Temor inflacionário faz bolsa derreter em curta semana de Carnaval
Piora em expectativas de inflação no Brasil e nos EUA são fontes de tensão; combustíveis devem ser reonerados e expõem dilema no PT
VEJA Mercado | Fechamento da semana | 20/02 a 24/02
Inaugurada pela maior tragédia climática do estado de São Paulo – ao menos dos últimos anos, a semana do último Carnaval mexeu com a emoção dos brasileiros misturando celebração e lamento. Em razão do feriado, o mercado financeiro teve uma semana mais curta, de apenas dois dias e meio. A despeito disso e mesmo sem grandes novidades vindas do governo, a emoção dos investidores também foi aflorada nos últimos dias, com o índice Ibovespa despencando 4,5% entre a quarta-feira de cinzas e a última sexta-feira, 24. A queda se deu em grande medida logo após o término do feriado, com a divulgação do Boletim Focus revelando uma piora considerável nas projeções de inflação para o país. Como apontado pelo documento, os investidores podem esperar uma alta de preços mais alta do que o previsto nos anos de 2023, 2024 e 2025. Mais inflação sinaliza uma provável manutenção ou intensificação da alta de juros, o que torna mais atrativa a retirada de investimentos da bolsa rumo a produtos de renda fixa. Um ingrediente de destaque na piora das projeções econômicas do país é a incerteza quanto ao futuro das metas de inflação do Banco Central (BC), polêmica que marcou uma divisão entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Roberto Campos Neto, do BC, em semanas anteriores.
Além dos fatores internos, maus ventos vindos dos Estados Unidos também tiraram o sono de acionistas na última semana. A divulgação do índice de preços de consumo (PCE) intensificou o clima de “terra arrasada” nos mercados, uma vez que a expectativa de uma alta de 0,4% para o mês de janeiro foi superada, ficando em 0,6%. Com isso, o cenário inflacionário dos EUA é deteriorado e, devido ao seu efeito de elevação dos juros, resulta em aversão ao risco e fuga de capital das bolsas de valores. Como ficou mais fácil ter bons rendimentos na renda fixa americana, o câmbio também não escapou dessa equação, com a desvalorização do real frente ao dólar. A moeda americana, que chegou à cotação de 5,12 reais na quinta-feira, encerrou a semana cotada a 5,20 reais.
Durante os dias que seguiram o Carnaval, um fato inusitado também foi fonte de estresse para agentes do mercado. Um caso de doença da “vaca louca” foi confirmado no município de Macapá, no estado do Pará, ocasionando na suspensão da exportação de carne bovina do Brasil para a China. A medida é automática nesse tipo de situação, devido a um protocolo selado entre os dois países. O fato derrubou os papéis de frigoríficos listados na bolsa na última quarta-feira, 22. A Minerva e a BRF sofreram os maiores baques, com quedas de 7,47% e 6,71% em suas ações, respectivamente.
Ficando em segundo plano devido ao Carnaval e às chuvas extremas em São Paulo, a política econômica do governo Lula foi rememorada devido à aproximação de uma data muito aguardada pelo mercado financeiro. Na próxima terça-feira, 28, a desoneração de impostos federais sobre a gasolina e o etanol chegará ao fim. Iniciada no último ano eleitoral pelo governo de Jair Bolsonaro, a medida foi prorrogada em dois meses assim que Lula tomou posse como presidente. Trata-se de uma razão para polêmica dentro do Partido dos Trabalhadores (PT), uma vez que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já se colocava como contrário à isenção desde antes de ser empossado, enquanto correligionários como Gleisi Hoffmann defendem que a isenção persista além do autorizado. Ao prorrogar a isenção por dois meses, Lula deu mais ouvidos a Gleisi, que não tem cargo no governo, do que ao seu ministro da Fazenda. Resta saber qual lado o presidente irá privilegiar futuramente. Os petistas levam em conta que, se os impostos voltarem na próxima semana, a projeção do mercado para a inflação de 2023 subirá 0,6%, pressionando os tão polêmicos juros do Banco Central autônomo.
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