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Reinaldo Azevedo

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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura

Segundos

Abaixo, segue a transcrição do diálogo dos pilotos do avião da TAM, divulgada pela CPI. Volto em seguida: Hot 1 e Hot 2 são os comandantes. Eles eram Henrique Stephanini Di Sacco, 53, e Kleyber Lima, 54. Hot 1: Está ok? Tudo certo?Hot 2 diz que está tudo OK na cabine e pergunta onde irão […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 22h17 - Publicado em 1 ago 2007, 16h13
Abaixo, segue a transcrição do diálogo dos pilotos do avião da TAM, divulgada pela CPI. Volto em seguida:

Hot 1 e Hot 2 são os comandantes. Eles eram Henrique Stephanini Di Sacco, 53, e Kleyber Lima, 54.

Hot 1: Está ok? Tudo certo?
Hot 2 diz que está tudo OK na cabine e pergunta onde irão pousar.
Hot 1: Eu acabei de informar.
Hot 2: Eu não ouvi, desculpe, ela falando.
Hot 1: Mas ela ouviu. Congonhas.
Hot 2: É Congonhas? Que bom. Ela deve ter ouvido, obrigado.
Hot 1: Lembre-se que temos apenas um reverso.
Hot 2: Sim, nós só temos o esquerdo.

TAM 3054 reduz velocidade para aproximação e chama a torre.
Hot 1: Boa tarde.
Hot 2: Boa tarde.
Hot 1: Torre de São Paulo, aqui é TAM 3054.
Torre: TAM 3054 reduza a velocidade mínima para aproximação. O vento é norte 106.
Hot 1: Eu vou reportar quando estiver ok.
Torre: Autorizado.

[Ele voava a 6.000 pés. Os trens de pouso descem.]
[Check list final. Uma verificação indica que a aeronave passa por Diadema.]
Piloto avisa cabine de comando de que estava pronto para pousar.

Hot 1: Aterrissando sem azul. Pista de chegada à vista, pousando.
Um dos comandantes pergunta à torre sobre a condição da chuva, da pista, se ela está escorregadia.
Hot 1: TAM em aproximação final a duas milhas de distância. Poderia confirmar condições?
Torre: Está molhada e ainda escorregadia
Torre: Eu reportarei quando a 35 estiver liberada. 3054 na final.
Torre responde que outra aeronave está começando a decolar.
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Torre: TAM 3054. 35 à esquerda. Autorizado para pousar. A pista está molhada e escorregadia. O vento é 330 a 8 nós.
Hot 1: 330 a 8, é o vento.
Torre: Checado, 3054, 3054 Roger. O pouso está liberado. O pouso está liberado.
Piloto automático desconectando. Som de três cliques indica a reversão do CAT 2 ou 3 para CAT 1, ou seja, para aproximação visual.]

Torre: Inibido a descida para mim. Tira o sinal.
Hot 2: Um ponto agora. Ok?
Hot 1: Ok.
Torre: Ok. Retardar, retardar.

[Som do movimento do acelerador. Barulho do motor aumenta. Som de toque na pista.]

Hot 1: Reverso 1 apenas. Spoilers nada.
Hot 2: Olhe isso! Desacelera! Desacelera!
Hot 1: Eu não consigo, eu não consigo. Oh, meu Deus! Oh, meu Deus!
Hot 2: Vai! Vai! Vira! Vira! Vira!

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[Som de batida. Pára som de batida.]

Torre: Ah, não.

[Som de gritos. Voz feminina. Som de batida.]

Voltei
Eu não acredito na existência de pessoas que não têm medo de avião, por mais que elas me assegurem que, para elas, tanto faz estar no céu ou no chão. A transcrição acima me faz crer que se trata de um medo, vá lá, justificável. Ninguém voa nas asas das estatísticas. Vejam ali: em poucos segundos, o regular, o corriqueiro, o banal, se transforma numa tragédia de proporções inéditas. Quando um dos pilotos clama “Oh, meu Deus! Oh meu Deus!”, o desastre ainda não se consumou, mas se vislumbra o inevitável.

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Não pretendo infundir o meu próprio medo em quem não tem. Sei que os carros, proporcionalmente, matam muito mais. Qual é a diferença? Eles nos dão a ilusão ao menos de que sempre resta um recurso. No avião, é tudo ou nada. Quase sempre, felizmente, dá o nada. No avião, a aposta pode ser mais segura, mas a margem de manobra é quase sempre nenhuma.

Tanto pior se o aeroporto for, como se vê, Congonhas. Com área de escape e barreiras, como já há em alguns aeroportos no mundo, as 199 pessoas teriam alguma chance – dois outros acidentes, por razões idênticas, aconteceram antes no mesmo tipo de aparelho: um deles não matou ninguém; outro matou “apenas” três, conforme revela a VEJA desta semana, que antecipou a falha humana como um dos fatores da tragédia.

Sempre rejeito as ilações ou afirmações de que tragédias deixam lições. A civilização supõe que havemos de aprender com outra didática, com outra pedagogia. Esta, do vôo da TAM, não deixou nenhuma, a não ser um rastro de tristeza em 199 famílias e um país traumatizado. O que ela fez foi revelar as condições precárias em que se voa no Brasil. Dos instrumentos de navegação aérea propriamente às ditos às pistas dos aeroportos, passando pela burocracia que cuida do assunto, descobrimos uma estrutura mambembe, ineficiente, carcomida pela partidarização, gerida por irresponsáveis e faroleiros.

A melhor evidência foi a pressa com que o governo anunciou o “novo” aeroporto em São Paulo, o que é coisa para acontecer um dia – um dia, vocês sabem… Uma semana depois do anúncio estrepitoso – a ministra Dilma Rousseff chegou até a sugerir que já sabia o local, mas não divulgaria para evitar especulação imobiliária -, descobriu-se o óbvio: o mais rápido, barato e racional será a construção de uma nova pista e de dois novos terminais em Guarulhos. Mais: também a pista desse aeroporto pede reforma imediata, já caminhando para a miséria.

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A triste verdade é que os 154 mortos da Gol não bastaram para que o governo interviesse no setor. Foram necessárias outras 199. E isso é história. O resto é Marilena Chaui.
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