Ministério Público não pode ser fonte de difamação de supostos desafetos
Em vez de bater boca com Mendes e de sair por aí fazendo plantações indevidas, sugiro que os valentes do MP se concentrem na investigação das tramoias reveladas pela Lava Jato
Já critiquei aqui o pendor do Ministério Público para fazer política. Sou uma pessoa esquisita. Elogio todas as qualidades do órgão e critico todos os seus defeitos. Infelizmente, alguns procuradores estão confundindo o cumprimento do dever com licença para fazer qualquer coisa. E nem estou me referindo à autoria do vazamento.
Todos os meus colegas jornalistas sabem que procuradores passaram esta terça-feira exercendo a profissão de hortelões: estavam plantando na imprensa e em grupos que lutam pelo fim da corrupção a avaliação de que Gilmar Mendes havia se tornado um inimigo da Operação Lava Jato, agora que o PT já caiu. Os mais ousados chegam mesmo a indagar, por palavras oblíquas, quem o Supremo pensa que é para ousar enfrentar o Ministério Público. As coisas saíram do eixo. E precisam voltar a ele para que os corruptos possam ser punidos. Para que patuscadas como o fim da delação de Léo Pinheiro não se repitam.
Ora, então Mendes seria agora inimigo da operação? Será, então, por isso que ele critica com tamanha dureza o rompimento de negociações com o ex-chefão da OAS? E quem é amigo da investigação? Janot, que pretende costurar a boca do empreiteiro?
Infelizmente, correntes do MP, imbuídas de espírito salvacionista, que é sempre contraproducente — obtém o contrário do que pretende —, tornaram-se máquinas poderosas de atacar reputações. Uma discordância mínima, lateral que seja, já faz daquele que dissente uma pessoa suspeita. Isso é detestável. Os mesmos hortelões tentaram atribuir ao advogado de Pinheiro, José Luís de Oliveira Lima (conhecido por “Juca”), o tal vazamento. A única coisa que não conseguiriam explicar é por que isso seria bom para o seu cliente.
Janot deveria é procurar pôr ordem na casa em vez de vir a público com palavras ambíguas e anfíbias, inclusive sobre o trabalho da imprensa. Há obviamente no ar o cheirinho de que tenta proteger seus bravos rapazes — que jamais hesitaram, no entanto, em lhe aplicar um “bypass” quando julgaram necessário.
Todos os aplausos ao bom trabalho do Ministério Público Federal. Mas não endosso e nunca endossei — há mais de 10 anos de arquivo à disposição — seu pendor para fazer política. Quando o ministro Gilmar Mendes critica, e com muita dureza, uma proposta que fala até na admissão de provas ilícitas, “desde que colhidas de boa-fé”, faz, sim, o que se espera de um magistrado. Só faltava agora um ministro do Supremo condescender com tal estupidez. “Ah, que fale nos autos!” A defesa da lei e da Constituição pode e deve ser feita por integrante da corte suprema do país também fora dos autos porque nem uma nem outra são mera questão de gosto ou de juízo de valor.
Eu mesmo tomei pancadas aos montes porque ousei, ora vejam!, discordar de uma coisa ou de outra ao longo da operação. Não ligo porque tenho casca dura. Dez anos tomando porrada de petralhas me deram a devida carapaça. Mas acreditem: os espadachins da reputação alheia de um lado e de outro não agem de maneira muito distinta, não. Janot e a Corregedoria do Ministério Público precisam mandar seus rapazes de volta ao quartel. Ninguém está aqui a defender lei da mordaça ou qualquer coisa do gênero.
Em benefício da ordem pública — aquela mesma cuja transgressão rende prisão preventiva —, convém que todos se comportem dentro da lei e segundo as suas atribuições. Procuradores têm de saber que a democracia é coisa importante e grande demais para que sua operação seja monopólio do Ministério Público.
Em vez de bater boca com Mendes e de sair por aí fazendo plantações indevidas, sugiro que os valentes se concentrem na investigação das tramoias reveladas pela Lava Jato.
Procurador não tem de ficar em palanque. E também não, missionário, paladino ou legislador.
Ou, como se vê, quem sai ganhando são os bandidos. Ou não é o que vai acontecer se Léo Pinheiro foi silenciado por Janot?