Greenhalgh 2 – Saiba detalhes do Caso Lubeca
No dia 31 de janeiro de 2005, a Folha publicou uma excelente memória do Caso Lubeca, escrita por Lilian Christofoletti. Uma das personagens do imbróglio — atuando no lado da lei — é o hoje respeitado advogado criminalista Eduardo Carnelós, então um jovem idealista de 26 anos, ainda embalado pela crença de que o PT […]
Acompanhem:
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Trechos inéditos de uma conversa gravada há 15 anos recolocam (…) Luiz Eduardo Greenhalgh no centro de um escândalo que envolveu a Prefeitura de São Paulo, a empresa Lubeca e o suposto pagamento de US$ 200 mil em propina.
O episódio aconteceu em 1989. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estava em campanha para a Presidência da República. Luiza Erundina (então no PT, hoje no PSB) era a prefeita e estava no primeiro ano de sua gestão. Greenhalgh era vice-prefeito e secretário dos Negócios Extraordinários.
No diálogo de uma hora e 20 minutos, Greenhalgh é citado como o responsável por ter “plantado” um intermediário na Lubeca para arrecadar dinheiro para a campanha de Lula. A empresa buscava a aprovação da prefeitura para um projeto urbanístico avaliado em US$ 600 milhões.
O advogado José Firmo Ferraz Filho, apontado já naquela época como intermediário de Greenhalgh, é um dos personagens da conversa. O diálogo foi gravado pelo outro interlocutor, o advogado Eduardo Pizarro Carnelós, sem conhecimento de Ferraz Filho. Carnelós era o assessor jurídico de Greenhalgh na prefeitura.
A certa altura, Ferraz Filho diz: “Teve aquele problema da grana e avaliou-se. Não pega a grana. Vamos pegar? Podemos pegar. Tem armação, não vamos pegar”. E segue: “O partido pediu grana. É ato de preposto [representante legal], cara! E mais, o cara é vice-prefeito. Se ele pedir, os caras dão”. Adiante, Ferraz Filho afirma: “O Luiz estava por trás do projeto? Estava. Já tinha um homem do gabinete dele no projeto.”
O estopim
O diálogo, muito tenso, foi gravado no dia 28 de outubro de 1989. Doze dias antes, num debate transmitido ao vivo pela TV, o então candidato à Presidência da República Ronaldo Caiado (ex-PSD), hoje deputado federal pelo PFL, havia acusado a Prefeitura de São Paulo de ter recebido propina de uma empresa da cidade. Não citou a Lubeca, mas sua declaração desencadeou uma série de investigações que levaram a Ferraz Filho e à empresa.
O caso Lubeca foi investigado em três frentes: na comissão de averiguação da prefeitura criada por Erundina, na CEI (Comissão Especial de Inquérito) da Câmara Municipal e num inquérito da Polícia Civil. Todas as três investigações foram arquivadas sob alegação de falta de provas conclusivas. A fita com a conversa gravada, no entanto, não foi incluída como peça em nenhuma delas.
Um ano depois do escândalo, em dezembro de 1990, o “Jornal da Tarde” publicou uma reportagem reproduzindo trechos do diálogo. A maior parte da conversa, porém, permaneceu inédita.
Esses trechos contêm revelações que, além de incorporar nominalmente novos personagens ao escândalo, entre eles o atual diretor-presidente do Sebrae, Paulo Okamoto, funcionam como peças inéditas de um quebra-cabeça até hoje não resolvido.
Num trecho inédito da gravação, Ferraz Filho diz: “Eu fui plantado na Lubeca. Fui plantado”. “Por quem?”, indaga Carnelós. “O Luiz [Eduardo Greenhalgh]. O Luiz. Pronto. Cara, você vai segurar?”, pergunta Ferraz Filho.
Dias antes dessa conversa, em depoimento à Câmara, Ferraz Filho havia se negado a responder quem tinha indicado seu nome para supostamente trabalhar na Lubeca, com a qual afirmava ter “contrato verbal”. Esquivou-se 13 vezes da pergunta.
Diálogo
A gravação foi feita por Carnelós após consultar os advogados José Carlos Dias e Arnaldo Malheiros Filho. Ambos disseram que a fita poderia ser usada como prova caso a acusação de corrupção resvalasse em seu nome.
Na época, Carnelós era o responsável na prefeitura pela análise do projeto da Lubeca e disse que Ferraz Filho o procurou em sua sala para lhe contar que havia conseguido US$ 100 mil da empresa para a campanha do PT.
Carnelós e Ferraz Filho conversaram num escritório. O gravador estava escondido em uma valise.
Na fita, Ferraz Filho procura convencer Carnelós a não tornar a história pública. Ele fala diversas vezes sobre a doação: “Meu amor, a história é a seguinte: é a filosofia do lobo. Os caras dando isso…, eles estão o quê? Pagando o seguro tipo máfia. Não tem sacanagem. Isso é a filosofia deles”.
Ferraz Filho diz ainda na fita que os depoimentos prestados à comissão da prefeitura, presidida pelo então secretário de Governo José Eduardo Cardozo (PT), hoje deputado federal, foram “pautados” por Greenhalgh, inclusive a fala do gerente-geral da Lubeca, José Maria Simões.
O erro, segundo ele, deu-se quando, ao final do depoimento, Greenhalgh, que acompanhava a sessão, interveio e solicitou que fosse acrescentado um dado: a atuação de Ferraz Filho como advogado da Lubeca. Isso quando a própria empresa não reconhecia qualquer vínculo com ele.
“O Zé Firmo não podia aparecer…”, diz Ferraz Filho, referindo-se a si próprio. “O Luiz [Eduardo Greenhalgh] fez uma cagada? Fez. E atribuo isso exclusivamente a ato falho. Não perdôo o Luiz. Inabilidade, incompetência, seja lá que nome for. Agora, não é por causa disso que a gente tem de atirar merda no ventilador.”
Representantes das duas comissões, a da prefeitura e a da Câmara Municipal, informaram que a fita com a conversa não foi incluída porque surgiu quando os trabalhos já haviam sido encerrados.
A fita também não fez parte do inquérito da Polícia Civil, aberto para apurar eventual cobrança de propina na gestão petista. A apuração foi interrompida após o caso ser remetido à Polícia Federal por ordem da Justiça Eleitoral.
O inquérito, que havia sido aberto para apurar suposta corrupção, foi convertido em denúncia eleitoral contra Caiado por crime de calúnia. Foi nesse momento que as fitas entraram na ação, com o objetivo de reforçar a denúncia. O procedimento foi para o Supremo, onde foi arquivado.