O blindado sorriso cínico do petismo
Por Leonencio Nossa, no Estadão On Line. Volto depois. A rápida aparição do ex-tesoureiro petista Delúbio Soares – um dos pivôs do escândalo do mensalão – na festa de abertura da fábrica da Caoa-Hyundai, em Goiás, foi suficiente para alterar o humor dos anfitriões e do principal convidado do evento, o presidente Luiz Inácio Lula […]
A rápida aparição do ex-tesoureiro petista Delúbio Soares – um dos pivôs do escândalo do mensalão – na festa de abertura da fábrica da Caoa-Hyundai, em Goiás, foi suficiente para alterar o humor dos anfitriões e do principal convidado do evento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.Na última quarta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) informou que abrirá o primeiro processo penal contra os envolvidos no mensalão. Delúbio é um dos réus da ação junto com o deputado federal José Genoino (PT-SP), o publicitário Marcos Valério.Ainda no STF, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, entrou com uma denúncia envolvendo 40 pessoas no esquema do mensalão, mas até agora – passado um ano – não havia processo nem réus no Supremo. Souza concluiu que o “chefe” do que classificou como “quadrilha” era o ex-ministro José Dirceu, além de Genoino, Delúbio e Silvio Pereira, outro dirigente petista.Área reservadaDelúbio Soares chegou ao pavilhão da festa com cabelos compridos, aparelho nos dentes e terno e gravata. Estava sorridente até o momento em que jornalistas o encontraram no local. Em poucos minutos, “amigos” dele recomendaram que deixasse a área, antes que sua presença tivesse mais impacto que a inauguração da linha de montagem de veículos.A princípio, Delúbio Soares foi levado pelos organizadores da festa para uma sala reservada, longe da imprensa. Depois, o ex-tesoureiro saiu por uma porta nos fundos.Os funcionários da empresa CDI, que presta serviço de assessoria à Hyunday, disseram que Delúbio Soares estava no local “porque era um dos convidados”. Fizeram de tudo para impedir imagens do convidado. Lula só chegou ao local mais de uma hora depois da saída de Delúbio.Mesmo com a retirada do ex-tesoureiro da festa, o clima foi de constrangimento para diretores da fábrica e para a comitiva que acompanhava o presidente.Lula fez um discurso no evento e depois evitou falar com a imprensa. Os assessores do Palácio do Planalto não tinham confirmado entrevista, mas tinham marcado um espaço e preparado uma estrutura para o presidente conversar com os jornalistas.Quem convidou?A assessoria de Lula informou que Delúbio Soares tinha sido convidado pelo presidente da fábrica, tirando qualquer responsabilidade do Planalto. O empresário Carlos Alberto de Oliveira Andrade, presidente da Caoa, disse que era “mentira” a notícia de que a empresa teria convidado o ex-tesoureiro.Ao ser informado que foi o Planalto quem divulgou essa versão, o empresário mudou o discurso: “Falou? Ah, se falou, é verdade”. “Não tenho absolutamente nada contra ninguém, não sou político e não tenho nada a ver com a política.”Andrade contou, em seguida, que convidou Delúbio para atender a um pedido de “goianos”. “A pressão para que acontecesse isso foi muito séria”, disse. O empresário negou de forma veemente que o ex-tesoureiro tenha atuado nas negociações para instalar a fábrica em Goiás, terra natal de Delúbio Soares.MensalãoO esquema do mensalão – pagamento de uma suposta mesada a parlamentares para votarem a favor de projetos do governo – foi denunciado por Roberto Jefferson, então deputado pelo PTB e presidente da legenda, que acabou sendo cassado por conta de seu envolvimento.Segundo ele, os pagamentos mensais chegavam a R$ 30 mil e o esquema de repasse do dinheiro era feito através de movimentações financeiras do empresário Marcos Valério.Dos acusados de envolvimento no esquema, foram cassados José Dirceu, Roberto Jefferson (PTB-RJ), que denunciou o mensalão, e Pedro Corrêa (PP-PE). Quatro parlamentares renunciaram para fugir do processo e 11 foram absolvidos.
Voltei
Pô, Leonencio, pega leve, colega! Por que assustar os leitores? Delúbio, de cabelos longos e aparelho nos dentes? Não sei como ele conseguiu depois escrever a reportagem. Kennedy Alencar tem alguma razão: a vida de repórter não é fácil. Não posso dizer que invejo esses bravos. Fiz a minha carreira como editor e colunista. Como se vê, há compensações.
Dizer o quê? Como sempre, os petistas não sabiam de nada, e Lula, evidentemente, ficou irritado com a presença do companheiro. Tão bravo, que é o caso de lembrar que Delúbio, até hoje, continua no PT, numa prova evidente de que sempre esteve, é óbvio, a serviço do partido e que fez o que fez sob a orientação de algum chefe. Quem o chefiava? Não a chefia formal, é claro. Refiro-me à chefia moral.
Mas vocês sabem. Só escrevo essas coisas porque sou paranóico, tomado por uma evidente doença psíquica. Também devo ser um tanto esquizofrênico. Fico aqui ouvindo vozes. Lá do cárcere, Gramsci fica gritando ao meu ouvido: “Isso não é maluquice, não, Reinaldão; isso é método”. Ou será Shakespeare?
É nessa hora que a operosa Polícia Federal de Márcio Thomaz Bastos e, agora de Tarso Genro (a quem já protegi aqui hoje de Ciro Gomes…) me vem à mente. Na minha paranóia mistificadora, observo que essa gente, até agora, nunca foi premiada com algemas. Lembram-se quando Lula foi se hospedar num estabelecimento militar no Guarujá (SP)? A segurança presidencial impediu um mateiro de trabalhar. Conseguiram achar o cara no meio do mato, mas não conseguem impedir a presença de Delúbio numa solenidade. Mesmo que ele venha de cabelo comprido e aparelho nos dentes.
O homem tem, com efeito, o blindado sorriso cínico do petismo.