As “véias” abertas da América Latina
Hugo Chávez, o ditador da Venezuela, deu de presente a Barack Obama um exemplar de As Veias Abertas da América Latina, do uruguaio Eduardo Galeano. Trata-se de um dos piores livros jamais escritos no mundo ocidental. Consta que as vendas dispararam. Li ontem em algum lugar que já era o segundo livro mais encomendado na […]
Implico com esse livro desde criança — vale dizer, desde a minha infância ideológica. Como diria o Apóstolo Paulo, quando eu era menino, pensava como menino, sentia como menino. Para quem entende as Escrituras, ele está dizendo que, antes de se converter, seu pensamento vivia, como direi?, uma espécie de fase da idiotia… Esquerdismo é uma manifestação infantil do pensamento assentada na idéia de culpa: alguém, ou “alguéns”, num dado momento da história (ou de modo permanente), teria desviado o homem do seu destino. E sua história teria passado, então, a girar em falso, em oposição à “verdade”. É uma estupidez que parte do princípio de que haveria um outro roteiro, mais certo e mais justo, previamente escrito.
Pois bem: mesmo quando eu era menino, esquerdista, esse livro de Galeano, que era leitura obrigatória para todo perfeito idiota latino-americano, não me convencia. E a razão era (e é) simples: trata-se de uma coleção de lamúrias evidenciando como a América Latina foi vítima de sucessivos vilões, desde os espanhóis e portugueses (estes merecem menos atenção) até o imperialismo americano. Uma suposta vontade legítima do povo latino-americano (que estrovenga será essa?) teria sido continuamente fraudada.
Acho até que foi Galeano o primeiro a plantar em mim a semente da desconfiança — pelo que eu lhe deveria ser grato. “Ora diabos” — pensava nos meus 15, 16 anos, ainda menino, ainda esquerdista e ainda idiota — “mas por que a gente (os latino-americanos…) é assim tão banana, então? O que é que fez com que os opressores se tornassem opressores, e os oprimido, oprimidos? E por que a gente é sempre o oprimido?”
Vim a entender um pouco mais tarde, já na transição para a vida adulta, que esse vitimismo era uma fraude intelectual, que abria as portas para todo tipo de vigarista e demagogo. Olhem quem exibe o livro agora… Fazia pilhéria com o troço: chamava-o “As véias abertas da América Latina”.
Que esse livro tenha sido ressuscitado — e pelas mãos de Hugo Chávez, num presente a Obama —, eis uma prova da miséria intelectual que toma conta do nosso tempo e que não vai passar assim tão rapidamente. Sem contar que Galeano, que nem é historiador, tem ambições literárias, e isso o faz abusar de todas as metáforas e antíteses vagabundas de quem viaja nas “veias” da luta do “opressor” de manual contra o “oprimido” de manual. E o homem escreve pra chuchu. É uma espécie de Paulo Coelho da autocomiseração. Seus heróis da resistência costumam dizer frases de efeito para humilhar a prepotência do colonizador mesmo à beira da morte. Trata-se de uma daquelas fantasias que enchem de alegria e de espírito de vingança os impotentes.
Não duvido: Chávez deve sentir-se uma espécie de novo Túpac Amaru… Torço para que a escritura se cumpra até o fim.