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Reinaldo Azevedo

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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura

Drogas – O Brasil não é o “Posto 9” de Ipanema, senhores do “É Preciso Mudar”! Ou: Campanha tem de deixar claro o que pretende e parar de enganar os telespectadores

É claro que não deixei pra lá a campanha “É Preciso Mudar”, que defende, de modo oblíquo, a descriminação das drogas. Está sendo veiculada pela TV Globo, como parte do marketing social, e não informa direito aos telespectadores o que pretende. Estão na origem da iniciativa a ONG Viva Rio, do buliçoso sociólogo Rubem César […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 08h17 - Publicado em 26 jul 2012, 18h22

É claro que não deixei pra lá a campanha “É Preciso Mudar”, que defende, de modo oblíquo, a descriminação das drogas. Está sendo veiculada pela TV Globo, como parte do marketing social, e não informa direito aos telespectadores o que pretende. Estão na origem da iniciativa a ONG Viva Rio, do buliçoso sociólogo Rubem César Fernandes, e a Comissão Brasileira Sobre Droga e Democracia. A ser como pretendem, a democracia (ver membros do grupo no pé do texto) ainda acaba uma droga. E é preciso ir além do trocadilho fácil. Essa gente está confundindo o Brasil com o Posto 9, em Ipanema, onde uma gente bonita, sarada, rica, educada e descolada convive alegremente com a maconha — famílias e suas crianças também. Adivinhem se o futuro adulto vai querer respeitar depois o sinal de trânsito ou a lei seca ao volante…

Como disse Fernando Pessoa sobre Rousseau, o idiota, “suíço, castelão e vagabundo”, mordomos invisíveis administram a casa enquanto se vive a ilusão do idílio suave entre a beleza natural e o desrespeito à lei. “Suave” mais ou menos: em 2009, policiais — gente do povo mais escuro, vocês sabem… —  resolveram abordar um jovem que fumava a sua maconhinha. Ele se abespinhou (descolados detestam a ideia de que alguém diga que eles não podem fazer tudo o que querem), houve um entrevero e tal. Dada a voz de prisão, a “comunidade” linda e educada saltou nos cascos e deu um cacete nos PMs. Os libertários quase lincham as “forças da ordem e da repressão”. Em casa, os mordomos invisíveis, que moram nas “comunidades” governadas pelo narcotráfico, se encarregam de manter limpas as calcinhas, as cuecas, as toalhas, o banheiro… Uma delicioso idílio de classes.

Acontece que o Brasil não é o Posto 9, não, senhores! Os que respondem por essa campanha estão propondo também uma revolução na segurança pública, acho eu, ou, por outra, a generalização das drogas nas escolas, por exemplo. “Lá vem o Reinaldo, o reacionário, acenar com o fantasma das criancinhas!” Fantasma? A Lei Antidrogas que temos hoje já é permissiva. A turma do “É Preciso Mudar” reclama que ela é ambígua e acaba deixando para as autoridades a definição do que é droga para consumo e para tráfico. Logo, uma lei que descriminasse o consumo teria de estabelecer a quantidade que distingue uma coisa de outra.

Aquela comissão aloprada de juristas que propôs mudanças no Código Penal — a proposta está no Senado — definiu: quantidade para cinco dias de consumo é uso pessoal. Logo qualquer pessoa que porte esse tanto (e, vejam que loucura, seria preciso definir o quantum de um dia para estabelecer o de cinco!) não poderia ser incomodada pela lei. O narcotráfico faria o óbvio: multiplicaria os seus “vapores”, as pessoas encarregadas da distribuição da droga no varejo. Quem fará a vigilância nas imediações das escolas e mesmo dentro delas? A Rede Globo? O Rubem César Fernandes? O Pedro Abramovay, que é o, por assim dizer, “intelectual” por trás dessa campanha?

As escolas brasileiras, com raras exceções, já são um lixo hoje, quando, apesar da disseminação — e ela é real — da droga, ainda pesa sobre consumidores e traficantes certo constrangimento social. Não no Posto 9, sei disso, onde a moda é ser rico, belo, malhado, descolado e, bem, tolerante com aquela moçada bonita que queima um fuminho… Ah, sim: os “caretas” do Posto 9 não se ofendam. Vocês sabem muito bem sobre o que estou falando. É daquele cheirinho que fica no ar. Fui lá uma vez exibir a minha brancura extraterrena e procurei não respirar fundo. Vai que eu gostasse, né? É o caso de temer as tentações do demônio com aquela natureza, aquele mar, aquela topografia, aquela gente moderna…

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São milhões de crianças e jovens que ficam longe da vigilância dos pais, que estão no trabalho. Esses bacanas já procuraram conversar com suas respectivas “colaboradoras” pobres — as que cuidam das cuecas, das calcinhas, da geladeira — para saber quais são as suas expectativas e apreensões? Não se enganem! HOJE, UMA MINORIA DOS POBRES ESTÁ ENVOLVIDA COM ALGUMA FASE DO TRÁFICO DE DROGAS. Eu me arriscaria a dizer, puro chute, que o número de endinheirados que consome é proporcionalmente maior do que o de pobres que vendem — mesmo havendo muito mais pobres no Brasil do que ricos.

É evidente que, na hora em que as interdições forem suspensas, estará se abrindo um mercado. Até porque tanto a turma do “É Preciso Mudar” como os juristas aloprados defendem que o tráfico continue a ser crime. A tal comissão sobre drogas tem ao menos dois banqueiros: Edmar Bacha e Pedro Moreira Salles. Se eles quiserem escrever um ensaio sobre a mágica de incentivar a demanda e estrangular a oferta, provocando resultados virtuosos, eu publicarei com prazer. Até porque os dois hão de convir que estaremos ou diante de uma revolução da economia e da lógica ou diante da apologia da inflação, não é mesmo? Huuummm… A inflação sempre interessa à bandidagem…

Estamos diante de uma questão de lógica elementar: a descriminação necessariamente aumentará a exposição das pessoas — especialmente dos jovens — às drogas, o que acarretará uma elevação do consumo, certo como dois e dois são quatro. Nessas horas, sempre se evocam as experiências de Portugal — que tem uma área menor do que a de Pernambuco e população inferior à da cidade de São Paulo — ou da Holanda, com área inferior à do Rio Grande do Norte e menos gente do que a soma de São Paulo e Rio. Servem de parâmetro para um estado de dimensões continentais, com as marcas do atraso e da desigualdade que tanto nos infelicitam ainda? No dia em que a droga — para consumo! — puder circular livremente em mais de 8 milhões de quilômetros quadrados, com as fronteiras secas que temos, o que facilita enormemente a entrada de cocaína, por exemplo, o que acontecerá com o país? O óbvio! Vai se transformar no principal entreposto do tráfico internacional de drogas.

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Nada disso! Um país que respeitasse suas leis — se a de drogas não é respeitada, por que as outras? — daria é um jeito de acabar com a vergonha de haver locais em que, na prática, o consumo de substâncias ilícitas é não apenas tolerado como incentivado, transformando-se num jeito de corpo, sabem?, numa cultura alternativa, num suposto exercício do direito individual. “Ah, mas eu tenho o direito de consumir sei lá o quê…” Meu amigo, você tem o direito de se matar como bem entender. Com lembrou Camus, o suicídio é a questão filosófica mais relevante do homem. Mas não tem o direito de arrastar a sociedade para o caos, não!

Chegou a hora de as pessoas que discordam dessa patuscada se manifestarem, ora! E reitero: a campanha que está no ar está enganando o telespectador. Deixem claro que se trata de uma proposta para descriminar o consumo de drogas. As pessoas têm o direito de saber. Um direito democrático, que está sendo violado.
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Membros da Comissão Brasileira Sobre Droga e Democracia:

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Paulo Gadelha – Presidente da Fiocruz; Rubem César Fernandes – Diretor executivo do Viva Rio; Carlos Costa – Liderança Comunitária; Carlos Velloso – ex-ministro do Supremo Tribunal Federal; Celina Carpi – Presidente do Movimento “Rio Como Vamos”; Celso Fernandes – Presidente da Visão Mundial Brasil; Dráuzio Varela – Médico e escritor; Edmar Bacha – Economista e Ex-Presidente do BNDES; Einardo Bingemer – Coordenador do Projeto Latino-Americano de Pesquisa sobre Comunidades Terapêuticas (LATC Research); Ellen Gracie – Ministra do Supremo Tribunal Federal; Joaquim Falcão – Diretor da Escola de Direito da FGV; João Roberto Marinho – Vice-presidente das Organizações GLOBO; Jorge Hilário Gouvêa Vieira – Advogado; Jorge da Silva – Coronel da Polícia Militar do Rio de Janeiro; José Murilo de Carvalho – Doutor em ciência política, professor titular do IFCS/UFRJ e membro da Academia Brasileira de Letras; Lilia Cabral – atriz; Luiz Alberto Gomes de Souza – Sociólogo, liderança leiga da Igreja Católica; Maria Clara Bingemer – Decana da Faculdade de Teologia da PUC-Rio; Marcos Vinicios Rodrigues Vilaça – Ensaísta e poeta, membro da Academia Brasileira de Letras; Paulo Teixeira – Deputado Federal; Pedro Moreira Sales – Presidente do Conselho Itaú Unibanco; Regina Maria Filomena Lidonis De Luca Miki – Coordenadora do CONSEG e ex-Secretária de Defesa Social da Prefeitura de Diadema; Regina Novaes – Antropóloga, ex-presidente do Conselho Nacional de Juventude; Roberto Lent – Neurocientista, doutor em ciências e professor titular da UFRJ; Rosiska Darcy de Oliveira – Escritora e co-presidente do movimento “Rio Como Vamos”; Zuenir Ventura – Jornalista.

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