A covardia intelectual dos neo-adesistas. Gostei deste texto.
No post abaixo, falei do jacobinismo bocó de setores da mídia. É interessante. Certas vocações estavam adormecidas ou um tanto envergonhadas de se identificar com o clepto-petralhismo. Convenham: não fica bem defender um grupo onde brilharam vocações como Delúbio Soares, Silvio Pereira e, claro, José Dirceu. Defender que eles faziam bem à democracia era tarefa […]
Explico. Aqueles que sempre fizeram a defesa envergonhada do petismo refugiaram-se no chamado “apoio crítico”, criticando Lula e o partido, mas segundo uma ótica que consideravam “civilizada”: a da esquerda. Assim, acusar Lula de ter cedido ao neoliberalismo, de ter adotado supostas práticas de adversários, de ter-se rendido ao triunfo intelectual do economicismo… Enfim, essa besteirada pegava bem. Entendam: era a crítica feita a partir de um ponto de vista interno, “companheiro”. Se a universidade brasileira não tivesse encabrestada, haveria aqui farto material para estudo: das críticas todas feitas a Lula na imprensa, quantas tentaram moralizá-lo utilizando a via esquerda do pensamento? Com absoluta certeza, esse tipo de divergência constitui a larga maioria.
E quando é que esses setores antes críticos voltaram para o regaço do “operário pobre”? Quando pressentiram a “ameaça da direita” — também chamada de “direita primitiva”, “direita rústica”, “direita desinformada”, “direita deslumbrada” e afins. Em tempo: onde estaria a “direita lúcida”? Ora, morta, é claro. A direita boa, para eles, sempre estará morta.
E onde estaria essa direita viva hoje em dia? Acreditem: segundo dizem, ela se manifesta por meio do Movimento Cansei e da moçada que decidiu vaiar Lula usando como instrumento de subversão um nariz de palhaço. Essa gente pediu golpe? Essa gente quer depor Lula na marra? Essa gente está convocando a massa para a tomada do Palácio? Não. Está apenas protestando. Mas bastou. Os neo-adesistas não queriam um motivo; queriam um pretexto.
E, finalmente, eles o encontraram. Já podem fazer a defesa, agora desavergonhada, do governo Lula e de seus métodos. Afinal, apareceu o inimigo que justifica todas as imposturas: a direita. Não é um movimento original. Já aconteceu antes, em circunstâncias bem mais dramáticas. Não custa lembrar que, na União Soviética submetida à censura, aos campos de trabalhos forçados, à pena de morte, intelectuais eram assassinados e encarcerados, enquanto seus pares ocidentais continuavam a defender a superioridade moral do stalinismo no confronto com o imperialismo.
Sabiam do horror vigente na “pátria do socialismo”? Claro que sim. André Gide já o havia denunciado no fim da década de 30. Mas e daí? Entre o modelo ocidental, que permitia a crítica e a divergência — porém “imperialista” — e o soviético, que tratava o dissenso no porrete, escolheram o segundo. Afinal, acreditavam, era ele que acenava com o futuro glorioso. Um bom esquerdista não vê problemas em justificar cadáveres presentes em nome da vida futura. Os “nossos” esquerdistas da mídia, do mesmo modo, embora em batalha menos crucial, também acham que o combate à “ameaça direitista” justifica o alinhamento com a institucionalização do assalto aos cofres públicos.
Eis os progressistas que fizemos.