Expo Favela Innovation dá aula de inovação e democratização dos lucros
Frequento feiras há 20 anos, e não lembro ter visto antes tantos pretos juntos em um espaço de poder
Neste último final de semana, dos dias 17, 18 e 19 de março, em um dos lugares mais sofisticados de São Paulo, aconteceu o evento Expo Favela Innovation São Paulo 2023. Trata-se de uma feira que conecta favela e asfalto, com foco em empreendedorismo e inovação, que foi sediada no Complexo do World Trade Center.
Tive a honra de abrir o primeiro dia de evento apresentando uma pesquisa inédita do Data Favela, instituto que fundei com o meu parceiro Celso Athayde, idealizador da feira, na qual aponta, entre outros dados, que as favelas brasileiras atingiram uma população para se tornar o terceiro maior estado do país.
Mas o que me fez voltar para a casa com uma enorme sensação de esperança foi a tecnologia social que o evento emanou, fazendo jus ao nome que remete à inovação. Participo de feiras e eventos, há mais de 20 anos. Só no World Trade Center foram várias. E nunca vi ali na minha frente, tanta inovação social e democratização de riquezas, como vi no último final de semana
Nunca tinha visto ali, nem em outros espaços parecidos, um evento todo realizado por pretos, estrelado por pretos e com eles participando de todas as esferas desse processo. Antes, infelizmente, só os via nesses lugares, em posições de servir os brancos empresários do asfalto. Nesses três dias, pude admirá-los em posição de protagonismo, no que considero seja o lugar que lhes pertence.
Mais que isso, ali enxerguei uma potente distribuição de renda que não será percebida pelos menos atentos. Primeiro, porque as pessoas do asfalto pagaram ingresso para estarem na feira. Proporcionando, assim, a ida gratuita de pessoas da favela, que representavam a maioria absoluta. Essas pessoas puderam ter acessos a conteúdos de palestras, pesquisas, conferências e afins, que eram restritos somente a pessoas mais abastadas, até pouco tempo atrás.
Era lindo ver a multidão chegando. Grande parte dessas pessoas chegou lá, através da mobilização da sempre atuante Central Única das Favelas, a CUFA, que, com suas lideranças, mobilizou 200 ônibus diariamente, totalizando quase 10 mil pessoas, que desembarcaram no Complexo do World Trade Center o dia inteiro. Claro, no espaço cabem 5 mil pessoas e havia uma rotatividade permanente de público.
Outro ponto que explicita essa inovação social, que deu o tom da Expo, foram as marcas que apoiaram o evento. Pois, ao montarem seus stands, viabilizaram que mais de 500 empreendedores, vindos de favelas de São Paulo, expusessem e comercializassem os seus inovadores produtos sem ter que pagar nenhuma taxa. Vi muitos desses personagens voltando pra casa felizes e sabedores de que, a partir da participação na Expo, o lucro será muito maior para seus negócios.
Como se não bastasse tudo o que relatei até aqui, a feira estabeleceu acordo com as duas empresas que operam nas áreas que têm os salários mais baixos no mercado de evento no Brasil, que são os carregadores e limpeza, viabilizando bônus para esses profissionais, equiparando com categorias acima. Apesar de não ter sido nenhuma fortuna, o valor é maior do que os costumam ser praticados pelos maiores eventos do Brasil.
Além disso, procurando contribuir com esse ecossistema financeiro entre pretos e moradores de favelas, a organização optou por contratar, entre as empresas prestadoras de serviço, 80% formadas por pretos, cujos donos também são pretos e moradores de favelas. Também como forma de garantir que os pretos estivessem no evento trabalhando e se divertindo.
Com isso, além de tudo que já prevíamos que a Expo ia entregar, como grandes conferências, exposições impactantes e etc. A feira termina coroada por ter promovido uma inovação social, através da tecnologia ímpar da favela de fazer o dinheiro girar. Aguardo pelas próximas.