Um Oscar para a estupidez “dazelite”. Que vergonha, meu Deus!
Diogo Mainardi trata de cinema nacional no podcast. Ouçam lá. Daqui a pouco, publico um trecho. Leiam este texto, que está no Estadão On Line. Volto em seguida: Por Roberta PennafortA escolha do longa-metragem brasileiro O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias, indicado à Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, a […]
Por Roberta Pennafort
A escolha do longa-metragem brasileiro O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias, indicado à Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, a uma vaga entre os cinco concorrente ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 2008, como sempre, é feita por uma comissão nomeada pelo Minc. Diante da polarização por Tropa de Elite, de José Padilha, um dos favoritos na opinião do público, os jurados explicaram os motivos de seu voto pelo filme de Cao Hamburger. O filme de Padilha foi exibido no Festival do Rio na semana passada, mas estima-se que já tenha sido visto em cópias piratas por cerca de 3 milhões de pessoas.
O júri que escolheu o indicado brasileiro foi formado pelos cineastas Hector Babenco e Bruno Barreto, os críticos Rubens Ewald Filho e Leon Cakoff, e os jornalistas Ana Paula Sousa e Pedro Butcher. Segundo eles, a decisão foi pensada nas chances que cada filme teria na competição. E o longa de Cao Hamburger demonstrou ser o mais competitivo porque se enquadra “no perfil histórico” dos vencedores de cerimônias passadas.
Cakoff lembrou que a Academia gosta de histórias que têm um “tratamento humano da criança”. Igual pensamento revelou Ewald Filho, veterano na cobertura do Oscar, para quem os eleitores, na maioria senhores com mais de 60 anos, têm idéias preconcebidas do que vão assistir. “Esses velhinhos certamente não gostariam de ver Tropa de Elite.”
Sobre o filme de José Padilha, talvez o preferido do público, os jurados deixaram claro que suas chances seriam menores. “Não estamos escolhendo o melhor filme do ano e sim aquele que vai representar o Brasil em uma seleção para um prêmio americano”, completou Ewald Filho.
O júri entendeu ainda que o longa que trata do cotidiano do batalhão de operações especiais da polícia do Rio se assemelha a filmes norte-americanos e até a seriados de televisão, o que reduziria suas possibilidades de vencer. Na reta final, os dois filmes disputaram com O Céu de Suely a escolha decisiva.
Iniciando sua estratégia de conquista do mercado americano, O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias estréia nos Estados Unidos em dezembro. No dia 22 de janeiro, a Academia de Ciências de Hollywood anuncia os cinco finalistas, que vão disputar a estatueta na cerimônia de entrega, prevista para o dia 24 de fevereiro, no Kodak Theatre, em Los Angeles.
VolteiÀs vezes, tenho vontade de fazer como Lula e declarar que tenho muita vergonha “dazelite” brasileira. O que vai acima é só um trololó para que a comissão de notáveis justifique a sua escolha na contramão do que fez o público. As alegações são todas estúpidas, pobres, cretinas. Em tempo: Não vi Tropa de Elite, mas vi O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias. Falo dele daqui a pouco.
Repararam que não há uma só justificativa estética para a escolha? Zero! Nada! As razões seriam todas, quem diria?, “de mercado”: com o filme de Cao Hamburger, estaríamos passando mel no beiço dos velhinhos da Academia. Afinal, eles gostam de criancinhas… Há um cheirinho bem bolorento no ar. Sem ver, começo, como já escrevi, a gostar cada vez mais de Tropa de Elite. Ele não caiu no gosto da turma que faz passeata de bata branca e, junto com Mano Brown, é, como é mesmo?, “contra a violência”. Rubens Ewald Filho deu a sentença que explica a covardia intelectual da média dos “artistas” brasileiros: “Não estamos escolhendo o melhor filme do ano, e sim aquele que vai representar o Brasil em uma seleção para um prêmio americano”. Entendi: é a lógica do chimpanzé que usa talheres para provar que pode ser um “deles”. Quem, num júri, afirma que não escolheu “o melhor” se autodefine. É nisso que enterram o nosso dinheiro.
Agora o filme
O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias, de Cao Hamburger, não é um filme pra velhinhos, mas pra crianças. É fraco. Quem, como eu, tem filhos na faixa de 8 a 12 anos, conhece Castelo Ra-Tim-Bum, um excelente programa infantil que era transmitido pela TV Cultura, com direção de Hamburger. Chegou a virar peça de teatro e a licenciar brinquedos. Com competência gerencial, teria virado uma máquina de ganhar dinheiro (inclusive para a TV pública), com produtos, parque temático, essas coisas do capitalismo adulto americano. No Brasil, o ativo virou pó. Foi parar na lata do lixo. As minhas filhas gostavam do programa. Eu via com elas. Gostava.
O filme de Hamburger é um Castelo Ra-Tim-Bum com temática adulta: à receita original, ele acrescentou a trama política; aquela de sempre: ditadura militar de um lado, bonzinhos de esquerda de outro etc e tal. O garotinho do filme de Hamburger é o bruxinho Nino do programa infantil de Hamburger: ambos não vivem com seus pais; um está sob os cuidados do tio (na TV); o outro, do amigo do avô (filme). Um mora num castelo cheio de mistérios (o bruxinho); o outro, num prédio e numa vila que lhe permitem uma rotina com algumas aventuras. Até os hábitos estranhos do tio bruxo da TV viram rituais judaicos no filme. Tudo, em suma, rigorosamente igual. Sempre acho divertido quando vejo uma história infantil se transformar num filme adulto com um truque ou outro. Lembro-me de A Vida é Bela, de Roberto Benigni. Na cadeira do cinema, pensava: “Mas eu já vi esse filme”. Tinha visto mesmo: era Bambi.
Acho interessante que as “nossazelite” escolham um filme para crianças para, como eles dizem pomposamente, representar o Brasil. A cultura nacional não tem merecido mesmo ser tratada como adulta. Torço para que venha o Oscar. Quem sabe isso incentive uma estética nacional. Na entrada dos cinemas, os espectadores passarão a receber uma chupeta de presente. Com os logos da Petrobras, do Banco do Brasil e da CEF.