A pesquisa que o Estadão fez sobre a cracolândia, o que ela revelou e como a coisa foi noticiada
O Estadão foi contra a intervenção do Poder Público na cracolândia. Expressou essa opinião em editorial. O seu caderno “Metrópole” entrou numa verdadeira militância para demonstrar os erros da operação. Até aí, vá lá. Acho que veículos de comunicação podem fazer isso desde que os leitores sejam avisados e desde que opinião não seja tratada […]

O Estadão foi contra a intervenção do Poder Público na cracolândia. Expressou essa opinião em editorial. O seu caderno “Metrópole” entrou numa verdadeira militância para demonstrar os erros da operação. Até aí, vá lá. Acho que veículos de comunicação podem fazer isso desde que os leitores sejam avisados e desde que opinião não seja tratada como informação. Pois bem.
O jornal traz hoje uma pesquisa feita pelo Instituto Informa. Vejam a síntese.
Então… Vocês perceberam ali que 81% dos entrevistados “APROVAM TOTALMENTE” a “operação para coibir o tráfico de crack no centro”; outros 3,7% “APROVAM” (o instituto deve saber a diferença entre uma coisa e outra; eu não sei). Só 8%, somados, “reprovam” ou “reprovam totalmente”.
Mais: 67,7% “aprovam ou aprovam totalmente” a “forma com que a polícia está realizando a operação na cracolândia. Só 16,2% “reprovam ou reprovam totalmente”.
O jornal queria uma coisa, o povo quis outra. Acontece. É da democracia. Como resolver?
A pesquisa traz uma pergunta — e havia uma parecida também no Datafolha — que dá o que pensar: “Em sua opinião, a operação policial na cracolândia resolverá o problema do tráfico?”
Que bom que a população não é besta. 67,9% dos entrevistados disseram que “não”. O Estadão, que, visivelmente apóia a chegada de UPPs a alguns morros do Rio, já indagou se a medida vai “acabar com o tráfico” na opinião dos cariocas? Não que me lembre. Se o fez, certamente não deu o resultado negativo — para a iniciativa do poder público — como principal destaque.
Ora, indagar se a retomada da cracolândia vai ou não acabar com o tráfico é o mesmo que perguntar se a blitz para coibir os bêbados no trânsito vai acabar com o problema do alcoolismo ou da irresponsabilidade de alguns motoristas.
Pior: há uma pergunta capciosa, cuja resposta é de todos conhecida e, mais do que isso, é parte óbvia da operação, a saber; “Você acha que a operação dispersou dependentes de drogas para outros bairros?” 77% disseram o óbvio: “sim”.
A proposta original, correta, era exatamente descaracterizar uma área da cidade como “reino dos drogados e traficantes”. Ali já não havia poder público. Traficantes foram presos. Muitos viciados decidiram aceitar o tratamento. Mas é evidente que os drogados não se desintegraram; foram para algum lugar. O objetivo da operação era e é impedir que uma área da cidade seja sitiada.
Pois bem! Adivinhem qual foi a manchete de página do Estadão e do Estadão Online… “Cracolândia: 68% não acreditam em solução”. O Datafolha, reitero, trazia questões semelhantes, mas a manchete da Folha e a da página fizeram o óbvio: noticiar que a população apóia, por ampla maioria, a operação e a ação da polícia. Se não apoiasse, seria manchete também.
O Estadão segue, assim, na sua linha de apenas dar destaque a aspectos negativos para o Poder Público no que concerne à cracolândia, mesmo quando um fato, a sua própria pesquisa, contraria a sua militância. Um mau momento.