Nada é tão intolerante quanto a intolerância dos monopolistas da tolerância
Tolerância é um assunto que gosto de discutir. Até porque conheço, como poucos, a intolerância. Nestes quase cinco anos de existência do blog — em junho —, nunca, MAS NUNCA MESMO, SEM EXCEÇÃO, defendi qualquer idéia ou proposta que não estivesse abrigada na Constituição da República Federativa do Brasil. Ocorre que alguns grupos de pressão […]
Tolerância é um assunto que gosto de discutir. Até porque conheço, como poucos, a intolerância. Nestes quase cinco anos de existência do blog — em junho —, nunca, MAS NUNCA MESMO, SEM EXCEÇÃO, defendi qualquer idéia ou proposta que não estivesse abrigada na Constituição da República Federativa do Brasil. Ocorre que alguns grupos de pressão fazem uma leitura seletiva da Carta: de alguns artigos, eles gostam; de outros, não. Ou, então, adotam aquela tese estranha de Joaquim Barbosa, segundo quem há princípios conflitantes no texto — entre, por exemplo, a “moralidade” e a “segurança jurídica”, tese que considero absurda.
Sou bastante ácido, sim, no debate. Mas também nunca ninguem me viu aqui a reclamar do que dizem a meu respeito — e olhem que há gente que opta pelo crime mesmo, com acusações as mais absurdas. No que diz respeito à liberdade de expressão, “tolerar” significa reconhecer que o outro tem o direito de dizer mesmo as coisas mais asquerosas, desde que não cometa crime ou não incite o cometimento de um crime. “Tolerar” significa reconhecer que há alguns valores muito caros para mim que nada dizem ao outro.
Isso nada tem a ver com ser “bonzinho”, ser “bocó”, deixar que se digam por aí as maiores barbaridades sem reação. No Brasil, se querem saber, falta é mais confronto, falta é mais choque — de argumentos! —, falta é mais radicalidade. E há um excesso de gente tentando calar aqueles de que discordam, organizando-se para recorrer a instâncias do estado para vencer o confronto no tapetão.
E nenhuma intolerância é tão intolerante quanto a dos monopolistas da tolerância! Vejam o caso da tal comissão que se reuniu no Congresso no ano passado para discutir o tal material didático sobre a homofobia (posts abaixo). Havia ali espaço para discordância? Aquele era um assunto que dizia respeito só aos gays? Alguém ali tinha o direito de contestar, sem ser esmagado, que se exibisse um filme em sala de aula de duas meninas se beijando? Há um consenso social mínimo a respeito desse assunto, ou vamos começar a trabalhar com a perspectiva do estado como vanguarda revolucionária dos costumes, quando — e qualquer estudioso da área sabe disso —, a sua natureza é justamente se sustentar nos consensos?
O chato de toda essa gritaria é que, se querem saber, ela passa muito longe da população. Os grupos que se querem “vanguardistas”, que hoje se assenhorearam do Estado, vivem numa espécie de divórcio com a população. O debate sobre o aborto na campanha eleitoral evidenciou isso. Levem aquele material para a sala de aula, e o resultado será contraproducente, isto é, contrário àquilo que se pretende. Sabem por quê? Escolheram o choque em vez da educação; escolheram a militância em vez da educação; escolheram o proselitismo em vez da educação. Escolheram qualquer coisa, MENOS A EDUCAÇÃO!
Os grupos militantes acreditam que a intolerância é monopólio dos seus adversários. Não é, não! Boa parte deles também é bastante intolerante com o que considera uma sociedade errada, atrasada, que ainda não partilha dos valores supostamente superiores que julga ter descoberto. Considerar que se tem o monopólio da verdade e da tolerância é uma manifestação escancarada de ignorância e intolerância.