Uma resposta a Caetano Veloso
Em sua coluna de domingo no Globo, Caetano Veloso volta a citar este blogueiro e comenta um post da nossa querida Yara Chiara, que responde ao colunista. Reproduzo o texto de Yara e volto com mais Caetano no post seguinte. * Rei, Caetano me citou em um artigo. Achei por bem escrever algo que encerre […]
Em sua coluna de domingo no Globo, Caetano Veloso volta a citar este blogueiro e comenta um post da nossa querida Yara Chiara, que responde ao colunista. Reproduzo o texto de Yara e volto com mais Caetano no post seguinte.
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Rei, Caetano me citou em um artigo. Achei por bem escrever algo que encerre minha participação no episódio do “Jabuti”. Não tenho outro espaço senão o desse blog tão “grosseiro” e “reacionário” que acha que alianças com Collor e Sarney não tornam “menos pior” o “melhor Lula”; que não vê a ética como epifania momentânea que, incapaz de conduzir e alimentar o show por todo o tempo, deve dar espaço, polidamente, para o avanço histórico que nos torna um “pré-” de algum “pós-” difícil de discernir. Beijo!
Não sei como se responde a Caetano Veloso. Na verdade, não sei nem se é possível responder a Caetano Veloso: ele é emblemático demais para a modéstia que a vida, não o capricho ou a dissimulação afetada, me impôs. Se eu tenho algo em comum com Machado, trata-se da condição de pessoa míope inegavelmente cabeçuda e irreversivelmente prosaica, “condenada ao lado prático das coisas”.
Caetano Veloso me desconcerta. Não é seu nome nem seu legado, porque a honestidade me obriga a dizer que pouco conheço de sua música e, na medida em que músico e música encarnam a história, pouco entendo do passado e do presente também. Caetano me desconcerta por descobrir tendências profundas naquilo que me toca por diversão, hábito, gosto ou ingênuo prosaísmo.
Não estou – como achava até então – discutindo, em tom educado e sem maiores pretensões, a qualidade de um livro que eu comprei na livraria porque precisava ler algum romance para contrabalançar a leitura técnica e muitas vezes entediante do dia a dia. Sendo um romance brasileiro, pensei, tanto melhor, contanto que seja bom.
Caetano me diz que, de alguma forma, com minha modesta e quase envergonhada crítica, reflito o estado da educação no Brasil; a trajetória sinuosa e cruel de nossas mazelas; a reação histérica, mas compreensível, que a ânsia pela integração no mundo letrado provoca.
Eu achei que havia apenas encontrado um romance ruim. Não é verdade. Caetano também me ajudou a descobrir quem sou nesse processo todo: fui a Budapeste e voltei para o Brasil como uma histérica complexada, latindo estridente e inutilmente contra uma inferioridade histórica que devo ter herdado em algum ponto da minha vida e da qual provavelmente jamais me desvencilharei.
Desse modo, confesso-me incapaz de discutir com Caetano Veloso, por irrelevante – eu, não ele; por histérica e complexada; por preconceituosa contra o vôo destemido do cantor que se projeta do palco para saltitar nas teclas do computador ou dançar, entre erros e acertos, nas pautas de um caderno.
A última consideração, porém, me deixa cética quanto a meu total desacerto: jamais deixei de ouvir Vinícius por amar sua escrita, nem deixei de amar sua escrita por gostar de sua música. Será que, sem precisarmos chamar Sérgio Buarque ou Leonard Cohen, podemos simplesmente perguntar se Chico tem o mesmo talento multiforme do Vinícius, (ainda) tão mais próximo de nós?
Quanto à parte do WikiLeaks, reconheço o dilema de Caetano com seu amigo: sendo a não-escolha uma escolha, é preciso fazer escolhas, sempre. Eu penso que nada há de ilegal no WikiLeaks e não me oponho a que continuem divulgando o que quer que seja, assim como considero a publicação dos “Papéis do Pentágono” por Noam Chomsky um marco da historiografia, embora estejamos tão afastados pela idade quanto pela ideologia. Os “Papéis” eram bem mais subversivos então do que o Wikileaks é hoje, quando celebridades se mostram dispostas a pagar uma fiança astronômica para libertar este novo símbolo do antiamericanismo em que se tornou Julian Assange.
Talvez seja essa mania de decidir que me faça chatear um amigo israelense ao me posicionar contra as políticas de Israel ou que leve Caetano a repetir, pela enésima vez, que gosta do livro “Budapeste”. A tal da “História”, em que tenho dificuldade de pensar se não estivermos falando de memória ou historiografia, pode me esmagar entre suas muretas, mas a verdade é que não ligo: a morte se encarregará desse trabalho com muito mais certeza e eficiência.
Mas sou assim, uma pobre coitada – visto não saber se há “diaba” como existem “presidentas” – “condenada ao lado prático das coisas” e, de mais a mais, “míope, cabeçuda e prosaica”.