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Reinaldo Azevedo

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Soninha, futura secretária de Doria, concede entrevista desastrosa e nega promessa clara do agora prefeito eleito; tem de ser trocada já

Programa, ou sei lá como chamar, anunciado por ela é justamente aquele que foi derrotado nas urnas; o que venceu no primeiro turno é outro; que Doria comece marcando a diferença já!

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 4 jun 2024, 19h41 - Publicado em 11 nov 2016, 07h20

 

O prefeito eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), precisa tomar cuidado para que não comece a se desmentir antes mesmo de tomar posse. Por que digo isso? Se a maioria dos paulistanos quisesse o que promete, anuncia, sonha ou delira Sônia Francine (PPS), vereadora eleita e anunciada secretária municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, teria votado em, deixem-me ver…, em Fernando Haddad… Teria votado em Luiza Erundina, do PSOL. A entrevista concedida por “Soninha” à Folha é uma impressionante soma de disparates — resvalando, adicionalmente, na grosseria pura e simples. Explico.

Comecemos pelo elementar. Doria prometeu acabar com o programa “Braços Abertos”, implementado por Haddad. Comprovado está que ele estimula o consumo de crack, em vez de coibir. O programa continua, diz Soninha, mas submetido a condicionalidades. Ah, bom… Diz ela: “Condicionar a remuneração à participação de oficinas, consultas, medicação, por exemplo. E podemos dar um voucher, e não dinheiro, que dê direito a almoço num restaurante, roupa nova, ingresso no cinema, viagem”.

Entendi. E quem impediria o dependente de vender o dito-cujo, fazer dinheiro e comprar a pedra? Tenham paciência!

Mas calma que também não é assim. Indagada se o voucher não poderia ser recusado pelos dependentes, ela se desdiz sem problema: “Podem ter autonomia para fazer o que quiserem com o dinheiro, mas a condicionalidade tem que ser revista. Se concluirmos, a partir de muita análise e reflexão, que o dinheiro é importante no tratamento, então poderemos mantê-lo”.

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Entendeu, leitor?

No momento verdadeiramente estupefaciente da entrevista, afirma:
“No mundo dos sonhos de Soninha Francine, a gente iria sintetizar o princípio ativo da maconha para ministrá-lo de maneira controlada. Existem estudos demonstrando que surte efeito para o auxílio da abstinência. A prefeitura deveria permitir que seja feito um estudo. Não quero desrespeitar a lei, quero uma interpretação compreensiva dela. Quem seria contra usar morfina no tratamento de câncer? Não sei o que o prefeito [eleito] pensa disso, sei que o Ronaldo Laranjeira, que é o principal mentor do Recomeço, abomina. Esse embate meu com ele é antigo. Defendo a legalização da maconha, ele acha absurdo. Essa postura dele, super rígida, inflexível e intolerante, gera impressões erradas a respeito do Recomeço. Dá a impressão que o Recomeço é só trancafiar dependente e pronto e o programa é muito mais que isso –tem oficinas, avaliações médicas e sociais e a internação compulsória é rara.”

Tenho mais o que fazer do que viajar “no mundo dos sonhos de Soninha Francine”! A comparação com a morfina dá conta da qualidade da argumentação. O que ficou claro na campanha é que o agora prefeito eleito disse que o norte seria o programa “Recomeço”, de que Ronaldo Laranjeira é o grande mentor. Tachar de “intolerante” alguém que discorda dela e que foi usado como uma espécie de estandarte do candidato Doria é, além de grosseiro, uma trapaça com o eleitor.

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E Soninha deixa claro que não só pretende manter o Programa Braços Abertos como está determinada a extremar os seus defeitos. Leiam esta pergunta e esta resposta:
Os hotéis do Braços Abertos serão mantidos?
O objetivo tem que ser vaga em hotel social para todos, inclusive usuários de álcool, cocaína. Continuaria abrindo hotéis, mas não só para usuários de crack. São Paulo precisa de muito mais hotéis sociais, não necessariamente vinculados ao trabalho –ao tratamento, sim. É um modelo melhor que albergue.

O seu estoque de ideias ainda não acabou. Ela  pretende também criar campings para viciados. Vejam que idílico:
“Por que não admitir um acampamento decente, como se fosse um camping, com chuveiro, regras, espaço de convivência. Não são refugiados? Se oferecermos um acampamento decente para refugiados, contemplaremos duas necessidades básicas: privacidade e convivência. O albergue não tem uma coisa nem outra. Em um camping, você pode ter uma área de convivência, área de refeições, área de preparo para refeições, um lugar para ficar tocando um violão.”

Já sonhou, leitor? Mas é preciso haver um lugar para isso. Que tal isto aqui?
Onde seriam esses campings?
Embaixo de viadutos, por exemplo. É melhorar o que já tem. Temos de chegar lá e dizer: “vamos arrumar isso aqui direito?” Vamos separar lugar de comer, do lugar de ir ao banheiro, do lugar de dormir? Só de organizar o que já existe… Esse não é o objetivo. O objetivo é criar acampamentos [com mais estrutura, em outros lugares]. Mas é uma providência imediata e urgente. Em outros países, você tem mais ou menos isso, só que são trailers. Acho bastante razoável que você ofereça barracas de camping. Um dos desafios é respeitar a necessidade de privacidade e a necessidade totalmente humana de convivência das pessoas.

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E ela é uma usina fervilhante de ideias. Indagada se a pasta que lhe foi prometida vai englobar “Política para as Mulheres”, respondeu:
“Ainda não sei como vai ser. Eu quero tudo para mim, pode me mandar que eu quero. Mas pode ser que mulheres, LGBT, idosos, imigrantes fiquem sob a Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania. Mas vou trabalhar muito com esses assuntos também.”

Há uma máxima segundo a qual nada se parece tanto com um conservador como um esquerdista no poder, e nada é tão esquerdista como um conservador com a caneta na mão… Sempre achei a tese meio capenga. Mas talvez tenha a sua virtude.

Em 2020, a gente tenta o PSOL. Quem sabe o partido tenha uma ideia melhor do que “o mundo dos sonhos de Soninha Francine”.

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Um jornal americano comparou Doria a Trump. É uma rematada besteira. Mas o prefeito eleito poderia emprestar ao menos uma vez um bordão daquele senhor, chamar Soninha e dizer: “Você está demitida”.

Encerro
Doria foi eleito no primeiro turno. Uma proeza e tanto. A sua ascensão foi meteórica. E isso se deveu, já escrevi aqui, à clareza da campanha e ao repúdio às ambiguidades. Os paulistanos entenderam o que ele propunha. E a resposta à Cracolândia estava longe desse roteiro dos sonhos de Soninha.

ESSE PROGRAMA DE SONINHA PERDEU A ELEIÇÃO EM 2016. O QUE GANHOU FOI OUTRO.

Doria deixou claro que não é um político de corte tradicional. Também acho que não. Que marque a diferença já. Soninha tem de sair antes de entrar.

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