrás e se emendar). Quando a relatora senadora Eliziane Gama externou, com ironia, a conclusão de que Heleno “mudou de ideia” sobre a fraude (antes acreditava nela, agora não mais), respondeu aos palavrões — não surpreende: militares não gostam de ser questionados por civis e homens machistas não gostam de ser questionados por mulheres.
A participação de Heleno foi um momento melancólico, mas não foi o único. A senadora Ana Paula Lobato chamou Geisel de Gêisel. É assombroso e assustador que qualquer senador da República não saiba direito quem foi o general Ernesto Geisel.
E houve Sergio Moro, que compareceu para blindar Heleno e passar pano para o golpe. O ex-herói da Lava-Jato não perde uma chance de contribuir mais um pouco para a própria desmoralização.