Contra a patrulha 2 – Arnaldo Antunes e o “Freak le bum bum”
Ai, que preguiça! Já disse aqui que sou leitor de alguns colunistas da Folha, não? Nelson Ascher está entre eles. Na semana passada, dei destaque para um artigo seu sobre a paranóia do aquecimento global, essa nova religião de nossa era. Quando, como é o caso, o debate envereda para a irracionalidade, a conversa fica […]
Já disse aqui que sou leitor de alguns colunistas da Folha, não? Nelson Ascher está entre eles. Na semana passada, dei destaque para um artigo seu sobre a paranóia do aquecimento global, essa nova religião de nossa era. Quando, como é o caso, o debate envereda para a irracionalidade, a conversa fica difícil. Ai do coitado que disser, por exemplo, que não é certo que seja o “çerumano” o responsável pelo aquecimento do planeta. Ah, não! “Eles”, vocês sabem quem, logo acham que têm muito mais razões para amar a humanidade e o planeta do que você.
Também costumo ser, digamos, “mal compreendido” (e, como sabem, estou cantando e andando para isso…) em relação a esse assunto. Dizem que nego o aquecimento global. Não nego; dou destaque à dúvida, real, de que seja provocado pelo homem. Qualquer um que se dedique a uma leitura minimamente criteriosa sobre o assunto, fora da literatura militante, vai se dar conta do quão impreciso é o modelo teórico que resultou nas visões apocalípticas, catastrofistas.
A exemplo de Ascher, não sou especialista em “aquecimento global” — já disse: prefiro investigar advérbios, preposições, termos de apoio… Sempre que escrevo a respeito, trato do caso como um tema de cultura, de linguagem até. Foi o que Ascher fez num artigo publicado, na semana passada, na Folha. Eu o reproduzi aqui no blog (leia íntegra, no post das 18h34 daquele dia).
Pois é, pois é… Não é que, hoje, dou de cara, na Folha, com um texto assinado pelo roqueiro Arnaldo Antunes (ou agora ele é um “tribalista” da MPB?) contestando Nelson Ascher, encimado pelo pomposo termo “Réplica”? Ah, a banalização do sentido das palavras, não é? Deixe-me ver. Esse rapaz é o mesmo que subscreveu um abaixo-assinado pedindo à Folha a cabeça de Ascher quando o articulista questionou as bobagens do “falso-palestino-falso-pacifista-para-normalistas” Edward Said? Ih, é ele mesmo. Um avanço: desta feita, ao menos, o tradutor de Carlinhos Brown não está pedindo censura, não é?
Não sei por quê, a Folha gosta de apelar a artistas para debater idéias, mesmo quando lhes faltam… idéias. Um certo Zeca Baleiro (???) também decidiu me contestar, certa feita, no jornal. E eu não tenho nada a dizer a cantores, roqueiros, essas celebridades. O artigo do ex-titã está aqui. Como texto, eu lhe dou nota seis. Obedece aos padrões de correção da língua, mas o estilo é pobrinho. Quando dava aula de redação, alertava os alunos para o risco do “estilo cebola”, que é aquela argumentação que se vai apresentando em camadas. Compreendo: Antunes é um “poeta concreto”, né? Pensa por imagens, entendem? Rompeu com a velha tradição de fazer um parágrafo levar a outro…
Se o estilo é fraco, a argumentação é sofrível e padece do mal essencial de qualquer candidato a polemista: atribuir ao adversários intenções subalternas, que ele, Antunes, não tem, é claro. Ao contrário: o roqueiro gosta da humanidade; Ascher, supõe-se, a detesta; o cantor quer preservar a natureza; Ascher, supõe-se, quer devastá-la; o poeta é contra a guerra; Ascher, supõe-se, gosta de bombas; o amigo da Marisa Monte é contra as “contaminações tóxicas” — louvo em saber que ele passou a ser contra “contaminações tóxicas”… Parabéns! —; Ascher, supõe-se, é a favor delas; o parceiro de Carlinhos Brown é de um antiamericanismo feroz; Ascher, supõe-se, é só um lacaio do imperialismo. Huuummm, com mais alguns centímetros de texto, quem sabe não seria o caso de acusar o articulista da Folha de membro do complô judaico…
Ah, como é bom ser amigo do çerumano, não é mesmo?, imaginando que os inimigos, vejam que coisa!, são justamente seus adversários. Arnaldo Antunes parou de subscrever abaixo-assinados defendendo livros que ele não leu e pregando a censura? Huuummm, melhor assim. Mas continua tolinho. Nessas horas, tenho certa tentação de saber por que essa gente se acha com mais direitos de ser porta-voz da humanidade do que eu ou do que Ascher, por exemplo. Talvez eu tenha a resposta: é que a gente não passa o ridículo de querer ser porta-voz da humanidade…
Um “tribalista” como Antunes não pode mesmo entender um “universalista” como Ascher. A pior herança do concretismo, acreditem, são seus acólitos midiáticos: medíocres, reduziram a poesia a uma conspiração de trocadilhos e a joguinhos de palavras, mas se têm na conta de grandes pensadores. Dos mestres, herdaram só a arrogância, mas não o talento; a pretensão, mas não o pensamento. Se lhes dão, como é o caso, um espaço generoso no jornal, nao conseguem ir além da redação ginasiana.
Para as próximas polêmicas, chamem Gretchen e Rita Cadilac. Ou me provem que Arnaldo Antunes já produziu algum poema melhor do que Freak le bum bum.