É assim que Gilberto Carvalho gosta que se dê uma notícia… Ou: Alguém vai investigar cartel em obras federais?
O ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência) e segundo homem mais importante no PT elogiou a cobertura que o Estadão vem fazendo do “cartel de trens” em São Paulo. E ainda deu pito no resto da imprensa. Quer o jornal como um modelo a ser seguido. Atende a seus critérios rigorosos do que seja bom […]
O ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência) e segundo homem mais importante no PT elogiou a cobertura que o Estadão vem fazendo do “cartel de trens” em São Paulo. E ainda deu pito no resto da imprensa. Quer o jornal como um modelo a ser seguido. Atende a seus critérios rigorosos do que seja bom jornalismo. Entendo.
Acabo de ler no Estadão Online a seguinte notícia. Segue em vermelho. Prestem bastante atenção. Volto depois:
O PSDB pedirá ao Ministério Público Federal investigação sobre suspeitas de formação de cartel no consórcio entre as empresas Alstom e CAF para fornecimento de trens para os metrôs de Belo Horizonte e Porto Alegre. Na capital gaúcha, o consórcio FrotaPoA venceu o leilão pelo valor de R$ 243,8 milhões. Em Minas, o FrotaBH, também formado por essas empresas, ganhou a licitação por R$ 171,9 milhões.
As licitações das quais participaram o FrotaPoA e o FrotaBH foram feitas por empresas mistas, ligadas ao Ministério das Cidades. A concorrência para o metrô de Belo Horizonte foi aberta pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), do governo federal. Já na capital gaúcha, a licitação ficou a cargo da Trensurb, também ligada ao governo federal. A Alstom e a CAF são investigadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público pois foram citadas no acordo de leniência feito pela Siemens com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em maio. Todas elas também são acusadas de formação de cartel no setor de trens e metrô paulista.
Voltei
E é tudo. Pergunto:
1: você entendeu alguma coisa até aqui, leitor amigo?;
2: por que, afinal, o PSDB cobra a investigação?;
3: notem que se fala em cartel com empresas federais, mas o texto termina com uma referência ao metrô… paulista.
Ficou curioso?
Ficou curioso, leitor? Quer saber por que o PSDB está pedindo a investigação? Já contei aqui, mas conto de novo. Abro com uma imagem:
Então… Um mesmo consórcio, formado pela Alstom e pela CAF, venceu a licitação para a fornecimento de trens para o metrô de Belo Horizonte, comandado pela estatal federal CBTU, e para o metrô de Porto Alegre, comandado por outra estatal federal, a Trensurb. No da capital gaúcha, a Alstom ficou com 93% do contrato, e a CAF, com 7%. No da capital mineira, foi o contrário. Em ambos os casos, o consórcio formado pelas duas empresas não teve concorrentes: foi o único a se apresentar.
Outra curiosidade: apenas 13 dias separam o comunicado da comissão de licitação de Belo Horizonte do anúncio da assinatura de contrato em Porto Alegre, conforme se pode ver abaixo.
Imagem lá do alto
E a imagem lá do alto? É a presidente Dilma assinando pessoalmente a ordem de serviço para a compra dos trens de Porto Alegre, a tal licitação de um consórcio só.
O Cade, como se supõe, não vê nada de estranho.
Em maio, a CPTM, empresa de trens urbanos do Estado de São Paulo, cancelou uma licitação porque compareceu apenas um consórcio para fornecer trens. Já a estatal federal Trensurb, que responde pelo metrô de Porto Alegre, não teve esse problema. E vejam que coisa bonita! A estatal federal — cuja chefe, então, em último caso, é mesmo a presidente Dilma Rousseff — ainda se orgulha do feito. Tanto é assim que, em sua página na Internet, exalta o feito, como revela a imagem abaixo.
Também a Alstom, em seu site, comemora o feito.
A CBTU também glorifica a si mesma.
Encerro
Nããão! É claro que não estou aqui a acusar irregularidades. Não sei de nada. O que sei é que, em São Paulo, ao se apresentar um único consórcio para a compra de trens, a licitação foi cancelada. As duas estatais federais, a Trensurb e a CBTU, não veem mal nenhum nisso. Celebram contratos, respectivamente, de R$ 243,75 milhões e R$ 171,9 milhões com o mesmo consórcio, que não teve de concorrer com ninguém. Como existe uma espécie de fraternidade universal entre essas empresas, no primeiro, uma fica com 90%, e a outra, com 10%; no segundo, invertem-se as porcentagens.
Mas por favor, leitores! Façam como o Cade de José Eduardo Cardozo, o garboso da Justiça: não suspeitem jamais de que isso possa ser cartel. Como se vê, o governo de São Paulo precisa aprender com o governo federal, do PT, como é que se estimulam a concorrência e o preço mais baixo…