O Rio de Sérgio Cabral. Ou: Corra que a Polícia vem aí – 18
Atenção, bandidagem da Mangueira! No domingo, o Bope chega aí, já anunciou o governador do Rio, Sérgio Cabral. Será instalada no morro a 18ª UPP, esta solução que apela ao maravilhoso: não se prende ninguém, não se apreendem nem drogas nem armas, e tudo fica em paz. Boa parte da imprensa adora. Crianças sorridentes empinam […]
Atenção, bandidagem da Mangueira! No domingo, o Bope chega aí, já anunciou o governador do Rio, Sérgio Cabral. Será instalada no morro a 18ª UPP, esta solução que apela ao maravilhoso: não se prende ninguém, não se apreendem nem drogas nem armas, e tudo fica em paz. Boa parte da imprensa adora. Crianças sorridentes empinam pipa e jogam bola para ilustrar o entusiasmo de repórteres. Dezoito? Em julho de 2009, a cidade do Rio tinha 1.020 favelas. Esse número deve ter crescido.
Já respondi a alguns tontos que me acusam de ser contra a instalação de unidades policiais nos morros e a chamada “presença do estado” nas ditas “comunidades”. Contra? Eu? De jeito nenhum! Eu sou é a favor. Oponho-me é à mistificação e à produção de fantasias, artes em que Cabral é craque. Escrevi ontem que ele é um dos três inimputáveis da política brasileira. Os outros dois são Marina Silva e Lula.
Aqui uma nota à margem, ainda que em novo parágrafo. Qualquer outro governador que tivesse enfrentado a tal “crise dos bombeiros” teria sido massacrado pelo jornalismo vigilante. Em São Paulo, até morte de ciclista é tratada pela imprensa, especialmente na TV, como responsabilidade direta das autoridades. No Rio, se algo dá errado, o governador surge no noticiário como vítima de homens maus e de conspiradores — quando surge… Ele costuma desaparecer nas crises e só se mostrar na hora do abraço. Um especialista na arte do ilusionismo! E não! Eu não apóio invasão de quartel, especialmente por homens armados. Se invadiram, têm de desinvadir. Mas é preciso reconhecer que o governo do estado foi notavelmente incompetente na condução da crise. E daí? A bagunça acabou sendo vista como prova de autoridade do governador. Cinco meses depois da tragédia na região serrana, contam-me que o cenário ainda é o de terra devastada. Quem se importa? Volto às UPPs.
Informa O Globo:
“O anúncio da Secretaria de Segurança de que a Mangueira receberá uma Unidade de Polícia Pacificadora e uma série de operações feitas na favela para preparar o terreno para o Bope já provocaram uma grande debandada de criminosos, entre eles traficantes que haviam se refugiado lá após a ocupação dos complexos da Penha e do Alemão. A polícia tem informações de que já deixaram a Mangueira Alexander Mendes da Silva, o Polegar, chefe do tráfico no morro, e Fabiano Atanázio da Silva, o FB, responsável pela venda de drogas na Vila Cruzeiro. A recompensa para quem der informações que ajudem a polícia a prender Polegar é de R$ 2 mil. Quem tiver alguma pista deve ligar para o Disque-Denúncia (2253-1177).”
R$ 2 mil? O governo tem certeza de que quer mesmo pegar Polegar? Bem, vai acontecer na Mangueira o que aconteceu nas outras favelas: a bandidagem manjada, conhecida, se manda de lá, leva o armamento pesado embora, dá sumiço na droga e pronto! Não se verão mais traficantes desfilando armados na Rocinha, o que não quer dizer, como já admitiu o próprio José Mariano Beltrame, que o tráfico não continue. Ele só se torna mais decoroso. Considerando que a presença de uma UPP coíbe o risco de invasão da área por organizações rivais, incluindo as milícias, as tais unidades se tornam um elemento associado à segurança do narcotráfico, que passa a operar com menos riscos. Isso é tristemente óbvio. Aos poucos, vai se adaptando. Já há relatos de que o narcotráfico, agora com discrição, voltou a dar as cartas no Complexo do Alemão.
Cabral realiza muitos prodígios nos jornais e no horário nobre de TV, mas ainda não operou o milagre de convencer os Polegares e os FBs da vida a ter um emprego com carteira assinada. No modelo adotado pelo governador e por Beltrame, bandido não muda de profissão, é claro! Quanto muito, muda da endereço — e isso vale para os chefões; a soldadesca continua no lugar de sempre.
Mas os números fabulosos vão sendo produzidos. Segundo dados oficiais, que o Globo reproduz, com esta 18ª UPP, quase 400 mil pessoas de 64 favelas seriam beneficiadas. Achou pouco, leitor? O governo do estado também! Por isso, ousou mais: esses benefícios chegariam, direta ou indiretamente, a 1,1 milhão de cariocas. Como José Mariano Beltrame, secretário da Segurança, fez esse cálculo? Simples: considerou a população que mora num raio de dois quilômetros, que é a distância a que chega um tiro de fuzil. Salvo engano, trata-se de um critério realmente revolucionário na área de segurança.
Não me venham, por amor à lógica, com os tais números indicando que houve queda no número de homicídios depois das UPPs etc e tal. Ainda bem! Só faltava ter aumentado! A questão é saber se essa política é sustentável — e eu acho que não é. A menos que o Rio passe a “exportar” os bandidos que não prende.
O jornal traz uma informação importante:
“A 18ª UPP fechará o cinturão de segurança criado pela ocupação de quase todas as favelas do Maciço da Tijuca (Turano, Salgueiro, Formiga, Andaraí, Borel, Macacos e São João), uma área importante para a segurança do Maracanã, onde haverá competições da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016. Com a pacificação, será possível ir da Zona Sul ou do Centro para a região sem passar por favelas sob o domínio de traficantes.”
Ah, bom!