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Anticorrupção para todos: um compromisso que nasce de nós

A luta anticorrupção é parte indissociável da luta pela igualdade

Por André Duffles Teixeira Aranega
12 dez 2025, 10h00 • Atualizado em 12 dez 2025, 10h28
  • Enquanto a corrupção é reduzida a slogans eleitorais, disputas em redes sociais, conflitos familiares e discursos que tentam justificar o injustificável, o povo brasileiro sente seus efeitos na pele antes mesmo de se dar nome ao problema. A corrupção está na sobrecarga da saúde pública, com filas intermináveis, atendimentos tardios e escassez crônica de profissionais, medicamentos e equipamentos. Manifesta-se, também, em escolas precárias, sem eletricidade, materiais adequados e merendas de péssima qualidade. Revela-se, ainda, no transporte público, com ônibus, trens e metrôs sem manutenção, superlotados ou inacabados, que acabam resultando em jornadas cansativas ou acidentes evitáveis.

    A precariedade do saneamento básico, as enchentes recorrentes e a gestão urbana inadequada também são manifestações da corrupção. A distorção em licitações públicas é parte desse cenário, onde concorrências são montadas para parecer legítimas e contratos são definidos para favorecer grupos específicos. Outras práticas convencionais, como a compra de votos, extorsões, silenciamento de denúncias e os homicídios nunca esclarecidos, também compõem esse mesmo ecossistema.

    A corrupção ainda facilita a infiltração do crime organizado no setor público, ampliando a insegurança via o desvio de armas de estoques oficiais, no vazamento de informações sigilosas, na gestão compartilhada de territórios e do sistema carcerário, na lavagem de dinheiro e nas outras formas de colaboração entre o Estado e a criminalidade organizada. Em um país marcado por heranças escravocratas, essas mesmas dinâmicas se manifestam, sobretudo, nas periferias do país, onde a corrupção se entrelaça com o racismo estrutural, reforçada por episódios de violência policial e um sistema de justiça seletivo que perpetua a lógica de que certas vidas valem menos.

    Em regiões remotas, a corrupção se manifesta na impunidade de crimes ambientais, grilagem e fraudes fundiárias, no desmonte da fiscalização e na violência contra defensores ambientais. Nesse contexto, ela sustenta economias ilícitas que aceleram a devastação de biomas, minam o desenvolvimento sustentável e agravam a crise climática global, afetando o planeta inteiro, mas cujas consequências diárias recaem com brutalidade sobre os povos indígenas.

    Ramificações da corrupção são igualmente notáveis ao considerarmos os indícios preocupantes que atravessam o Executivo, Legislativo e Judiciário. Retrocessos legislativos são negociados via articulações controversas, emendas parlamentares controladas sem transparência, cargos públicos distribuídos em troca de apoio político, órgãos de controle enfraquecidos, casos de nepotismo, investigações paralisadas, acordos de leniência anulados, decisões judiciais beneficiando corruptos confessos e ex-presidentes, ministros, empresas públicas e parlamentares de diferentes partidos investigados ou até mesmo condenados em esquemas bilionários de corrupção.

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    O setor privado tampouco escapa do problema. Executivos e empresas recorrem à corrupção e crimes correlatos com frequência, distorcendo a integridade do mercado em casos envolvendo desde subornos, fraudes contábeis, manipulação de licitações até a formação de cartéis. O lobby setorial descontrolado, ainda, potencializa os riscos de corrupção nesse contexto. Ademais, a infiltração do crime organizado em fintechs e fundos de investimento também tem sustentado esquemas bilionários de lavagem de dinheiro. Todos esses fatores atentam contra a integridade do mercado e consolidam um ambiente em que decisões são tomadas em prejuízo do interesse público e dos acionistas.

    Globalmente, a corrupção assume contornos transnacionais e é potencializada pela interdependência da economia global, opacidade financeira e estruturas societárias complexas, conectando fluxos financeiros ilícitos, paraísos fiscais, empresas offshore e elites corruptas. Cadeias produtivas globais, em muitos casos, operam sob práticas corruptas e crimes correlatos, afetando milhões de vidas. Iniciativas de financiamento internacional são distorcidas por lobby indevido, tráfico de influência, propinas e conflitos de interesse. Empresas de fachada, conforme revelado em investigações jornalísticas, são cruciais para a ocultação do dinheiro sujo de políticos, empresários e outros atores em escala global. Regimes cleptocráticos, muitas vezes controlados por clãs familiares, atentam contra o espaço cívico e a democracia em vários países.

    Esses exemplos não esgotam a complexidade do problema, mas refletem realidades que muitos já ouviram falar ou viveram na pele. A corrupção concentra privilégios, viola direitos humanos e aprofunda desigualdades. Seu enfrentamento é, portanto, uma luta pela justiça social, realização de direitos e paz.

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    Precisamos de uma “agenda anticorrupção para todos”, inerentemente plural e multissetorial. Em meio às disputas políticas e às narrativas polarizantes, céticos dirão que tal agenda não passa de uma utopia. Esse ceticismo é legítimo em um país habituado a promessas quebradas, escândalos recorrentes e vidas perdidas em jogos de poder que beneficiam poucos à custa de muitos. Mas essa descrença mira no alvo errado.

    Utopismo é acreditar em uma “bala de prata” contra a corrupção, encarnada em salvadores da pátria que se apresentam como heróis, mas agem como falsos profetas. Igualmente utópico é imaginar que a desigualdade estrutural do país será superada sem enfrentar a corrupção que a sustenta. Uma agenda anticorrupção para todos é possível. Resta-nos posicioná-la no embrião do projeto democrático do país e das ações de enfrentamento da desigualdade.

    Às vésperas de mais um Dia Internacional Contra a Corrupção, cabe reforçar: a luta anticorrupção é parte indissociável da luta pela igualdade. A corrupção nunca foi um crime sem vítimas, mas é preciso reconhecer que seus efeitos recaem com potência na vida de certos grupos. Construir um país justo e íntegro, sobretudo para aqueles historicamente deixados para trás, é um compromisso que nasce de nós.

    André Duffles Teixeira Aranega é Bacharel e Mestre em Relações Internacionais pela PUC-Rio e atualmente cursa MBA em Governança, Risco, Controle e Compliance na USP. Atua em pesquisa científica, atividades acadêmicas e consultoria nas áreas de relações internacionais, segurança global, análise de riscos, compliance, crime organizado transnacional, comércio ilícito, prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, crimes ambientais, anticorrupção, governança, investigações corporativas e due diligence. É autor e coautor de diversas publicações científicas em periódicos, editoras especializadas e instituições internacionais.

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