As vans no Rio, um e-mail de Eduardo Paes, o jornalismo e o poder
Recebo um e-mail do prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), comentando um post que escrevi aqui com críticas à proibição da circulação de vans na Zona Sul do Rio. À diferença do petista Fernando Supercoxinha Gugu-Haddad (post anterior), ele, ao menos, diz que está “sempre” me lendo. Paes aproveita para me dar uma bronca. Em dezembro, […]
Recebo um e-mail do prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), comentando um post que escrevi aqui com críticas à proibição da circulação de vans na Zona Sul do Rio. À diferença do petista Fernando Supercoxinha Gugu-Haddad (post anterior), ele, ao menos, diz que está “sempre” me lendo.
Paes aproveita para me dar uma bronca. Em dezembro, VEJA Online publicou um texto informando que a Prefeitura proibiria a circulação de vans na Zona Sul e no Centro. Assim, observa o prefeito, a medida de agora nada tem a ver com o caso do estupro. Reproduzo a sua mensagem. Volto em seguida.
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Querido Reinaldo,
Estou sempre lendo você. Como fico triste em ver um jornalista tão atento cometendo erros, trago matéria do site da nossa querida Veja em dezembro do ano passado anunciando a proibição de Vans na Zona Sul a partir de… ABRIL!
Ou seja, nada que ver com estupro. Simplesmente parte de um processo de transição do caótico modelo de transportes em nossa cidade maravilhosa. Ajustes têm que ser feitos, mas não têm improviso, não!
Me desculpe o comentário, mas é dramático como os jornalistas não prestam atenção a notícias veiculadas em seus próprios meios.
Meu abraço,
Voltei
Começo pelo vocativo, vou para o último parágrafo e depois para o miolo. Quando Paes era deputado tucano, chegamos a ter alguma proximidade. Se não era amizade propriamente, talvez tenha sido quase. No tempo a que me refiro, nunca percebi nada que o desabonasse pessoal ou politicamente. Sempre me pareceu uma pessoa dedicada a seu ofício e sinceramente preocupada com a sua cidade, com o seu estado, com o seu país. Dessa relação amistosa, nunca brotou condescendência de nenhuma natureza. Nem minha nem dele. Concordamos e discordamos quando era o caso de se fazerem uma coisa e outra. Eduardo, permito-me chamá-lo pelo prenome, sabe o que penso e sei o que ele pensava. Evitei ser judicioso a respeito de suas escolhas políticas posteriores porque não gosto de misturar os canais. Ele sabe disso. Ademais, mesmo discordando de muita coisa, acho que a cidade está melhor sob o seu comando — e nunca escrevi o contrário.
Agora para o último parágrafo. Ele tem razão. Não tinha lido o texto da VEJA.com a que ele alude. Se posso lhe fazer uma sugestão, fica esta: acuse o que considera a minha falha, mas não generalize para todos “os jornalistas”. Acho que, no geral, eles leem o que se publica em seus respectivos veículos. A minha crítica é outra: parcela considerável não lê nada além do que neles se publica — teoria política, por exemplo. Acho que faz falta. Ainda que o jornalismo, em regra, não seja o melhor sítio para um debate dessa natureza, quando se domina certo instrumental, o mundo fica mais claro.
É uma pena, com efeito, eu não ter lido antes a reportagem da VEJA.com porque teria, então, feito crítica parecida no seu devido tempo. Teria alertado que quatro meses seriam insuficientes para a reestruturação que o setor pedia. E os fatos demonstram que são. E teria indagado, do mesmo modo, por que a proibição se restringe à Zona Sul. E teria, também, apontado a condescendência da imprensa com as questões que dizem respeito ao Rio, cidade e estado. Não por desamor a ambos. Ao contrário. E que se note: esse aspecto da crítica não diz respeito a Paes, mas ao jornalismo. O prefeito parece, ainda assim, um tanto descontente com a categoria. Não deveria. Não conhece o que é ser governo com um jornalismo hostil — nem mesmo crítico, que é coisa diferente.
Eu não sou contra — e esta não é posição recente — à circulação de vans nesta ou naquelas áreas da cidade, como evidenciou meu post. Eu me oponho, isto sim, e a essa modalidade de transporte, que tem de acabar — no Rio, em São Paulo, em qualquer lugar. Essa é uma, apenas uma!, das heranças malditas do petismo. Foi em São Paulo que os petistas ousaram transformar o que chamei de “praga” em alternativa de transporte público.
Espero que Eduardo seja bem-sucedido num programa, então, para erradicar essa doença — da Zona Sul e também das áreas onde a tardinha não cai junto com o barquinho que vai. Se e quando a topografia exigir um veículo mais leve, que esteja sob o controle do poder público, não do crime organizado, como costuma acontecer — no Rio, em São Paulo, em qualquer lugar. Tem o meu apoio nisso. É irrelevante, eu sei, mas não digo que gosto ou desgosto de algo pensando no efeito que isso possa causar.
Despeço-me de Eduardo especulando que ele talvez conheça jornalistas que fazem questão de ignorar o que pensam ou deixam de pensar os políticos quando estes marcham na contramão da metafísica influente, como ele já marchou, mas se tornam seus amigões do peito e interlocutores privilegiados quando se tornam poder. É evidente que não me obrigo a fazer o contrário. Ao ser fiel ao que penso, independentemente da metafísica influente, posso passar, às vezes, essa impressão…
Um abraço, prefeito.