Mal acaba “Salve Jorge”, traficantes voltam a demonstrar quem manda no Alemão; desisti de ir morar naquele paraíso; sinto-me traído pelo primeiro caso de merchandising de política de segurança da história da TV
Não acompanhei o fim da novela “Salve Jorge” — nem o começo nem o meio — e não sei se, no fim daquela cadeia de inverossimilhanças, segundo li aqui e ali, o capitão Teo (Theo?) decidiu morar no Alemão com a brejeira Morena. Leio na VEJA.com (texto segue abaixo) que os traficantes voltaram a demonstrar […]
Não acompanhei o fim da novela “Salve Jorge” — nem o começo nem o meio — e não sei se, no fim daquela cadeia de inverossimilhanças, segundo li aqui e ali, o capitão Teo (Theo?) decidiu morar no Alemão com a brejeira Morena. Leio na VEJA.com (texto segue abaixo) que os traficantes voltaram a demonstrar quem dá as ordens no Complexo do Alemão. Leiam a reportagem. Volto em seguida.
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Moradores do Complexo do Alemão voltaram a assistir, na manhã desta quinta-feira, a uma demonstração de poder dos traficantes de drogas. Ocupado pela polícia desde dezembro de 2010, o conjunto de favelas amanheceu com comércio e escolas fechados em várias áreas. A ordem para fechar portas teria partido de traficantes, em represália à morte de um bandido. O problema atinge também parte da Vila Cruzeiro, favela próxima ao Alemão.
Comandante do programa de Unidades de Polícia Pacificadora, o coronel Paulo Henrique afirmou, na manhã desta quinta-feira, que o fechamento do comércio é um “descontentamento” dos traficantes com a ação da polícia. Para os moradores, no entanto, a leitura é de que os bandidos continuam dando as cartas, apesar da presença de policiais e da construção de unidades da PM naquela área.
Além de lojas e escolas, os bandidos conseguiram interromper também o funcionamento de um posto de cadastramento do programa Bolsa Família, que funciona a poucos metros de uma das estações do teleférico do Alemão – ponto que passou a receber visitantes e a integrar o conjunto de novos cartões postais do Rio, após a chegada das UPPs.
Confronto
O episódio que motivou a reação dos traficantes foi a morte de um homem de 29 anos, identificado como Anderson Simplício de Mendonça, conhecido como “Orelha”. De acordo com a 22ª DP (Penha), o caso ocorreu na noite de quarta-feira e foi registrado como “homicídio decorrente de intervenção policial”. Segundo a Polícia Civil, Anderson tinha dois mandados de prisão pendente pelos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico.
O suspeito foi encontrado, segundo a polícia, com um revólver calibre 38 e oito munições calibre 38. “No local, os PMs arrecadaram dois carregadores para fuzil calibre 762 e vinte munições para o mesmo calibre. Familiares de Anderson e testemunhas estão sendo intimadas para prestar depoimento. Agentes da 22ª DP estão realizando diligência para identificar os outros traficantes”, diz uma nota enviada pela Polícia Civil.
Comento
“O caso é grave, Reinaldo, não cabe ironia!” Eu sei. Não ironizo a situação dos moradores, coitados!, que ficam à mercê da bandidagem, mas a versão edulcorada — e, no limite, falsa, como toda construção meramente ideológica — do que passou a ser chamado de “pacificação” das favelas do Rio.
Minha crítica ao governo Sérgio Cabral, nesse caso, nunca esteve ligada à presença de unidades da Polícia na favela, é evidente, mas ao fato de que há uma ação deliberada — ou inação — para NÃO PRENDER traficantes. A menos que Cabral e José Mariano Beltrame provem que as UPPs levam os traficantes a fazer o download do divino, a minha suposição é a de que continuam no mundo do crime — e até com mais segurança. Levar melhorias às favelas — e é uma obrigação — sem quebrar a espinha do poder do tráfico corresponde a pôr mais recursos públicos à disposição de quem manda, de fato, nas “comunidades” (no Rio, não existem mais “favelas”): o tráfico. É questão de fato. É questão de lógica elementar.
Descriminação das drogas
“Ah, e se o consumo de drogas não fosse crime? Nada disso aconteceria!” É… Se a gente descriminar os crimes, não tenho dúvida, tudo vira “da lei”, não é mesmo? E, aí, quem pode mais chora menos. Se incendiar pessoas numa pira de pneus deixar de ser crime, os que comandam o churrasco poderão circular livremente, como cidadãos honrados. A questão é saber o bem ou o mal que estarão fazendo à sociedade.
Noto que, para o caso em espécie, não bastaria descriminar o consumo, mas também o tráfico de drogas, o que não se fez em país nenhum do mundo, nem na Holanda. E quem dá as ordens nos morros não é o consumidor de drogas, mas o traficante.
Não vou mais morar no Alemão. Senti-me enganado pelo primeiro caso de novela que faz merchandising de uma política de segurança pública.