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Reinaldo Azevedo

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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura

A presidente e a Poeta. Ou: Dilma acena com a volta da CPMF e NÃO nega o “toma-lá-dá-cá”

Na quinta-feira, um dia depois de o país ter assistido aos maiores protestos contra a corrupção nos quase nove anos de governo do PT, a presidente Dilma Rousseff concedeu uma entrevista à jornalista Patrícia Poeta, que foi ao ar em duas partes no Fantástico deste domingo. A primeira foi gravada no Palácio da Alvorada, residência […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 10h48 - Publicado em 12 set 2011, 07h35

Na quinta-feira, um dia depois de o país ter assistido aos maiores protestos contra a corrupção nos quase nove anos de governo do PT, a presidente Dilma Rousseff concedeu uma entrevista à jornalista Patrícia Poeta, que foi ao ar em duas partes no Fantástico deste domingo. A primeira foi gravada no Palácio da Alvorada, residência oficial; a segunda, no Palácio do Planalto, sede do governo. Vamos botar um lead no post? Vamos! Dilma não gosta da CPMF, acha que ela foi desvirtuada, mas, está claro, vai tentar recriá-la. Sabem como é…

O Brasil ainda tem a academia mais marxista (ou submarxista) do planeta, mas é ruim de Max Weber. Por aqui, a ética da responsabilidade só toma a cabeça do político depois de eleito. Não que antes a maioria cultive a ética da convicção; prefere é a da irresponsabilidade mesmo, que Lula já chamou, numa espécie de confissão auto-elogiosa (ora essa!) de “bravata”. A Dilma candidata prometeu mundos — sem fundos!!! — na Saúde e negou que fosse recriar o imposto. O debate está de volta, estimulado pelo governo, e o Planalto conta com a pressão dos governadores para voltar a enfiar a mão no bolso do contribuinte, muito especialmente daqueles 13 que desrespeitam a Emenda 29 — E, POIS, A CONSTITUIÇÃO — e não aplicam os 12% das receitas líquidas na Saúde. É a turma liderada pelo “Bonde do Sérgio Cabral”. Volto ao assunto. Agora vou ao sublead.

A entrevista, tudo somado e subtraído, acabou sendo positiva para Dilma, é inegável, muito especialmente na primeira parte, uma coisa, assim, mais Dona Maricota, porém “com cérebro”.  Patrícia Poeta não estava ali, como dizer?, para “apertar” Dilma — não é uma crítica pejorativa; apenas uma constatação. Doce, a jornalista foi levando com leveza o bate-papo sobre o combate à corrupção até que, aos 6min12s, do segundo bloco travou-se o seguinte diálogo:
PATRÍCIA – E como que a senhora controla esse toma-lá-dá-cá, digamos assim, cada vez mais sem cerimônia das bancadas. Como é que a senhora faz esse controle?
DILMA – Cê me dá um exemplo do “dá-cá” eu te explico o “toma-lá”.
PATRÍCIA – (SURPRESA MUDA)
DILMA– Tou brincando contigo!
PLATÉIA DE PUXA-SACOS – (GARGALHADA)

Segue o filme se quiserem ver o trecho. Volto em seguida.

https://s.videos.globo.com/p2/player.swf

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Voltei
É preciso tomar cuidado com políticos, mesmo quando eles se mostram serenos, né? Não que eu ache que jornalistas tenham de dar invertidas em homens públicos, mas o contrário também é pouco desejável. No caso em particular, duplamente indesejável: a) porque a pessoa pública é Dilma; explicar-se está entre os seus deveres; b)  porque a entrevistadora está certa! Notem que Dilma faz uma pausa dramática. Ela achou que tinha encaixado uma boa frase.

Se Patrícia quisesse sair da poesia lírica para algo mais, assim, no gênero dramático, teria preenchido o silêncio com uma resposta (já que foi inquirida) óbvia:
“Presidente, o seu ‘dá-cá’, por exemplo, eram os votos do PR, e o “toma-lá”, o Ministério dos Transportes, entregue ao partido de porteira fechada, uma herança do presidente Lula, mas que a senhora manteve. De tal sorte a pasta estava fora do controle que foram demitidas 26 pessoas além do ministro. O governo teve de recorrer à liberação emergencial de emendas para impedir que parlamentares da base assinassem o requerimento de CPI. Isso é conhecido em política por ‘toma-lá-dá-cá”.
Nesse caso, Patrícia recuperaria o seu papel de entrevistadora e devolveria Dilma a seu papel de entrevistada, sem lhe dar a chance de ser “generosa”,  com aquele “tou brincando contigo”. Isso é um texto deliberado para infantilizar o interlocutor. Se Patrícia Poeta fosse sensível como José Sérgio Gabrielli, teria caído no choro… Por alguns instantes, vislumbrou-se a Dilma da canelada. Mas ela se recompôs.

Ao contrário do que já andei lendo por aí, Dilma não negou o “toma-lá-dá-cá” coisa nenhuma! As palavras fazem sentido. Ela tentou lhe emprestar a dimensão de uma teoria política:
“Eu não dei nada pra ninguém que eu não quisesse. Nós montamos o governo de composição. Caso ele não seja um governo de composição, nós não conseguimos governar. A minha base aliada, ela é composta de pessoas de bem. Não é possível que a gente chegue e diga: ‘Todos os políticos são pessoas ruins; não é possível isso no Brasil…. Vou tomar uma água.”

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Dilma vai melhor sem marquetagem
Dilma, justiça se lhe faça, melhorou bastante, mas ainda se atrapalha e esquece o texto. E tropeça quando tenta passar a imagem da pensadora sensível. João Santana e a turma da Comunicação Social deveriam parar com essa besteira. A presidente que emplaca é mesmo a durona, aquela que dá a entender que é chegada numa bronca… Indagada sobre o seu maior acerto em oito meses, titubeou, tentou encontrar ali alguma emoção aprisionada no casaquinho executivo, mas não vinha nada… Tartamudeou:

“Nesses oito meses… Deixe eu pensar… Por que é que estou pensando? Porque eu não posso te dar várias… Porque eu acho que algumas coisas, eu, eu, eu acertei bastante. Eu vou falar… Eu acho que foi muito acertado, logo de início, ter entrega (sic) os remédios de graça porque… Sabe por que que eu tou falando isso? Porque eu acho que a pessoa que não tem dinheiro para comprar remédio e precisa, eu acho que é um drama humano violento (…)”

Então tá!

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De volta à CPMF
Aos 9min26s, Patrícia Poeta afirma:
“Em seguida pergunto sobre o novo debate nos meios políticos: a possível volta da CPMF. A presidente logo esclarece:”

A gente vai ver que o verbo “esclarecer” aí é uma generosidade. Leiam a seqüência:
DILMA – (Dedo em riste) Eu sou contra a CPMF.
PATRÍCIA – A senhora acha que a gente precisa de um imposto, de mais um imposto, para ter um atendimento de saúde melhor?
DILMA – Sabe por que que a população era contra a CPMF? Porque a CPMF foi feita pra ser uma coisa e virou outra. Acho que a CPMF foi um engodo nesse sentido: de usar o dinheiro pra Saúde não pra Saúde. Agora, vou te dizer…
PATRÍCIA – O dinheiro foi desviado…
DILMA – Foi, foi, o dinheiro não foi usado onde devia. Nós, na Saúde pública do país, gastamos duas vezes e meia menos do que na saúde privada. Um pais deste tamanho, o maior país da América Latina, com a maior economia da América Latina, gasta 42% menos na Saúde do que a Argentina. Para dar saúde de qualidade, nós vamos precisar de dinheiro, sim, não tem jeito! Não tem jeito! Tem de tirar de algum lugar. Agora, o Brasil precisará de (sic) aumentar o seu gasto com a Saúde. Inexoravelmente.
PATRÍCIA – isso seria quando?
DILMA – O mais rápido possível.

De novo, se a poesia sai do gênero lírico para o dramático, seria o caso de lembrar à presidente que ela foi a gerentona de um governo que teve nas mãos a CPMF por cinco longos anos, não é? Quantos bilhões o governo que ela tão bem encarnava, o “engodo petista” desviou da Saúde para outras áreas? Se o “dinheiro” tem de sair de algum lugar, por que não esquecer, por exemplo, uma estupidez como o trem-bala e começar economizando os R$ 700 milhões do projeto executivo? Daria para comprar alguns tomógrafos… Mas a conversa continuou no gênero lírico.

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Encerrando
Ah, sim: Dilma também disse aquelas generalidades de manual sobre mulheres serem mais detalhistas e analíticas, e os homens mais generalistas e sintéticos, afirmou que é importante ter um governo com os dois sexos porque são complementares (ufa!) e reconheceu que sabe quebrar ovos, mas não fazer omeletes… E deu, no primeiro bloco, a resposta que Lula jamais poderia ter dado:
PATRÍCIA – O que é que tem a sua cara aqui [no Palácio da Alvorada], que a senhora gosta, que a senhora se enxerga?
DILMA – A biblioteca. E acho que aquela biblioteca, eu acho ela muito bonita também. E um local muito bom. Eu gosto muito de conviver com livro. E livro não… Apesar de eu ter feito um esforço e aprendido a ler no iPed, eu leio hoje e-books, eu gosto de páginas, gosto do papel, gosto do cheiro do papel, coisa de infância, sabe?

Sabemos. Uma das peças de resistência da turma que cuida do marketing pessoal de Dilma é caracterizá-la como uma intelectual e amante das artes. Faz sentido estratégico. Se ela não pode ser “povo” desde criancinha, como Lula, é preciso ser, então, uma pensadora séria desde criancinha.

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