EXPANSÃO E BARBÁRIE
Leiam primeiro um post abaixo. Uma estudante da Uniban, campus de São Bernardo, foi quase linchada, ou currada, porque usava um “vestido curto” — ia da escola para uma festa. Foi xingada, humilhada, filmada, exibida na Internet. Segundo seu testemunho, funcionários da universidade, até professores, a responsabilizaram pelo ocorrido. A síntese é esta: “Quem mandou […]
Leiam primeiro um post abaixo. Uma estudante da Uniban, campus de São Bernardo, foi quase linchada, ou currada, porque usava um “vestido curto” — ia da escola para uma festa. Foi xingada, humilhada, filmada, exibida na Internet. Segundo seu testemunho, funcionários da universidade, até professores, a responsabilizaram pelo ocorrido. A síntese é esta: “Quem mandou usar vestido curto? Quem usa vestido curto está mesmo provocando”. Foi preciso a ação da polícia para que ela pudesse deixar o prédio. Vândalos chutavam a porta e pediam que a “gostosa” fosse entregue à massa.
A nova lei que pune o estupro não distingue a efetivação do ato da tentativa. Acho a lei toda atrapalhada — digo outra hora por quê —, mas ela existe. Se existe, quero saber se a universidade está empenhada em identificar os agressores para que possam ser processados. E seria até curioso, não? Porque, tudo indica, mulheres também participaram da barbárie. Não! Eu não quero saber quão curto era o vestido da moça. Ainda que estivesse nua!!! Ela que arcasse com a responsabilidade de transgredir os códigos daquele ambiente — que, suponho, mesmo abrigando linchadores, deve proibir a nudez, não é mesmo?
Demagogos das mais variadas colorações, incluindo aqueles que estão no jornalismo e suas submodalidades, saúdam a chamada “expansão” do ensino universitário no país. É evidente que não estou aqui estabelecendo uma relação de causa e efeito, a saber: não fosse a dita expansão, isso não teria ocorrido. Não! Isso acontece nos ambientes em que a ética não tem grande relevância; em que os membros do grupo não se submetem a um código de conduta; em que vigora a anomia e o salve-se quem puder.
Então, agora sim: o que vai acima define boa parte das ditas universidades brasileiras, em sua desordenada expansão, freqüentemente com o leite de pata do dinheiro público. Se eu escrevesse aqui que aquilo a que se assistiu na Uniban é “inaceitável” numa universidade, muitos poderiam indagar: “Mas seria aceitável em qualquer outro ambiente?” A resposta, obviamente, é “não”. Aquilo é inaceitável numa sociedade civilizada.
Mas, numa universidade, choca ainda mais. Esperamos de estudantes de terceiro grau que sejam especialmente tolerantes com a diferença. Afinal, aquele deveria ser um lugar especialmente dedicado ao estudo e à reflexão. Mas quê… A universidade brasileira, a bordo de algumas teses vigaristas — à esquerda e à direita, é bom deixar claro —, está se transformando numa espécie de supletivão para a conquista de um diploma. Não é só o conteúdo específico que é freqüentemente sofrível. Falta também apuro ético e moral. Isso é mais visível hoje em franjas do ensino privado de terceiro grau. O ensino público segue pelo mesmo caminho. É questão de tempo.
Não! Não estou satanizando o ensino privado — até porque sou contra universidade pública, qualquer uma. Estou lastimando, isto sim, é a baixa qualidade que marca essa expansão. Não se enganem: ocorrências como essa não são fortuitas; não estamos diante de uma explosão irracional de violência. Estamos diante, infelizmente, de um ambiente de baixo padrão ético; em que um candidato a estuprador insuflando outro candidato a estuprador não chega a caracterizar um comportamento chocante, fora do aceitável. Isso atinge todos os estudantes da Uniban? É claro que não! Mas a ocorrência se deu ali, com estudantes que estavam ali.
A Uniban tem de exibir as fichas dos candidatos a estupradores e tem de expulsá-los da universidade. Ou, então, estará dizendo à opinião pública que seus bancos comportam esse tipo de gente. Nesse caso, em vez de regulada pelo MEC, deve ser supervisionada pela Secretaria de Segurança Pública; em vez de diplomas de conclusão de curso, terá de oferecer folha corrida. Que a escola entregue primeiro os bandidos. O resto se vê depois.