Ontem, Lula e o PT levaram o seu “Por qué no te callas?”
O jornalismo costuma raciocinar, quando o faz, com critérios principalmente econômicos e políticos. E é bom que assim seja. A objetividade é sempre boa conselheira. Mas é evidente que há de se contar com o concurso de outras disciplinas caso se queira entender o mundo na sua complexidade. Julgo, por exemplo, que o rei Juan […]
O jornalismo costuma raciocinar, quando o faz, com critérios principalmente econômicos e políticos. E é bom que assim seja. A objetividade é sempre boa conselheira. Mas é evidente que há de se contar com o concurso de outras disciplinas caso se queira entender o mundo na sua complexidade. Julgo, por exemplo, que o rei Juan Carlos possa ter sido tão importante na derrota de Chávez, na Venezuela, quanto a falta de óleo e leite nos supermercados do país. Explico-me.
Ao fazer a Chávez a pergunta que valeu por uma ordem — “Por qué no te callas” —, o rei evidenciou o “real” tamanho do porteiro de lupanar: desmitificou a figura aos olhos do povo venezuelano. Como o coronel, além de autoritário e bufão, também é um cretino, encarregou-se ele próprio de magnificar o evento em seu país, rosnando ressentimento em palanque. A questão óbvia: por que não deu a resposta na hora ao rei? Em vez disso, falou miudinho, balbuciou incongruências, engrolou, baixinho, desaforos inaudíveis. O mito se desfazia ali. O rei humanizou Chávez de modo um tanto patético e dramático. Falava à psicologia das massas…
Se as oposições souberem administrar a pós-vitória no caso da CPMF, Lula levou ontem do Senado o seu “por qué no te callas?”. Sim, com firmeza, com clareza, com determinação, vejam vocês, é possível vencer a máquina lulista e a indústria moral de imposturas que lhe serve de apoio. Poucos momentos foram tão constrangedores para o PT, ontem, como quando o senador Heráclito Fortes (DEM-PI) leu o discurso de Paulo Paim (PT-RS), em 1996, rejeitando a CPMF — obedecendo à orientação de Luiz Inácio Lula da Silva. Paim, ontem, evidentemente, era o mais furioso defensor da contribuição que antes rejeitara.
Já usei esta expressão dezenas de vezes e até lhes sugeri que a procurassem no Google: o PT pretende ser um partido sem passado, ancorado apenas no “presente eterno”. Se as oposições lhe cobrarem coerência, desmorona a fantasia, e o discurso da farsa se evidencia. A rigor, é o que deveria ter sido feito desde 2003, quando Lula resolveu migrar do anti-reformismo militante para o reformismo redentor; quando ressuscitou a pauta de reformas do governo FHC que ele havia ajudado a demonizar.
Jamais se esqueçam: uma das forças do petismo está nessa diluição da memória e na formidável capacidade de mentir sobre a própria história e sobre a história alheia: sem pejo, sem receios, sem limites. Lembro um caso escandaloso: na campanha eleitoral do ano passado, enquanto acusava o PSDB de ter a intenção de privatizar a Petrobras e o Banco do Brasil (infelizmente, jamais um partido proporá isso no país), usava o sucesso da privatização da Telebras — a que o partido se opôs — como se fosse obra de Lula.
O que o Senado fez ontem? Confrontou o PT com a sua própria história. E perguntou ao partido e a Lula: “Por qué no te callas?”