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Reinaldo Azevedo

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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura

As tontices antiamericanas, a ditadura, a democracia etc e tal

Aqui e ali, ouvem-se muxoxos acusando o governo americano de posar de grandes defensores da liberdade e, ao mesmo tempo, apoiar as tais ditaduras árabes. Huuummm… Vai ver essa gente acha que a “expedição democrática” ao Iraque é pouco e deveria se estender às demais nações — como se aquela guerra tivesse mesmo o objetivo […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 5 jun 2024, 18h41 - Publicado em 2 fev 2011, 05h59

Aqui e ali, ouvem-se muxoxos acusando o governo americano de posar de grandes defensores da liberdade e, ao mesmo tempo, apoiar as tais ditaduras árabes. Huuummm… Vai ver essa gente acha que a “expedição democrática” ao Iraque é pouco e deveria se estender às demais nações — como se aquela guerra tivesse mesmo o objetivo de espalhar democracia.

Pode-se ser contra a invasão ou a favor dela, achar que foi necessária ou que foi um desastre, mas a democracia nunca teve nada a ver com isso. George W. Bush não decidiu ir à guerra para provar a Saddam Hussein a superioridade intelectual de Montesquieu e Tocqueville. Saddam não foi apeado por ser um ditador, mas porque era o ditador errado, ora essa! Nunca achei que alguém com mais de 15 anos tivesse essa dúvida. “Ditador errado para quem, cara pálida?” Bem, depende do lado em que você está ou do lado em que pensa estar — ou em que está efetivamente do ponto de vista político, intelectual e, em certo sentido, moral.

As ditaduras árabes são desprezíveis? São, sim, como todas as ditaduras. Só que há uma questão relevante aí: elas não foram instituídas pelo governo americano. São uma construção nativa. “Ah, mas o desmonte do colonialismo inglês na região…” Olhem, rende excelente literatura, como o magnífico “Os Sete Pilares da Sabedoria”, de Thomas Edward Lawrence, que rendeu o não menos magnífico filme “Lawrence da Arábia”, de David Lean. As questões que resultaram naquela divisão geopolítica estavam lá. Eu sei que certa visão da história quer sempre saber onde está a culpa, desde que esteja no Ocidente, é claro. Antes como agora, a história dos árabes é  feita por eles próprios. O que esperavam? Que os EUA saíssem hostilizando governos amigos, impondo a sua noção de democracia e os seus valores?

Um regime democrático não se constrói sem valores, atores e estruturas que o sustentem . Não é um modelo a ser importado, mas uma escolha a ser feita na sociedade. O objetivo estratégico dos Estados Unidos no mundo árabe não é levar a sua “democracia”, mas manter uma paz que enfraqueça seus inimigos. Alguém está surpreso ou chocado com isso? Roma Antiga já fazia isso. Os Persas também. Com os gregos, não era diferente. A realidade existe.

“Mas então por que você condenou tanto a aproximação entre Lula e Ahmadinejad?” Porque aquele é um governo terrorista, que financia o terror além-fronteiras e porque está ocupado em construir uma bomba atômica com o claro e declarado propósito de ameaçar um outro país” — ou “varrê-lo do mapa”, na expressão daquele delinqüente. É claro que estou me referindo a Israel.

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Algumas das ditaduras árabes têm contribuído para efetivamente combater o terrorismo islâmico, e eu considero necessário fazê-lo. Barack Obama, até outro dia o queridinho dos politicamente corretos, também deve considerá-lo, daí ter escolhido o Egito em 2009 para fazer seu discurso ao mundo islâmico. Assim, essa coisa estúpida, tolinha, de dizer que os EUA são contraditórios porque apóiam algumas ditaduras e combatem outras é só uma boçalidade supostamente generosa, quando não é ideologicamente orientada. Se eu tivesse de escolher entre a ditadura de Mubarak e a da Irmandade Muçulmana, ficaria com a primeira. “Ah, mas e os egípcios?” Bem, como eles não conhecem uma, podem odiar, e estão certos em fazê-lo, a outra. Sei o que acontece onde os frutos da Irmandade, como é o caso do Hamas, são governo. Hoje, os israelenses já não oprimem palestinos em Gaza; os terroristas  o fazem — sem sistema judiciário organizado porque não precisa!

Democracia no Egito
É claro que eu torço para que o Egito se transforme numa grande e poderosa democracia no Oriente Médio. E seria fantástico que esse espírito contaminasse todos os países árabes. Mas também sou realista. Essa é uma tradição que tem de ser construída. Leio aqui e ali que Mubarak é uma perversão do nassarismo — de Abedel Nasser, o líder quase mítico. Pode ser. Mas Nasser era exatamente o quê? Um líder democrático? Foi ele, de fato, que arrastou os países árabes para a Guerra dos Seis Dias, com os resultados conhecidos. E depois para a Guerra do Yom Kipur, com o repeteco do resultado conhecido. Vênia máxima, o homem prometeu a glória — uma glória que seria trágica para o adversário — e entregou a tragédia para o seu próprio povo.

As ditaduras árabes fracassaram em fornecer melhores condições de vida para o seu povo? Sem dúvida! Miseravelmente! Mas o que os Estados Unidos têm com isso? “Ah, eles fornecem ajuda militar aos ditadores…” Por quê? Deveriam esperar que outros atores, eventualmente seus inimigos, o fizessem?

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Mas a democracia não é um valor universal?
Sim, eu acho que a democracia é um valor que tem de ser universal. Mas é preciso querê-la. E é preciso que haja atores para construí-la. E, justamente porque é um valor universal e inegociável, deve-se ficar atento a movimentos que, sob o pretexto de instituí-la, pretendem apenas usar de suas prerrogativas para impor outras formas de ditadura.

A Irmandade Muçulmana anda fazendo um bom lobby mundo afora. Posa de moderada. Diz que apóia o movimento de deposição de Mubarak, mas que não o lidera. Hora ou outra, um de seus próceres fala demais, a exemplo do que fez Mohamed Ghanem, que concedeu um entrevista a uma TV do Irã pregando que o Egito interrompa o fornecimento de gás para Israel, primeiro passo da guerra contra o país. Ele quer matar o acordo de paz feito em 1978 por Anwar Sadat, sucessor de Nasser — Sadat que foi morto por jihadistas infiltrados no Exército. A origem da Jihad islâmica é a Irmandade Muçulmana, que exigia de Sadat, por exemplo, a imposição da sharia no país.

A democracia é um valor universal, sim, desde que não seja usada para destruir a própria democracia, a exemplo do que fez — e o exemplo é escancarado — o Hamas. Vitorioso, resolveu pôr para correr de Gaza seus “inimigos internos”. Um partido com aquele estatuto não deveria nem sequer ter o direito de concorrer às eleições. A íntegra, para quem quiser ler, está aqui.

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Lá está escrito:
Sois (palestinos) a melhor nação surgida na face da terra. Fazei o bem e proibis o mal, e credes em Alá. (…) Humilhação é a sina deles [dos judeus], onde possam se encontrar, exceto se forem salvos por meio de um compromisso com Alá ou por um compromisso com os homens. Recaiu sobre eles a ira de Alá, e a sina deles é a desgraça, porque recusaram as indicações de Alá (…)

O Hamas nem mesmo se pode dizer uma derivação da Irmandade. É um braço dela, como deixa claro o estatuto, que a cita sete vezes!

Que futuro terá o Egito? Vamos ver. Se a Irmandade Muçulmana der as cartas, será trágico. A ditadura de Mubarak, como se nota, pode ser transitória ainda que dure muito; a outra será permanente. Os EUA têm razões para se preocupar e para tentar uma transição segura? É claro que sim! E não está em questão só a sua segurança, não. Diz respeito ao mundo!

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Há sinais não muito bons. O New York Times de ontem trazia uma reportagem informando que a Casa Branca está tentando entender que pito está tocando Mohamad ElBaradei, esperança de uma oposição laica. Seu discurso andou se tornando mais antiamericano e anti-Israel nos últimos tempos, como se estivesse falando a grupos egípcios que desconfiam de sua excessiva proximidade com o Ocidente. Até aí, vá lá… Há dois dias, a BBC informou que ele fez um acordo com a… Irmandade! E isso é péssimo!

Assim que Mubarak deixar o poder, a Irmandade estará tremendamente fortalecida — de fato, creio que um próximo governo egípcio não se estabelece sem ela. Leiam a respeito. Isso é bom ou mau? Sua história indica que é péssimo. Saberia ela, não obstante, conviver num regime democrático? São os seus fundamentos que negam essa hipótese, não aquilo que eu acho ou escrevo sobre o grupo. Só por isso eu não estou tão animado quanto  Arnaldo Jabor.

Todas as ditaduras são desprezíveis. Só que algumas são muito mais perigosas do que outras.

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