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Reinaldo Azevedo

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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura

Os debates na TV. Ou: desconstruindo o festival de bobagens

Os leitores dos demais estados digam o que acharam do debate promovido ontem pela Globo entre candidatos ao governo. O de São Paulo foi uma lástima — e isso nada tem a ver com as regras ou com a organização em si. O fato de haver sorteio de temas em duas rodadas até ajuda a […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 14h06 - Publicado em 29 set 2010, 07h59

Os leitores dos demais estados digam o que acharam do debate promovido ontem pela Globo entre candidatos ao governo. O de São Paulo foi uma lástima — e isso nada tem a ver com as regras ou com a organização em si. O fato de haver sorteio de temas em duas rodadas até ajuda a fazer um confronto de idéias um pouco mais qualificado. A questão é de outra natureza. Neste estado, foi preciso convidar seis debatedores: Paulo Bufalo (PSOL), Fábio Feldman (PV), Paulo Skaf (PSB), Celso Russomano (PP), Aloizio Mercadante (PT) e Geraldo Alckmin (PSDB). Os dois primeiros dão traço nas pesquisas; o terceiro tem entre 2% e 3%; o outro, entre 7% e 8%. De acordo com os levantamentos, até agora, o tucano vence no primeiro turno (entre 49% e 51%), e Mercadante anda aí pela casa dos 23%, 24%. A quatro dias (ontem) da eleição, resta evidente que, se houver um segundo turno, ele se dará entre Alckmin e Mercadante. O que os outros candidatos faziam lá?

Nada! Apenas atendiam a uma ridicularia que está entre a lei e o acordo. Em tese, todos os candidatados teriam de ser convidados porque a TV, como concessão pública, teria de dar a todos igual espaço etc — vocês conhecem a patacoada. Então se opta por um critério, num acordo com Justiça e Ministério Público Eleitoral: chamar apenas os partidos que têm representação na Câmara (no caso da Presidência) e na Assembléia (no caso da disputa ao governo). Levar aquelas nulidades todas, que não seriam eleitas síndicos dos respectivos prédios em que moram, é o preço a pagar para que o debate aconteça. E o eleitor/telespectador fica, então, exposto àquela impressionante avalanche de bobagens. Faço uma nota à margem: Feldman tem um comportamento civilizado e responsável em debates, mas essa não é a hora de divulgar o partido.

É preciso mudar a lei urgentemente. Esse negócio de a TV ser obrigado a convidar esse ou aquele porque é uma concessão pública é um disparate e caracteriza, obviamente, um dos muitos disfarces que tem a censura no Brasil. A quatro dias do pleito, é uma estupidez ter de chamar para um confronto de idéias pessoas que são quase candidatas de si mesmas. Quem perde? O eleitor, que se vê privado de um debate qualificado. A razão é muito simples: despreparo dos competidores. O debate acaba sendo usado apenas como vitrine para disputas futuras. Ou alguém duvida que Skaf, por exemplo, que se intitula “a zebra”, vai tentar a Prefeitura da capital daqui a dois anos?

Ora, já basta a lei obrigar a concessão de tempo na TV, nos horários político e eleitoral, a legendas que só existem no papel. Há quem use a mamata para convocar greve de trabalhadores. É um vexame! O único critério que deveria determinar o convite para o debate deveria ser mesmo o jornalístico. E ponto final.

Prendam a Polícia e soltem o Marcola
Escrevi alguns posts ontem, ao longo do debate, apontando alguns absurdos. Falo um pouco mais a respeito. As duas áreas do Estado de São Paulo que mais apanharam de pessoas que não saberiam fazer o “O” com o copo foram a segurança e a educação. O quase-empresário Paulo Skaf, presidente licenciado da outrora respeitada Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), aquele que se intitula “a zebra”, chegou a afirmar que a queda drástica do número de homicídios em São Paulo se deve à aprovação do Estatuto do Desarmamento e a uma suposta ação do crime organizado para combater os homicídios.

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Fosse executivo da minha empresa, dava-lhe um pé no traseiro por incapacidade de demonstrar pensamento lógico. Como o estatuto tem alcance nacional, Skaf deveria explicar por que, então, os homicídios não caíram igualmente em todo o Brasil. Em vários estados do Nordeste, houve um crescimento brutal de ocorrências. A queda do índice de homicídios no país como um todo se deve aos fantásticos números exibidos por São Paulo. Como já informei aqui, o Estado está no antepenúltimo lugar no ranking dos estados com mais homicídios, e a capital paulista está em penúltimo.

Se bandido agora combate homicídio, então vamos prender a polícia e soltar o Marcola, que poderia ser o secretário de Segurança caso Skaf fosse eleito. Tenho uma idéia melhor: vamos chamar o homem para o Ministério da Justiça caso Dilma se eleja, e Fernandinho Beira-Mar vira secretário nacional de Segurança. Juntos, eles passariam um “salve”: nada de homicídio! E a paz estaria selada. Bem, Marcola já leu Nietzsche. Não deixaria de elevar o nível médio de leitura do governo petista.  Não é tese de zebra, mas de jumento.

Delinqüência intelectual
Mas é possível descer a rampa. Celso Russomano (PP) — nem Paulo Maluf quer saber dele, justiça se faça — foi quem conseguiu juntar em doses realmente elevadíssimas ignorância e prepotência. Este senhor é dono de uma falta de inteligência agressiva e propositiva. Não sabe o que fala, mas está sempre fazendo “propostas”. Segundo ele, morrem mais pessoas em São Paulo do que na guerra do Iraque. Ele deve ter achado a sua idéia fabulosa! O assessor que lhe soprou a asneira deve ter pensado: “Que argumento matador (ooops!)!”  Na conta de Russomano, só entram os 4,5 mil soldados americanos mortos, mas não os 100 mil iraquianos.

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Ainda que a sua relação fizesse sentido (é uma estupidez!), o contingente máximo de soldados americanos no Iraque foi de 160 mil. Dado que morreram 4,5 mil soldados ao longo de sete anos, isso dá uma média de 642,8 mortos por ano. Considerando o contingente máximo de 160 mil homens (nem sempre foi assim), isso resulta em 401,7 mortos por grupo de 100 mil. Em São Paulo, o índice de homicídios é de pouco mais de 10 por 100 mil. Logo, a conta de Russomano é mentirosa, e pertencer ao Exército americano no Iraque é, então, 39,17 vezes mais perigoso do que morar na cidade em que mora o candidato do PP — refiro-me ao risco físico, não ao intelectual. Imaginem se a gente colocar na conta os mortos iraquianos… Se não entendeu, candidato, leia de novo. Se, ainda assim, não der, peça a alguém que explique.

Russomano é também aquele que afirmou que um suco de laranja pode custar R$ 15, R$ 20!!! Nem no adorável Fasano, onde quem pode pagaria isso com gosto, o preço deve andar por aí. Suco de laranja nessas alturas só mesmo com intermediação daquela quadrilha que operava na Casa Civil ao tempo em que Dilma era ministra e Erenice Guerra sua secretária-Geral. Isso é suco de laranja depois da “taxa de sucesso” dos “Menudos da Tia”.

Mercadante
Mas Russomano, que acaba de declarar apoio a Dilma Rousseff, encontrou um parceiro para a dobradinha. Quem? O petista Aloizio Mercadante, que se transformou no homem de uma nota só: aquele que quer acabar com o que ele chama “aprovação automática” nas escolas de São Paulo — que, na verdade, é progressão continuada. A proposta está contida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que é federal. Como lembrou Alckmin, os três estados que tiveram os melhores resultados no Ideb adotam o sistema; os piores, não. Isso não quer dizer que sua implementação não deva ser acompanhada de rigor.

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Por que Mercadante não chama as coisas pelo nome? O que ele quer? Repetência continuada? Eu, confesso, nem sou fã da tal progressão, não! Mas é mentira que seja aprovação automática. As medidas implementadas pelo governo do Estado têm surtido efeito, como demonstra o Ideb. O índice anda um horror nos estados administrados pelo PT, partido do senador: Piauí, Pará, Bahia e Sergipe não atingiram a meta estabelecida pelo governo federal; só o Acre conseguiu.

É evidente que esse não é o principal problema da educação em São Paulo ou no Brasil. Mas, em seu discurso furioso, Mercadante não tem muito tempo para delicadezas. Petista, quando na oposição, existe para fazer tabula rasa do trabalho alheio. Com a mesma desfaçatez com que se diz “o” responsável por qualquer convênio que o governo de São Paulo tenha feito com o governo federal, Mercadante vai desqualificando o trabalho alheio. São Paulo, ele garante, vai entrar no ritmo do Brasil. Mas então o estado vai encolher, já que cresce mais do que o país desde 2004.

O comportamento de Mercadante, que bravateava, cobrando que Alckmin lhe fizesse perguntas, foi ironizado até por Paulo Bufalo, o esquedista coradinho da mamãe, que lhe cobrou coerência no episódio dos atos secretos de Sarney, lembram-se? O senador exigia que o PT retirasse o apoio ao presidente do Senado e entregou o cargo de líder, dizendo ser uma “posição irrevogável” — que ele revogou em seguida. Em resposta a Bufalo, o senador petista exaltou as suas credenciais de grande “companheiro” e citou outros heróis do partido — Paulo Freire entre eles. Foi Paulo Freire quem introduziu a aprovação automática (e, ali, era aprovação automática mesmo!) na cidade de São Paulo quando secretário da então petista Luiza Erundina. Coerência de Mercadante? Ora…

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Bufalo boy
Bufalo tem um jeito de garoto educado ideologicamente por padres de esquerda. Fazendo referência a uma propaganda de TV de há alguns anos, é o comunista que não suja o shortinho, com suas faces coradas de garoto que comeu sucrilho na infância e caiu nas garras na Teologia da Libertação, que chamo “Escatologia da Libertação”. A exemplo de Plínio de Arruda, está contra todo mundo, entenderam? Fica mais vermelho quando fala: não é fúria, mas timidez. Busca ser ousado, mas a gente nota que está sempre com receio da professora…

Chega a ser simpático na sua parvoíce. Tem uma vantagem moral em relação a Skaf, Russomano e Mercadante: não tenta revestir as bobagens que diz de sapiência técnica nem violenta a verdade com falsas evidências. Sua abordagem é puramente ideológica. E, bem…, não há o menor risco, ainda que remoto, de que seja eleito…

E Geraldo Alckmin? Quem viu sabe: teve, sim, dadas as regras do debate, um excelente desempenho. Ele tem um diferencial importante em relação a seus adversários: conhece o Estado de São Paulo.

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Encerro
As pessoas sensatas precisam começar a lutar contra as leis estúpidas que impedem a televisão de fazer o que lhe cabe numa eleição: jornalismo. Em benefício dos eleitores, os debates têm de se dar entre candidatos viáveis. A quatro dias da disputa, um embate dessa natureza não tem de servir de vitrine para quem não teve competência ou votos para tornar viável a candidatura. É um serviço de utilidade pública e deve servir  para que os candidatos detalhem propostas e respondam a dúvidas pertinentes.

E é preciso também vencer a ditadura dos partidos e pôr o jornalismo na parada — e jornalismo com direito a réplica. Sem isso, jornalists também são intúteis . Debates não podem ser vitrines para a exercício de clamorosas mentiras e vigarices. Para tanto, já há os pronunciamentos oficiais em rede nacional, o horário político, o horário eleitoral e os palanques.

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