Como a tecnologia poderia ter evitado morte no metrô de São Paulo
No último dia 6, o passageiro Lourivaldo Nepomuceno ficou preso entre a porta da plataforma e a de um vagão, e não resistiu

A morte do passageiro Lourivaldo Nepomuceno, preso entre as portas do metrô de São Paulo no dia 6, ilustra o pesadelo de muitos moradores da cidade: o de sair de casa e não voltar. No caso dele, por falta de uma tecnologia comum, presente em muitos lugares a ponto de ser corriqueira, que são os sensores de movimento. Parecidos com os que existem em qualquer elevador minimamente bem planejado dos dias de hoje, ainda que com as devidas especificações de um sistema mais complexo.
Na linha 5, até há sensores, mas não em todos os lugares onde deveria. Os mecanismos presentes detectam apenas se as portas estão obstruídas durante o fechamento, impedindo o movimento do trem caso algo impeça o fechamento total das portas. Se as duas portas se fecharem e alguém ficar entre elas – como aconteceu com Lourivaldo – o trem parte da estação porque não há monitoramento no vão entre esses acessos aos vagões. Sensores no lugar certo ou mesmo botões de emergência teriam evitado a morte do homem de 35 anos, pai de três filhos, mais uma vítima da pressa e do descaso que todos os dias dão cabo de habitantes da capital.
Sensores prometidos apenas para 2026
Não se pode vilanizar as portas de plataforma, que são elas mesmas uma forma de tecnologia e ajudaram a deixar a mobilidade menos insegura ao longo dos últimos anos. Elas estão presentes na linha 5 e na 4, também sob responsabilidade da ViaMobilidade, além de terem sido instaladas em algumas estações das linhas azul, verde, vermelha e prata, que são geridas diretamente pelo estado.
É estarrecedor, no entanto, que nenhum responsável pela linha lilás tenha pensado no risco de pessoas ficarem presas naquele vão. Ou, se pensaram, por que não fizeram nada antes? Existem sensores no vão em outras linhas paulistanas, afinal. Além disso, sabemos da rotina acelerada de São Paulo e do quanto estamos (quase) todos dispostos a ignorar avisos sonoros e luminosos que indicam o fechamento das portas. Quem usa ou já usou o transporte coletivo na cidade sabe o custo financeiro, emocional, de tempo, que é perder a hora para algum compromisso.

A ViaMobilidade divulgou, após a tragédia, que pretende instalar sensores até fevereiro de 2026, um prazo assustadoramente longo considerando o ocorrido. Ao saber dessa informação, pesquisei outras tecnologias, boa parte delas com inteligência artificial, que vêm sendo usadas no transporte sobre trilhos ao redor do mundo.
Reconhecimento facial, drones e manutenção preditiva
O sistema chinês talvez seja o mais tecnológico do mundo, o que não é uma surpresa em se tratando do país, que trava uma espécie de Guerra Fria das IAs com os Estados Unidos. Em cidades como Pequim e Guangzhou, sistemas de reconhecimento facial permitem que passageiros acessem as estações sem bilhetes físicos ou cartões. Ao escanear o rosto dos usuários, o sistema autoriza a entrada e debita automaticamente o valor da passagem. Claro, haveria aí outras questões de privacidade que não se pode ignorar.
Também na China, há robôs de inspeção e drones, que monitoram o tráfego ferroviário e rodoviário, enquanto sistemas de IA analisam dados em tempo real para prever comportamentos de risco, gerenciar multidões e otimizar operações.

O sistema de lá trabalha com manutenção preditiva: faz uso de trens de manutenção equipados com IA que realizam inspeções detalhadas da infraestrutura ferroviária, identificando potenciais falhas antes que se tornem problemas críticos. Esses sistemas utilizam sensores avançados e algoritmos de aprendizado de máquina para monitorar a condição dos trilhos, rede aérea e outros componentes, permitindo intervenções preventivas e reduzindo custos operacionais – este exemplo já foi seguido no metrô de São Paulo, vale ressaltar.
Detecção de animais e suspeitos, além de controle de temperatura
Algoritmos de IA são utilizados para monitorar a densidade de passageiros em tempo real, permitindo ajustes operacionais para evitar superlotação. O metrô de Moscou implementou sistemas que analisam o fluxo de passageiros e emitem alertas sobre comportamentos suspeitos ou situações de risco. Nova York também fez testes com essa finalidade. Há diversas iniciativas de aplicação de visão computacional, em vários continentes, para detectar pessoas ou animais em trilhos, além de objetos potencialmente perigosos abandonados em estações.

Em Barcelona, a IA foi empregada para otimizar os sistemas de ventilação do metrô, regulando temperatura, umidade e qualidade do ar. Essa tecnologia também contribui para a redução do consumo de energia e minimiza a propagação de micro-organismos. O metrô do Panamá adotou uma plataforma que utiliza IA para prever saturação de passageiros e recomendar medidas corretivas, reduzindo tempos de espera.
Cidades como Copenhague, Paris, Dubai e Honolulu vêm adotando trens totalmente autônomos, controlados por IA, que operam sem a necessidade de condutores humanos. Esses trens utilizam sensores e algoritmos avançados para tomar decisões em tempo real, otimizando as operações.
Em São Paulo também há metrô sem condutores, inclusive na linha 5. Mas não se pode afirmar, pelo menos até o momento, se um humano no comando teria sido capaz de evitar a tragédia desta semana.
É importante reiterar que há iniciativas parecidas ou iguais a algumas das que citei acima em prática no transporte de São Paulo. Há que se reconhecer que o sistema paulistano tem boas iniciativas tecnológicas relacionadas a segurança e eficiência. Mas alguém morrer por falta de sensor, um acidente facilmente evitável, torna difícil pensar em qualquer coisa além de no risco que corremos ao cruzar a catraca das estações diariamente.