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Reinaldo Azevedo

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Considerações de um leigo em direito, mas não em lógica

Algumas coisas se perdem no debate, e eu faço questão de que não se percam. Conhecem a pergunta “Cui prodest?”. Literalmente, quer dizer “a quem aproveita”? Ou em linguagem mais simples: “A quem interessa?” Já escrevi sobre o assunto. É uma das indagações que se deve fazer diante de um crime. É claro que a […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 16h59 - Publicado em 28 ago 2009, 17h41

Algumas coisas se perdem no debate, e eu faço questão de que não se percam.

Conhecem a pergunta “Cui prodest?”. Literalmente, quer dizer “a quem aproveita”? Ou em linguagem mais simples: “A quem interessa?” Já escrevi sobre o assunto. É uma das indagações que se deve fazer diante de um crime. É claro que a resposta pode fornecer pistas importantes.

Mas também é a fonte de erros judiciais graves. O fato de algo interessar a alguém não torna esse alguém necessariamente suspeito. Estivesse Palocci a alguns quilômetros — físicos, causais e morais — da quebra do sigilo de Francenildo, e seria um absurdo atribuir-lhe responsabilidade no caso. Mas ele estava? Ora, tenham paciência!

O ministro Eros Grau, torcendo e revirando o verbo do avesso, chegou a dizer que não havia nem mesmo relação de subordinação entre Jorge Mattoso, então presidente da CEF, e Palocci, então ministro da Fazenda. Ridiculamente, afirmou que a subordinação se dava entre a Caixa e o Ministério da Fazenda — entre instituições, portanto. Se Grau quiser, desenho para ele: O “Ministério” não podia demitir a CEF, mas Palocci podia demitir Mattoso. Isso prova quem ou o quê era subordinado a quem ou a quê. Simples assim: 1+1 = 2.

O fato de o crime — chamo de crime porque, por unanimidade, o STF disse que era crime — interessar a Palocci não o torna responsável, claro. Mas, para isso, forçoso seria:
1 – que, antes da invasão do sigilo, ele não tivesse ido colher informações com uma jornalista sobre o caseiro Francenildo; justamente informações sobre dinheiro que teria no banco;
2 – que ele não tivesse anunciado que, em breve, sairia uma notícia reveladora sobre o caso;
3 – que não houvesse uma relação chefe-subordinado entre ele e quem autorizou a invasão da conta de Francenildo;
4 – que Palocci não tivesse recebido o extrato em horário incomum;
5 – que cópia desse mesmo extrato não tivesse ido parar numa revista;
6 – que não tivesse havido contatos evidentes entre o assessor de Palocci e a publicação no momento mesmo em que o extrato era vazado.

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Cezar Peluso
E agora chamo no tento o ministro Cezar Peluso. Depois de fazer a mais dura e a mais severa crítica à quebra do sigilo, ridicularizando a tese da(s) defesa(s) de que nada de errado havia acontecido, disse que estava disposto a acatar, sim, a denúncia, que via indícios suficientes para isso não fosse o fato de que descobrira que outra pessoa, não apenas Palocci, tinha uma cópia do tal extrato.

Ironizei, então, dizendo que o ministro endurecera sem perder a ternura. Como queria votar contra as próprias considerações, meteu a vírgula, recorreu à conjunção adversativa (no caso, o “mas”) e votou contra o que ele mesmo apontava como indício suficiente.

Ah, esperem aí. Depois de todas as suas considerações, ministro Peluzo; depois do que vai acima, aí, sim, era o caso de Vossa Excelência indagar: “Cui prodest?” Não há nada de intrinsecamente errado com essa pergunta. Ela só não pode ser feita fora de hora ou sem investigação. Quer dizer que o ministro enxergou toda a cadeia de causalidades, viu o crime horrível sendo cometido, tinha, vá lá, dois suspeitos com o indício fatal nas mãos, mas não conseguiu distinguir o “interessado” do “não-interessado”? É assim que estamos fazendo justiça no Brasil?

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Peguemos os suspeitos reunidos naquela sala, naquele dia em que chegou o extrato. Vejam que maravilha: a maioria dos ministros do Supremo livrou a  cara do principal interessado no crime e condescendeu com a abertura de processo contra aquele que não tinha interesse nenhum na ilegalidade.

Os ministros rejeitaram a tese do “A quem interessa?” Preferiram a do “a quem não interessa”.

Não pode ser justa a Justiça que pune o subordinado por ter cometido um crime que beneficiava o chefe, com a anuência deste. A retórica pode muita coisa. Mas não transforma a coisa errada em coisa certa.

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