O brasileiro é politizado?
Rejeitar rótulos como esquerda e direita não é sinônimo de alienação

À primeira vista, os brasileiros parecem desinteressados em política. Para começo de conversa, a maioria de nós não se identifica como “de esquerda” ou “de direita”, fato confirmado por uma pesquisa recente do Instituto Locomotiva. O mesmo levantamento apurou que mais da metade do país desiste de continuar uma conversa quando seu interlocutor tem opiniões divergentes sobre alguma figura política ou sobre temas ligados a esse universo. Os que nunca expõem suas opiniões políticas são 38% da população – índice que chega a 52% dentre os que não se identificam com nenhuma ideologia.
Há duas maneiras de olhar para esses dados. A primeira é concluir que o brasileiro é, de fato, um povo despolitizado. A segunda – a meu ver, muito mais produtiva – é tentar entender porque os rótulos tradicionais não têm dado conta dos anseios políticos da maioria.
As condições econômicas e sociais do país pioraram muito nos últimos anos. Sofremos com a inflação, com o desemprego, com a volta da fome. Quando boa parte da população não sabe se conseguirá fazer ao menos duas refeições por dia, ideologias políticas começam a parecer, infelizmente, problemas secundários.
Ademais, na esteira de grandes escândalos de corrupção, a política tradicional passou por um processo de demonização pura e simples, ficando deslegitimada como espaço de harmonização de conflitos. Some-se a isso a proliferação de notícias falsas, que torna o ambiente das redes sociais cada vez mais tóxico, e é fácil compreender porque tantos brasileiros não querem se meter em discussões que envolvam partidos, candidatos ou ideologias.
Acontece que há muitas maneiras de ser politizado. Ser militante de um movimento social é uma delas, mas o que dizer de quem estimula os pequenos negócios do seu bairro ou se engaja em campanhas solidárias? Não seriam também maneiras de – com o perdão do trocadilho – tomar partido?
Encarado dessa forma, o problema deixa de ser a suposta falta de politização dos brasileiros – até porque ninguém sabe ao certo o que é “ser politizado” no século XXI. Pelo contrário, faltam respostas, por parte das lideranças políticas tradicionais, capazes de cativar essa maioria refratária aos velhos rótulos ideológicos.