Política com um pouquinho de poesia. Ou: a fusão das oposições pode fazer desandar o poema. Ou: Aécio, Serra, Alckmin e Olavo Bilac
A esquerda da imprensa paulista está tão interessada em destruir Gilberto Kassab que não se dá conta — e não faço juízo de valor, apenas registro um fato — da chacoalhada que ele deu no statu quo partidário brasileiro. Se será para o bem ou para o mal, vamos ainda ver — tendo a achar […]
A esquerda da imprensa paulista está tão interessada em destruir Gilberto Kassab que não se dá conta — e não faço juízo de valor, apenas registro um fato — da chacoalhada que ele deu no statu quo partidário brasileiro. Se será para o bem ou para o mal, vamos ainda ver — tendo a achar que será positivo —, mas o fato é que o partidos passaram a planejar o seu futuro a partir de uma realidade: o PSD.
Leitores me perguntam o que acho da notícia de hoje da Folha, segundo a qual o senador Aécio Neves (PSDB-MG) — que, no noticiário, aparece sempre no comando de um processo — planeja fundir, em 2013, PSDB, PPS e DEM numa única sigla. Ainda segundo a apuração de Catia Seabra, Sérgio Guerra, o presidente dos tucanos, gostaria de ver isso acontecendo já.
Como não canso de ouvir por aí — para alegria daquela senhora que escreveu aquele livro alternativo de língua portuguesa —, “possa ser, possa ser…” Nota à margem: essa expressão deve provocar orgasmos na turma da sociolingüística alternatvo-esquerdopata. Afinal, quando um falante diz “pode ser”, expressa uma incerteza; já que o modo da incerteza é o subjuntivo, o “possa ser” seria ainda mais sábio, né? Que linda a verdade natural do povo!!! Não resisti à tentação de cutucar a “gramática diferenciada”… De volta à política.
“Possa ser”, mas não sei, não!
E se acontecer o contrário do que imagina, segundo a Folha ao menos, o senador Aécio Neves? Processos de fusão partidária também escancaram as portas para a mudança de legenda, não é mesmo? Qualquer democrata, tucano ou socialista do PPS pode alegar que a sua agremiação se descaracterizou. Se o governo Dilma estiver pelas tabelas em 2013, a fusão pode parecer uma boa idéia; se a oposição não tiver um nome que as pesquisas apontem como competitivo e se Dilma aparecer na liderança, a fusão pode é irrigar as forças do governismo.
Segundo a Folha Online, José Serra e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, não se entusiasmaram muito com a idéia, considerando-a precipitada. “Não é uma idéia que está posta. É uma discussão fora de hora”, teria afirmado o primeiro. “Eu respeito as idéias, eu respeito o Aécio, mas é muito cedo para essa discussão”, considerou o segundo.
E como eu avalio a essência dessa proposta? Posso apelar a um soneto do injustamente maltratado Olavo Bilac, dizendo “A Um Poeta” como deveria ser um poema? Segundo ele, a receita é esta:
Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino, escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!
Mas que na forma se disfarce o emprego
Do esforço; e a trama viva se construa
De tal modo que a imagem fique nua,
Rica, mas sóbria, como um templo grego.
Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E, natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifício.
Porque a beleza, gêmea da Verdade,
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade.
Voltei
Em algumas versões, omite-se aquela vírgula depois de “Beneditino”, transformando o vocativo em sujeito e os verbos na segunda pessoa do modo imperativo em terceira pessoa do indicativo. Acredito aqui na minha “Obra Completa”, com vírgula. Trata-se de um aconselhamento a uma jovem poeta; um “como fazer”. Mas essa minha observação é filha do tempo em que a professora Heloísa Ramos ainda não havia revolucionado a língua em busca de “uma vida melhor”. Adiante.
Há um mito de que a política mineira é como deve ser o poema do Beneditino, com “a forma disfarçando o emprego do esforço”, com a construção de “uma trama viva”, que, no entanto, parece simples e natural, sem jamais mostrar “os andaimes do edifício”.
Sendo mesmo essa a proposta de Aécio, conforme a noticia a Folha, tenho pra mim que há andaimes demais à mostra; que o “emprego do esforço” é “muito visível”; que a “trama viva” parece muito pouco natural. Uma coisa é uma fusão partidária resultar na escolha de um nome à Presidência; outra é escolher um nome à Presidência que requeira uma fusão partidária. Parece-me, por pouco natural, uma caminho bastante difícil. Há, isto sim, um risco de enfraquecimento da oposição.
Nesse caso, o poema sairia pela culatra.