Não aceito nem patrulha vermelha nem azul. Nem censura vermelha nem azul. Nem difamadores vermelhos nem azuis. Ou: Aprendam com Santo Agostinho, não comigo!
Há coisas que são chatinhas. E vou contar um troço que não é segredo para quase ninguém: não aborrecem só o blogueiro; os leitores também se entediam. Assim, é tédio mesmo, entendem?, não um sentimento ativo, que conduza à vontade de polemizar, de confrontar teses, ideias, valores. Um desses temas, com todo o respeito a […]

Há coisas que são chatinhas. E vou contar um troço que não é segredo para quase ninguém: não aborrecem só o blogueiro; os leitores também se entediam. Assim, é tédio mesmo, entendem?, não um sentimento ativo, que conduza à vontade de polemizar, de confrontar teses, ideias, valores. Um desses temas, com todo o respeito a homens e mulheres valorosos que lá estão, fundamentais para o que há de virtuoso na história recente do país, é o… PSDB. Basta que se escrevam dois ou três parágrafos sobre o partido, aparecem verdadeiras milícias armadas de acusações toscas na Internet: “Ah, está atuando em favor de não sei quem…”. “Ah, ele é paulista!” “Ah, ele não quer que Fulano seja candidato.” Sei lá se essas pessoas existem de fato ou são a versão azul dos petralhas — uma rede organizada para aplaudir ou para vaiar, nunca para pensar. É um papo chato, burro e que, no mais das vezes, ignora a história.
Vamos lá. Recentemente, publiquei dois posts sobre o PSDB: um, no sábado passado, tem este título: “Enquanto Dilma se recupera, o PSDB repete os velhos erros de sempre e continua imbatível na arte de vencer o… PSDB!”. Escrevi ali que a direção do partido evitava se posicionar sobre temas polêmicos, que não se apresentava para o confronto de ideias e para o embate político. Lá veio a artilharia! Na segunda, mais um: “Sérgio Guerra decide expulsar Serra do PSDB. Segundo entendo, ele acha que isso ajuda a eleger Aécio presidente, certo?”. De novo, a mesma gritaria. Chato. Chatíssimo. Entediante.
Antes que relembre aqui alguns detalhes a bem da história — e, talvez, para os prudentes, do próprio PSDB, mas isso é lá com eles —, observo um fato notável. O programa “Mais Médicos” mobiliza boa parcela dos brasileiros, as redes sociais, a categoria dos médicos — que é razoavelmente organizada —, estudiosos da área de saúde etc. A questão remete, parece-me, ao coração mesmo do jeito petista de governar. Em poucos setores é tão perceptível a distância entre o que o partido prega e o que o partido faz.
Não obstante, nessa precisa semana, parte dos tucanos estava freneticamente mobilizada para plantar informações contra Serra, que já foi deputado, senador, ministro, governador, prefeito e candidato à Presidência da República duas vezes. “Pronto! Olhem o que ele escreve!” Escrevo porque é verdade — e os jornalistas que cobrem política sabem que é assim. E qual foi o grande desaforo do tucano paulista? Bem, Aécio Neves, presidente do partido e presidenciável, acenou com a possibilidade das prévias — acatada pelo outro. Isso é assim tão especioso na vida político-partidária? A rajada de balas, no entanto, foi um troço espantoso. O PSDB não quer prévias? Diga que não! Essa é a decisão? Que se bata o martelo! Sim, eu gostaria que o PT fosse derrotado em 2014, não é segredo para ninguém. Se noto, no entanto, que as ações tucanas convergem para o sentido oposto, cumpre escrever — e, creio, eu o faria mesmo que torcesse por Dilma Rousseff.
Algumas premissas ou pilares nos quais se assenta a tentativa de ganhar um debate pela gritaria não suportam uma rápida pesquisa na Internet. Então o PSDB nunca falou antes de prévias? Ora, em janeiro de 2009, voltem aos arquivos, o partido fez uma consulta ao TSE sobre o procedimento. Em março, Aécio, então governador de Minas, começa a percorrer o país defendendo a tese. Em novembro, ele dá uma espécie de ultimato: ou o partido toma uma decisão, ou ele retira a sua pré-candidatura, o que fez em dezembro daquele ano. Perderia certamente o embate interno se houvesse a consulta, mas levou a sua postulação até o fim. Desta feita, mal se desligaram as urnas do segundo turno de 2010, o PSDB tentou bater o martelo e definir a candidatura.
“Ah, mas Serra ameaça agora sair…” É? O então governador de Minas não passou a flertar abertamente com o PMDB em fins de 2008 e com, ao menos, um notório inimigo político de Serra, o ex-ministro Ciro Gomes? Não se dizia, então, que Minas representava uma tal política “pós-Lula” e que esse negócio de “PT X PSDB” era coisa de paulistas? Será que preciso republicar aqui todos os links?
Fatos são fatos. Embora Serra tivesse a maioria do PSDB em 2010, é evidente que Aécio não foi submetido a um linchamento ou teve de passar pelo corredor polonês. Ora, voltemos à fala de Sérgio Guerra, que vem, de resto, ainda que de modo oblíquo, carregada de sentimento antipaulista: “Em todos os Estados do Brasil, não há um agrupamento que defenda a candidatura do Serra. A não ser para alguns amigos dele de São Paulo, que não são tantos.” Que grande serviço prestou este senhor ao PSDB para se referir a uma liderança do partido com esse linguajar?”. O que ele quer? Ganhar uma eleição sem São Paulo?
No dia 27 de agosto, Xico Graziano, um quadro tucano, escreveu a seguinte pérola no Twitter.
No dia 1º de novembro de 2010, o mesmo Graziano, que foi coordenador do programa de Serra em 2010, também recorreu ao Twitter, conforme informava o Estadão:
Segue o primeiro parágrafo do texto. É claro que se poderia perguntar a Xico Graziano a quem servia antes, a quem serve agora, essas coisas… Mas isso, repito, é lá com eles.
Noto que o então presidente do partido, Sérgio Guerra, saiu em defesa de Aécio e disse que Graziano não tinha autorização do partido para falar daquele modo. É o caso de perguntar ao atual presidente do PSDB, que é Aécio, se Guerra e Graziano, desta feita, têm “autorização do partido” para se referir a Serra nesses temos.
Aprendam com Santo Agostinho, não comigo!
Políticos, em regra, não leem Santo Agostinho. Ou melhor: políticos, em regra, se lessem, não leriam Santo Agostinho. É pena! “Prefiro os que me criticam porque me corrigem aos que me elogiam porque me corrompem.” Antes que o entendimento saia torto, é bom chamar a atenção para o fato de que se trata de um emprego bastante antigo, fora de uso, da conjunção “porque”, que introduz orações finais: “Prefiro os que me criticam com a finalidade, com o objetivo, com o fito de me corrigir aos que me elogiam com a finalidade, com o objetivo, com o fito de me corromper”. E o verbo “corromper”, no caso, não remete ao sentido corriqueiro da corrupção, da falcatrua. O elogio que corrompe é aquele que faz com a pessoa permaneça no erro.
Assim, também nesse sentido específico, a política é terreno propício à corrupção. Os políticos poderosos costumam ouvir poucas críticas e muitos elogios; não são nada suscetíveis à correção de rumos e, por isso, bastante tendentes à corrupção da vontade. Vaidosos, precisam daquilo que, no ambiente interno ao menos, deveriam prescindir: aplauso. A perspectiva de poder — ainda que, a meu juízo, no tucanato, esteja um tanto distante — desperta os maus instintos, ou os vícios, dos áulicos. Ainda que distante, note-se, da Presidência da República, o comando do próprio PSDB abre, digamos assim, espaços e posições de mando, o que açula as vaidades quando menos.
O PSDB não é o partido dos meus sonhos. Não sou tucano. Nunca fui. Há na legenda, desde sempre, certa vontade de ser um PT mais educadinho e tolerante. Já escrevi isso aqui dezenas de vezes. Não é a minha praia. Mas acho que a vitória do partido poderia ser importante para a democracia — desde, é claro, que passasse a operar com instrumentos distintos daqueles com os quais opera o PT. O linchamento de pessoas ou práticas e tentativas de manipulação da imprensa, por exemplo, são nefastos em si, sejam vermelhas ou azuis. Idem para a formação de brigadas na Internet
Naqueles dois textos e neste também, estou a dizer o óbvio: o PSDB deveria procurar agregar forças a seu projeto — tão logo tenha um —, mas prefere, segundo entendo, perder alguns aliados que já têm. “E Serra, o que ele vai fazer?” Não tenho a menor ideia. Sei bem o que eu faria. Como não sou político, posso pôr este critério à frente de qualquer outro: “Quem não me quer não me merece”.
Um o outro poderiam perguntar: “A quem serve Reinaldo Azevedo escrevendo essas coisas?”. Eu ousaria dizer que é àquilo que penso. Afinal, eu penso hoje sobre o governo petista o que pensava antes, no tempo em que alguns tucanos e alguns pavões tratavam os petistas com reverência servil e faziam alianças com eles. Se o PSDB acha que vai bem assim, boa viagem!
Mas não venham uns tantos me patrulhar, não! Não aceito nem patrulha vermelha nem azul. Nem censura vermelha nem azul. Nem difamadores vermelhos nem azuis.