Beltrame finalmente reconhece que bandidos migraram do Rio para Niterói. Neste blog, ninguém está surpreso faz tempo! Ou: Os bandidos do Rio nascem bons; os de SP é que os corrompem
Se eu fosse instado a escolher uma palavra ou expressão que defina nossos dias, eu não hesitaria: “A era da perda do sentido das palavras”. Não significam mais nada. O aparelhamento político das redes sociais, que contaminou de maneira deletéria o próprio jornalismo, joga-nos em verdadeiros buracos de significação. Foi o que pensei quando li no […]
Se eu fosse instado a escolher uma palavra ou expressão que defina nossos dias, eu não hesitaria: “A era da perda do sentido das palavras”. Não significam mais nada. O aparelhamento político das redes sociais, que contaminou de maneira deletéria o próprio jornalismo, joga-nos em verdadeiros buracos de significação. Foi o que pensei quando li no Globo uma reportagem sobre a explosão de violência em Niterói. Leiam trechos do que informa Taís Mendes. Volto em seguida.
Durante uma inauguração no pacificado Morro da Providência, no Centro, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, admitiu, pela primeira vez, que vem ocorrendo uma migração de bandidos do Rio para Niterói, cujos habitantes vivem um momento de intranquilidade devido ao crescimento da violência urbana. Duzentos e cinquenta homens das polícias Civil e Militar participam de duas operações em Niterói e em São Gonçalo.
“Não existe uma informação técnica de que haja efetivamente migração. Claro que ela há, mas não é um dado mensurável, se é um, se são cem ou se são mil. Tivemos 472 prisões em Niterói e 32 do Rio. A migração pode até haver, mas é relativa. O que temos que fazer é atuar aqui, em Niterói e na Serra. Entendo que as coisas possam não estar muito bem, mas estão muito melhor do que estavam”, afirmou o secretário. Segundo Beltrame, ainda se referindo a Niterói, enquanto as UPPs não chegam são tomadas atitudes temporárias. “Está planejado. O que não podemos fazer é um movimento pirotécnico. Existe um plano e ele será cumprido”, acrescentou.
Outra comunidade pacificada, o Morro da Mangueira teve na quarta-feira o policiamento reforçado. Isso porque o comércio local fechou as portas – o que ocorre pela primeira vez numa área com UPP- em sinal de luto pela morte do traficante Wagner da Silva Assunção, conhecido como Sargento. Ele é apontado como gerente do tráfico nos morros da Mangueira e do Tuiuti (outra região pacificada), onde o comércio também está com as portas fechadas.
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Seis pessoas detidas na Mangueira e Cidade de Deus
Na Cidade de Deus, outra beneficiada com UPP, comerciantes também fecharam as portas em sinal de luto e medo de represálias. Segundo o site G1, três pessoas foram detidas nessa comunidade de Jacarepaguá e levadas para a 32ª DP (Tanque). Outras três também foram detidas no Morro da Mangueira. Nas duas comunidades, o tráfico era comandado pela mesma facção criminosa.
De acordo com informações da polícia, os três detidos na Cidade de Deus são jovens (um deles menor) e estavam incitando os moradores e comerciantes à desordem. Eles teriam sido denunciados por moradores da própria comunidade. Já na Mangueira, as três pessoas foram detidas por desacato. A polícia informou, ontem à tarde, que o comércio começou a reabrir as portas no início da noite. No entanto, até à noite de ontem, os comerciantes da Cidade de Deus permaneciam com seus estabelecimentos fechados – mesmo aqueles instalados nas proximidades de uma cabine da PM.
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O comandante da UPP da Mangueira explicou que remanejou o policiamento na comunidade para as ruas Visconde de Niterói, São Luiz Gonzaga e Capitão Felix, regiões onde há maior atividade comercial. Há informações de que a ordem para que o comércio fechasse as portas tenha partido de um morador do morro. “A gente tem que ficar atento porque isso é ameaça e quem comete esse crime tem que ser preso”, afirmou o comandante.
Comento
Beltrame admite tardiamente o óbvio, ainda que de maneira um tanto matreira. Faz de conta que é só uma possibilidade inerente à lógica do processo, não uma realidade empírica, experimentável, constatável. Mas anuncia: a política de segurança pública continua…
Ele anuncia, ainda que demore um tempo, que chegará a vez de Niterói ter as UPPs, nos mesmos moldes, obviamente, das do Rio. Digamos que um dia haja UPPs em todas as “comunidades” (como agora é moda dizer) do estado. Dada a política espalha-bandido, eles migrariam para os estados vizinhos.
Há uma ironia involuntária no texto do Globo — e não estou sendo sarcástico com a repórter, não, que fez o seu trabalho. É que assim estão as coisas. A que me refiro? Releiam estes trechos:
“Outra comunidade pacificada, o Morro da Mangueira teve na quarta-feira o policiamento reforçado. Isso porque o comércio local fechou as portas – o que ocorre pela primeira vez numa área com UPP (…)”
“Na Cidade de Deus, outra beneficiada com UPP, comerciantes também fecharam as portas em sinal de luto e medo de represálias.”
O que a palavra “pacificada” passou a significar no fim das contas? Somente isto: a bandidagem não anda mais brandindo as suas armas para as câmeras de TV. Que “pacificação” é essa em que comerciantes têm de obedecer ordens de bandidos?
Mas tudo está no seu lugar, segundo Beltrame, e a política de segurança pública continua. Até, imagino, o limite em que o Rio passasse a ser, efetivamente, exportador de bandido para outros estados — consequência óbvia das escolhas de Beltrame e Sergio Cabral caso realizassem seu intento.
Tolices antipaulistas
Ontem, a área de segurança do Rio anunciou, com certo estardalhaço, que, como consequência da mui bem-sucedida política aplicada no estado, a bandidagem passou a negociar a compra de drogas e armas com “uma facção de São Paulo”, o PCC.
Ah, bom! Eu sabia que havia malvados bandidos paulistas corrompendo os bons selvagens do Rio. Como a gente sabe, a organização do crime como partido político — ou organização terrorista — começou em Piratininga, não é mesmo? “Ora, Reinaldo, você nega essa conexão?” Eu não! Creio que essas organizações criminosas estão sempre negociando entre si. O problema é a forma como isso é anunciando. Fica-se com a impressão de que, como o governo de São Paulo não combate seus marginais, eles acabam contaminando o estado vizinho, cujo governo é tão zeloso na área de segurança.
Qual é??? São Paulo tem 22% da população brasileira e reúne mais de 40% dos presos do país. É claro que episódios violentos acontecem no estado, mas também é fato que ele etá em 25º lugar no ranking de homicídios por 100 mil habitantes — a capital está em último. A sugestão de que os problemas enfrentados pelo Rio têm origem além das fronteiras é malandra.
Não estou aqui fazendo concurso de bandidagem, não! Mas me parece estranho que, na área de segurança, mais apanhe quem mais dá combate aos bandidos.