Novo presidente da OAB se atrapalha com o “povo soberano”
Cezar Britto, 44, novo presidente da OAB, concede uma entrevista a Lilian Christofoletti, na Folha desta segunda. Fala sobre um monte de coisas, vocês verão. Mas é quando trata da democracia que Britto, infelizmente, dá um tropeção. Segundo diz, a onda populista da América Latina tem de se respeitada porque é a vontade do “povo […]
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FOLHA – Na Venezuela e na Bolívia, a Constituição tem sido alterada para aumentar os poderes dos presidentes. Como o sr. vê esse momento e que distinção faz com o Brasil?
BRITTO – O Brasil sempre teve uma postura correta de respeitar a determinação dos povos. Cada pessoa tem direito de escolher a face do seu país e a forma como ele será desenvolvido.
Na América Latina, embora se fale da volta do populismo, ele tem nascido com a vontade e a participação expressa do povo, e isso tem de ser respeitado. Esse fenômeno é decorrente da expressão popular, não de golpes militares nem da força, o que é bom para a América e para o mundo. É diferente quando a democracia é imposta, como ocorre no Iraque. Lá, a democracia é por imposição de um país sobre o outro. Então, há uma grande diferença entre as duas situações. A democracia não nasce por imposição, mas pela vontade do povo.
FOLHA – Não é perigoso para a democracia quando o presidente tem o poder de baixar decretos com força de lei, sem precisar passar pelo Legislativo, como na Venezuela?
BRITTO – É muito difícil opinar sobre a decisão soberana de um povo. E foi numa decisão soberana que o Congresso aprovou a medida. Não houve nenhuma imposição por meio da força ou de um golpe militar.Trata-se da expressão da vontade do povo, o que deve ser respeitado numa democracia.
FOLHA – Se o presidente Lula, eleito numa democracia, tentasse um terceiro mandato, o sr. seria favorável?
BRITTO – A OAB é contra qualquer tipo de reeleição, seja na esfera federal, estadual ou municipal. A reeleição não fez bem ao país desde a sua origem, quando houve denúncias de compra de votos. O que nasce viciado, continuará viciado no futuro. A nossa experiência com uma reeleição não é boa. Imagine com duas.
FOLHA – Nesta semana o presidente falou que o Brasil tem uma democracia consolidada. O sr. concorda?
BRITTO – Está parcialmente consolidada. É claro que avançou muito. As crises que ocorreram nos últimos anos não implicaram nenhum abalo institucional. Ao contrário, as instituições funcionaram corretamente, o Ministério Público trabalhou, a polícia trabalhou, os advogados trabalharam. Mas não está consolidada porque há ainda uma grande desigualdade. O Brasil ainda é o campeão de concentração de renda, com uma exclusão social e racial muito forte. Grande parte da população não goza de seus direitos, apesar de vivermos numa democracia.
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