Bento 16 e Karl Marx
“Karl Marx descreveu de maneira drástica a alienação do homem. Mesmo que não tenha atingido a verdadeira profundidade da alienação – porque raciocinava apenas em âmbito material — forneceu uma imagem clara do homem vitimado por bandidos.” É um trecho do livro Jesus de Nazaré, do papa Bento 16, que será lançado no dia 13. […]
Ele fez um comentário num capítulo em que aborda a Parábola do Bom Samaritano — que eu sugiro que vocês leiam. Na história narrada por Cristo com o objetivo de encarecer a caridade, um homem é feito vítima de “bandidos”, severamente espancado e largado ao relento. Tanto um religioso como alguém de sua própria comunidade passam por ele e nada fazem. Até que um estranho, o Bom Samaritano, o socorre. História simples para exemplificar “o amor ao outro como a si mesmo”.
A lembrança de Marx se explica porque ele é o grande pensador — goste-se ou não — da revolta contra o que se considera injustiça social. Mas Bento 16 deixa claro: ele não atingiu a verdadeira profundidade da alienação. E, pois, o papa não endossou Marx coisa nenhuma. Nem o elogiou. Vamos com calma. Uma coisa é citar um autor num contexto pertinente; outra é assinar embaixo. Eu leio Marx ainda hoje com muito prazer. Não fazê-lo, como se fosse um satã, é só obscurantismo. Ou agora Bento 16 deveria pôr fogo nos livros marxistas? Deixem o terrorismo para “eles”. Ler não é acatar.
Em seguida, o papa fala da África, de como o continente seria vítima da exploração dos países ricos etc e tal. Bem, há, sim, um certo viés anticapitalista e antiliberal na Igreja, meus caros. Conformem-se com isso. O que não quer dizer que o teólogo Josef Ratzinger flerte com o comunismo. Isso é besteira. E suas ações dão testemunho de sua convicção. A Santa Sé acaba de fazer uma advertência (ainda não é punição), justíssima, a Jon Sobrino, um jesuíta espanhol especialista em Cristologia. Expoente da Teologia da Libertação, é dado a tratar a figura de Cristo como sotaque revolucionário, menosprezando a sua dimensão divina. É ridículo supor qualquer flerte de Bento 16 com o marxismo.
Tenham uma coisa em mente: a crítica da Igreja Cátólica (a séria, não a Escatologia da Libertação) ao capitalismo sempre será feita pelo viés da censura ao hedonismo e às injustiças sociais — que existem mesmo. Ou não? A Igreja nem sempre acerta nos diagnósticos, acho eu. Mas não se atribua ao papa, de novo, o que ele não disse.