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Por Mario Mendes Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Quando seu amigo vira um artista maldito

Fico sabendo que há um livro e uma mostra na cidade sobre o artista plástico Hudinilson Jr. – encontrado morto em seu  apartamento no bairro da Bela Vista, em São Paulo, em 2013, aos 55 anos. Posição Amorosa, escrito pelo crítico de arte Ricardo Resende, e a exposição em cartaz no Centro Cultural São Paulo […]

Por Redação Atualizado em 2 fev 2017, 08h59 - Publicado em 20 set 2016, 14h13

hudinilson jr. jpg

Fico sabendo que há um livro e uma mostra na cidade sobre o artista plástico Hudinilson Jr. – encontrado morto em seu  apartamento no bairro da Bela Vista, em São Paulo, em 2013, aos 55 anos. Posição Amorosa, escrito pelo crítico de arte Ricardo Resende, e a exposição em cartaz no Centro Cultural São Paulo celebram uma personalidade marginal, visceral, sem limites. “Um sujeito obcecado por sexo e dono de uma obra suja”, segundo Resende.  Curioso deparar com descrição tão crua, sem meios tons, de alguém que se conheceu bem durante anos de amizade.

Não lembro bem como cheguei até Hudinilson, ou se foi ele quem chegou até a mim. Éramos jovens, começo dos anos 80, e eu fazia um trabalho sobre novos artistas – a pauta inicial eram novos talentos em diversas áreas, mas fiquei fascinado pelas artes plásticas, que experimentavam um boom na época. Foram algumas conversas por telefone, um rápido encontro na redação da Interview, o veículo “nanico de luxo” onde eu trabalhava, e uma tarde de visita no ateliê instalado na casa onde ele vivia com os pais, uma ampla residência no bairro da Aclimação.

O clique foi imediato: alto, magro, cabeleira negra encaracolada, figurino meio clássico meio desabado e, sobretudo, sorriso largo e gargalhada maior ainda, Hudinilson não despejou em cima de mim teorias mirabolantes nem significados ocultos – aquilo que hoje chamariam de conteúdo, ou pior, narrativa. Fazia sim um trabalho erótico – colagens exibindo atléticos corpos masculinos misturados com tecidos, plásticos, objetos inusitados, além das composições com imagens em xerox de partes do corpo do próprio artista, que ele intitulou Exercícios de Me Ver  – mas não exatamente obcecado por sexo ou sujo. Pelo menos ainda não. Era abusado, explícito mas, ao mesmo, tempo lírico e delicado.

Ele também fazia parte de um coletivo – sim, eles já existiam – o 3NÓS3, com os amigos artistas Mário Ramiro e Rafael França (1957-1991), que fazia ações (ocupações?) pela cidade, como encapuzar estátuas de espaços públicos da cidade – como o monumento ao bandeirante  Anhanguera, no portão do Parque Trianon, em frente ao MASP – e em seguida fotografá-las, numa alusão aos tempos bicudos que vivíamos durante a Ditadura. Jovens mandando seu recado de forma irreverente e impertinente, porém não tola. Mário Ramiro está finalizando um livro sobre a trajetória do trio.

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Era representado por uma galeria, Suzana Sassoun, nos Jardins, e trabalhava com afinco explorando seu próprio corpo e de outros – amigos ou desconhecidos serviam de modelo vivo nesses experimentos gráficos – para retratar aquela sexualidade alternativa que ainda desabrochava pouco antes da devastação provocada pela Aids.

Em uma de minhas caixas pretas – onde todas as informações poderão ser encontradas em caso de acidente – está um trabalho que ele me presenteou. Uma colagem, singela e hard-core: papel plastificado, reprodução fotográfica recorte de revista de nu masculino, fita isolante, fita de renda, papel estampado, frasco de perfume contendo tinta nanquim, grafite. A assinatura em relevo é minúscula,  “Hudinilson Jr., 82”. Lembrou-me as vernissages que costumávamos frequentar toda semana – pelo menos duas, regularmente – as muitas cervejas consumidas no Sujinho, da Consolação, quando ainda era bem mais modesto e conhecido como Bar das P…, as inúmeras festas e os nightclubs do circuito Centrão-Augusta-Bixiga, com destaque para o lendário Madame Satã. Tudo com direito a intermináveis papos cabeça sobre arte, amor, vida e morte. Rindo muito, sempre.

Justamente quando ele se tornou um artista contundente e fora do mercado – dialogando com Jean Genet e Robert Mapplethorpe – eu havia trocado o underground de São Paulo pelo circuito da moda internacional. Nos afastamos. Houve um esboço de reaproximação nos anos 2000, mas ao contrário do início, não fomos além dos telefonemas. Sua morte foi um choque e confirmou a biografia do artista maldito. Descubro que ele está nos acervos do MoMA, em Nova York, do Reina Sofia, em Madri, e do Malba, em Buenos Aires. Para mim, ele está além de qualquer classificação.

Hudinilson Jr.: Zona de Tensão fica em cartaz no CCSP até 30 de outubro. Hudinilson Jr.: Posição Amorosa foi publicado no ano passado. Conheça o trabalho do artista e tire suas próprias conclusões.

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