Um poema para Lula
Tiradentes Esquartejado, de Pedro Américo: os sonhos heroicamente infantis de Lula. De fato, sua coragem não chega a tanto Vejam como são as coisas. No que a investigação depende das autoridades americanas, tudo está resolvido. A PF já foi informada quem sacou os dólares, para que banco foram enviados, quem é o dono da conta. […]
Tiradentes Esquartejado, de Pedro Américo: os sonhos heroicamente infantis de Lula. De fato, sua coragem não chega a tanto
Participei nesta segunda, como sabem, do programa Roda Viva, da TV Cultura. O entrevistado era Paulo Brossard, ex-ministro da Justiça e do Supremo. Lembrei que não foi por acaso que a ditadura corria atrás de constitucionalistas — nem que fosse para justificar suas lambanças —, e o governo Lula, de um criminalista. O regime discricionário buscava, ainda que pela violência institucional, se legitimar. Muitos governantes de agora precisam é tomar cuidado para não ir para a cadeia. São duas vergonhas opostas e combinadas. No melhor caso, teríamos na Justiça um constitucionalista para a era democrática. Ainda não foi desta vez.
É claro que é tudo um tanto chocante. Tanto mais quando se sabe que essa mesma PF que omite dados tem sido um dos carros-chefe do marketing lulista, o famoso “nunca antes Nestepaiz…” Sempre deu publicidade extrema a seus atos. Poderia dizer agora que está apenas preservando a investigação de especulações para pegar peixes graúdos. O que parece é que o sigilo protege justamente o tubarão.
O arremedo de luta de classes de Lula, esse arranca-rabo que ele promove, tem dado certo, para ele ao menos, até aqui. Depois da transubstanciação da semana retrasada — quando se ofereceu ao povo como um cristo pagão, nesta terça, foi a vez de brincar de Tiradentes. Falou de arrancar pernas, cortar, salgar… Tudo o que Lula sabe da Inconfidência Mineira deve se resumir àquele quadro de Pedro Américo, Tiradentes Esquartejado — eloqüente o bastante para a sua compreensão do mundo, se é que vocês me entendem.
Agressivo, populista, messiânico, percebe-se que o motivo de sua ira está no fato de que a oposição tem a ousadia de disputar com ele o poder. É o que o presidente da Câmara, o comunista do Brasil Aldo Rebelo, chama “golpe”. Onde já se viu isso? Daqui a pouco, vão começar a defender alternância de poder Nestepaiz… No dia em que carregou nas tintas de um martírio ao qual jamais se entregaria, seu ministro das Relações Institucionais falava num pacto nacional…
Se Lula não fosse um ignorante profissional, por escolha, arrogância, empáfia, em vez de sustos infantis sobre Tiradentes, eu lhe recomendaria Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meireles, que reputo o melhor livro de poesia — considerado o conjunto — publicado no Brasil no século passado. Há poemas muito melhores, esparsos, de outros autores. Falo dos vários cantos formando uma unidade. Há passagens verdadeiramente magníficas em que a autora reproduz, também na base material do verso, a esfera de conspiração de Ouro Preto ou, então, o trabalho nas minas. Versos de rara ourivesaria. Segue um trecho sobre Joaquim Silvério dos Reis, a traição, Cristo e Tiradentes. A figueira que aparece no poema é uma referência à arvore em que Judas se enforcou. Os “traidores” de hoje, como sabemos, encontram melhor destino. Afinal, não são socorridos pelo arrependimento.
Melhor negócio que Judas
fazes tu, Joaquim Silvério:
que ele traiu Jesus Cristo,
tu trais um simples Alferes.
Recebeu trinta dinheiros…
– e tu muitas coisas pedes:
pensão para toda a vida,
perdão para quanto deves,
comenda para o pescoço,
honras, glórias, privilégios.
E andas tão bem na cobrança
que quase tudo recebes!
Melhor negócio que Judas
fazes tu, Joaquim Silvério!
Pois ele encontra remorso,
coisa que não te acomete.
Ele topa uma figueira,
tu calmamente envelheces,
orgulhoso e impenitente
com teus sombrios mistérios.
(Pelos caminhos do mundo,
nenhum destino se perde:
há os grandes sonhos dos homens,
e a surda força dos vermes.)