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A internação de viciados. Ou: Qual é a causa secreta do padre Júlio Lancelotti? Ou: Caridade concupiscente é pecado!

Quando a Igreja Católica permite que tipos como o padre Júlio Lancelotti, da dita Pastoral de Rua, atuem livremente, corre o risco de se desmoralizar. Aliás, corrijo-me: desmoraliza-se, sim, sempre um pouco mais a cada dia, um pouco por dia, de forma contínua e, se querem saber, inexorável. Não recupera mais o que perde. O […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 07h01 - Publicado em 22 jan 2013, 15h44
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  • Quando a Igreja Católica permite que tipos como o padre Júlio Lancelotti, da dita Pastoral de Rua, atuem livremente, corre o risco de se desmoralizar. Aliás, corrijo-me: desmoraliza-se, sim, sempre um pouco mais a cada dia, um pouco por dia, de forma contínua e, se querem saber, inexorável. Não recupera mais o que perde. O padre voltou à ribalta, ou ao palco, depois que um casal que o achacava acabou condenado, o que soou a muitos como uma absolvição do religioso. Ninguém nunca entendeu, ou entendeu, com quais elementos Lancelotti era chantageado. O certo é que, em sua infinita generosidade cristã, haveria comprado um carro de luxo para um ex-interno da Febem, de quem se tornou amigão. A hierarquia fez de conta que estava tudo bem.

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    Lancelotti pertence à tal “Pastoral de Rua”, uma herança maldita que a Escatologia da Libertação deixou para a Igreja. Pastorais as há muitas: de rua, do índio, disso e daquilo. Só falta criar a Pastoral dos Ateus Militantes. E minha ironia é menos absurda do que parece. Afinal, existem umas senhoras que se dizem “Católicas pelo Direito de Decidir”. Defendem a legalização do aborto. Católico a favor do aborto é, assim, como republicano a favor da canonização (que está em curso) de Barack Obama… Ou, se quiserem, como democratas que reconhecem em “Jorjebúxi” um estadista… Mas volto.

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    O governo de São Paulo decidiu dar eficácia à lei que permite a internação de dependentes químicos que perderam a condição de fazer as próprias escolhas. E atua cercado de todos os cuidados. Recursos públicos estão sendo empregados para mobilizar médicos, juízes, Ministério Público e OAB. Trata-se, já escrevi aqui, de uma situação realmente delicada. A chance de haver abusos em casos assim é grande. Daí a necessidade de cuidar das margens de erro.

    Muito bem! O que fez o padre? Foi para a rua, como é de seu costume, quando, do outro lado, existem iniciativas que não são comandadas pelo PT, um dos ídolos pouco pios diante do quais ele se ajoelha.

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    Tenta pespegar na iniciativa a pecha de “higienismo”, selo que passou a usar para designar supostas ações de “limpeza social”, que, de fato, nunca existiram. Qual é a tese do padre? As cidades brasileiras precisam de assistência social, de especialistas que atendam os drogados nos lugares onde estão, que acompanhem o seu caso etc. e tal. Lancelotti, pelo visto, acha que todo drogado de rua tem direito a uma espécie de babá, que, segundo se entende, tem de respeitar “a sua vontade”, como afirmou outro padre, também presente ao protesto.

    Absurdo
    Não nos damos conta do absurdo que há numa coisa chamada “Pastoral de Rua”. Ora, que houvesse religiosos — mas religiosos mesmo, com a caridade na mão e a Bíblia na cabeça — dedicados a minorar as agruras de quem mais sofre, eis algo que me parece razoável. Desde que a perspectiva e o objetivo seja tirar as pessoas da rua. Mas não! Os Lancelottis da vida convertem o morar na rua num “direito”. Esses moradores são vistos como uma “categoria social”, que passariam a ter demandas próprias de sua condição. “Ah, Reinaldo, normal e lógico; se são moradores de rua, terão reivindicações específicas.” Sim, normal e lógico desde que, reitero, o horizonte seja sair da rua. Mas não! É o contrário: o que se quer é aprimorar as condições que permitam a essas pessoas continuar… na rua!

    Trata-se de uma perversão escandalosa do princípio da caridade, presente, ademais, em outras pastorais. Vejamos o caso dos padres que lidam com índios. Ora, a função de um sacerdote, a primeira e, a rigor, a única é lutar pela aplicação dos princípios cristãos, segundo entende a Igreja Católica. Notem: qualquer padre pode deixar a igreja e se converter num desses antropólogos moralmente homicidas que justificam o assassinato de crianças “em nome da cultura”. Ninguém precisa pertencer à hierarquia católica para defender que os índios têm o direito natural à estagnação… Mas não! Esses pervertidos entram na Igreja Católica para tentar preservar, na sua imaginação aloprada e ignorante, o “bom selvagem de Rousseau”. Foi assim que, na prática, a Igreja Católica apoiou a expulsão dos arrozeiros de Raposa Serra do Sol. Resultado: miséria, fome e favelização. Não foi Deus que inspirou os padres a apoiar aquela luta. A ter sido algum ente que está além de nós, foi o diabo.

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    O mesmo diabo — e falo por metáfora — que leva Lancelotti e outro reacionário de batina a se mobilizar contra a internação compulsória de pessoas que não podem escolher. Noto à margem que, no Rio, crianças já são internadas à força. A internação é ainda uma exceção porque a cidade e o estado não têm onde abrigar os viciados. De todo modo, por lá, os petistas ficaram de boca fechada. São governo. Alexandre Padilha, ministro da Saúde, já se disse favorável à prática. Em São Paulo, no entanto, Fernando Haddad, o Supercoxinha do subjornalismo deslumbrado, se junta aos críticos do programa. Adiante.

    Quando a hierarquia católica permite que Lancelotti participe de atos assim, como se estivesse a levar adiante a voz da Igreja, é a instituição que se rebaixa ao entendimento perturbado de um homem, ocasionalmente padre. Desafio este senhor a demonstrar que fundamento da religião ou da dignidade humana está sendo desrespeitado com o programa.

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    Existe uma diferença entre a ajuda e a concupiscência da caridade. Leiam o conto A causa secreta, de Machado de Assis. Quem conhece já sabe; quem ainda não leu, recomendo vivamente, deve fazê-lo. Ali aparece a figura de Fortunado, homem que tinha especial inclinação para ajudar os que sofriam… Por que o fazia? Bem, ele tinha uma causa secreta…

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    A dor dos que sofrem tem de ser minorada; ela não existe para que padres exercitem seus amores e seus ódios privados. Ou para que deem vazão à sua “causa secreta”.

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